Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

A Ação Penal nº 470

Bem-vindos ao Observatório da Imprensa.

O que hoje é chamado de "escândalo do Mensalão" ou "Ação Penal 470" começou e ganhou dimensões inéditas graças à imprensa: a fita com o flagrante da propina de três mil reais embolsada por um alto funcionário dos Correios foi a responsável pela "CPI dos Correios" que o deputado Roberto Jefferson converteu em "CPI do Mensalão" depois de conceder memorável entrevista à repórter Renata Lo Prete na Folha de S.Paulo.

Sete anos depois, ao apostar pesadamente na cobertura do "julgamento do século", a mídia está atendendo à natural e salutar obsessão da sociedade pela punição dos 38 réus indiciados pela Procuradoria Geral da República. Se a corrupção e a impunidade são assuntos-chave na agenda popular, a acusação e a defesa dos réus assume-se consequentemente como tópico prioritário.

No quarto dia desta intensa temporada, telespectadores, ouvintes, leitores e acessadores da internet ainda não tiraram do armário suas togas para participar do grande espetáculo forense. A temperatura ainda não subiu, por enquanto não apareceram os elementos passionais para esquentar o ambiente e torná-lo um Fla-Flu judicial.

Mas o que chama a atenção é que a grande imprensa ainda não deu sinais de que identificou e quer discutir as causas deste escândalo. Se, como alega a defesa da maioria dos réus, os ilícitos estão na esfera da justiça eleitoral ou então, como acusou o procurador geral, trata-se de uso de recursos ilícitos para comprar apoios de parlamentares ao governo anterior, a verdade é que ninguém se mostra empenhado em prevenir a repetição do vexame.

É possível mesmo que, enquanto o Supremo examina esta colossal disfunção do nosso sistema político, esquemas de caixa dois ou compra de votos estejam funcionando impunemente pelo país afora. O julgamento da Ação Penal 470 terminará com a condenação ou a inocência dos réus, mas é imperioso que algum dos poderes da República se preocupe com a possibilidade de repetições. Essa seria outra das tarefas do quarto poder: além de fiscalizar cabe a ele prevenir.