Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O surto esquizofrênico da mídia

Bem-vindos ao Observatório da Imprensa.

Vai entrar para a história a reação da mídia ao 3º Programa Nacional de Direitos Humanos. A solenidade nos últimos dias do ano passado foi noticiada de forma rotineira, mundana, dominada pelo novo visual da ministra Dilma Roussef.

Inicialmente, tanto o noticiário como a opinião da maioria dos colunistas, era favorável a uma revisão dos casos de violência cometidos durante o regime militar.

Dezoito dias depois, alguém soprou para os jornais a informação de que o programa continha restrições à liberdade de expressão. E de repente, evaporou-se o bom senso e entrou em ação a banda de música das corporações de mídia. Num passe de mágica o 3º PNDH tornou-se um instrumento totalitário despojado de qualquer sentido humanitário.

O então ouvidor da Folha de S. Paulo, Carlos Eduardo Lins da Silva, num texto memorável, cobrou do jornal a demora e a falta de cuidado em examinar um ato tão importante. Estranhou que um documento discutido publicamente um ano antes, jamais tivesse sido levado ao conhecimento dos leitores.

Em clima de cruzada ninguém prestou atenção para o fato de que este 3º Programa de Direitos Humanos seguia o espírito dos anteriores apresentados durante os dois mandatos do presidente FHC. Sem qualquer restrição.

A questão dos direitos humanos é obrigatoriamente abrangente. A defesa do cidadão deve operar-se em todas as esferas, inclusive no campo da comunicação social e sobretudo no caso das mídias audiovisuais regidas pelo sistema de concessão pública.

Este Observatório aplaudiu a iniciativa do então Secretário de Direitos Humanos, José Gregori, que em 1999 pressionou as empresas de mídia eletrônica a adotar padrões de qualidade que não agredissem os direitos dos telespectadores. Agora não podemos deixar de estranhar que no lapso de apenas uma década o que a mídia considerava natural e insignificante tenha se tornado uma abominável tentativa repressora.

O 3º Programa de Direitos Humanos foi reescrito por determinação do presidente Lula, o caso está aparentemente encerrado. Mas o surto esquizofrênico da nossa mídia revela uma perigosa disposição panfletária incompatível com os pressupostos de uma sociedade democrática.