Agora a informação é oficial: a explosão de violência em São Paulo tem relação com uma guerra entre o crime organizado e a Polícia Militar. Os jornais de quarta-feira (31/10) revelam detalhes que confirmam suspeitas de descontrole das autoridades do estado sobre seus agentes e evidenciam que a causa principal da onda de assassinatos é a própria estratégia de segurança.
O Estado de S.Paulo informa, com reportagem destacada na primeira página, que a polícia encontrou uma “lista da morte” na favela de Paraisópolis, com nomes e descrições físicas de policiais marcados para morrer. A relação teria sido apreendida numa “central de espionagem” do grupo conhecido como Primeiro Comando da Capital, que, segundo a imprensa, controla presídios, domina o tráfico de drogas e mantém sob seu poder muitas comunidades da periferia da cidade.
O Estado de S. Paulo reproduz o que seria um fac-símile da ordem para a execução de policiais militares. Sob o título “Salve geral”, o texto convoca os integrantes do grupo a reagir contra flagrantes forjados pela polícia e contra as execuções de seus parceiros.
Para cada membro do PCC preso sob falsa alegação, a ordem é matar um policial, e para cada integrante do grupo morto em circunstância que eles consideram desigual, sem chance de reação, devem ser mortos dois policiais, sempre da mesma corporação e na mesma região onde ocorrerem os eventos, diz o comando.
Acusações mútuas
A se considerar verdadeiro o material divulgado pelo jornal, não há mais como o governo do estado negar que a explosão de homicídios que assusta os paulistas tem uma relação direta com ações questionáveis da Polícia Militar.
As causas expostas seriam flagrantes forjados de posse de droga e execuções sob a alegação de confronto armado.
O noticiário vinha dando margem a interpretações perigosas como essa, e já alimentava especulações ainda mais perturbadoras, como, por exemplo, por que esse estado de beligerância não afeta também a Polícia Civil. No entanto, entre os documentos apreendidos havia indícios de que a quadrilha pretendia matar pelo menos dois policiais civis do setor de repressão a roubos e assaltos.
A apreensão dos documentos só foi possível porque, desde a madrugada de segunda-feira (29/10), a favela de Paraisópolis foi tomada por 600 policiais militares, que mantém barreiras em todos os acessos da comunidade.
Paralelamente, os jornais relatam desentendimentos entre o secretário da segurança paulista e o ministro da Justiça, envolvendo questões partidárias e acusações mútuas de omissão. O secretário de Segurança afirma que a causa da violência em São Paulo é o descontrole das fronteiras, atribuição federal. O ministro da Justiça diz que ofereceu ao governo paulista apoio nas investigações e vagas em presídios federais para abrigar líderes de organizações criminosas.
Medo na Avenida Paulista
Diferente do Estadão, que usou seus repórteres para esclarecer o estado de guerra que assusta a população paulista, a Folha de S. Paulo procura desviar a pauta para o cenário nacional, com uma manchete na qual afirma que “um policial é morto a cada 32 horas no Brasil”.
O levantamento tem como base relatórios das secretarias estaduais de Segurança Pública e dá a entender que o fenômeno é nacional, mas lá pelo meio da manchete o texto esclarece que quase a metade das ocorrências se concentra em São Paulo, onde 98 policiais foram assassinados neste ano, sendo 88 da Polícia Militar. Só cinco deles morreram em horário de serviço, o que comprova a tese de que os criminosos estão caçando policiais militares em suas casas, executando-os quando estão de folga.
O esforço da Folha para diluir as atenções que se voltam para São Paulo produz no leitor mais crítico a sensação de que alguém está tentando enganá-lo. Os números da violência contra policiais em São Paulo são esclarecedores: no próprio texto em que procura amenizar a situação paulista, o jornal informa que os estados do Pará e da Bahia, que ficam em segundo lugar no total de policiais assassinados, tiveram cada um apenas 16 casos durante o ano.
Especialistas citados pelos dois jornais lembram que, acuados pela ameaça constante, os policiais perdem eficiência e aumentam a agressividade, sem contar que muitos deles saem deliberadamente em missão de vingança, o que explica a espiral de assassinatos.
Segundo o Estadão, a onda de violência tem provocado o fechamento de escolas e casas de comércio em bairros da periferia. “Medo já muda rotina até na [avenida] Paulista”, diz o título de uma reportagem do jornal.