Wednesday, 17 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

51% das escolas de jornalismo reprovadas

Quem foi que errou?

Alberto Dines

O assunto foi manchete da Folha de S.Paulo, chamada destacada no Jornal do Brasil, O Globo e pequena no Estado de S.Paulo. Não é para menos: 23% dos cursos superiores de engenharia elétrica, mecânica, economia e jornalismo avaliados pelo Ministério da Educação não oferecem condições adequadas de ensino.

O mais grave da notícia – pelo menos no tocante a quantidades – só foi destacado por O Globo: o pior desempenho foi dos cursos de jornalismo, que tiveram um índice de reprovação de 51% !

O não dito é ainda mais preocupante: a imprensa foi a última a saber. Surpreendida, como sempre, incapaz de prevenir e antecipar. Jamais investigou aquilo que lhe diz respeito. Deu as costas tanto ao seu interesse como ao interesse público.

Essa é a grande verdade: as empresas jornalísticas não estão minimamente interessadas em acompanhar a produção da matéria-prima essencial para alimentar a sua qualificação: recursos humanos. Fazem aqueles cursinhos de treinamento para badalar os resultados, aproveitam os mais expeditos, cumprem a lei do diploma e o resto que se dane.

Combinação de descaso com inapetência, ambos alimentados pelo interesse pecuniário: fiscalizar as escolas de jornalismo significa antes de tudo denunciar o descalabro do ensino superior privado, hoje um dos grandes anunciantes da mídia diária. Dois dos maiores jornais brasileiros (Folha e Globo) ostentam entre os seus colaboradores regulares o lobista-mor do ensino superior privado, Arnaldo Niskier. E isto não acontece por acaso ou em função do talento do escriba: é acerto mesmo – toma lá, dá cá.

A divulgação desses dramáticos resultados confirma o que este Observador vem dizendo aqui, desde 1997:

  • O ensino do jornalismo precisa ser reexaminado. Professor de disciplinas técnicas deve ser jornalista, com militância profissional reconhecida e comprovada (além dos demais atributos acadêmicos).
  • Uma escola de jornalismo deve coexistir com um projeto jornalístico regular e permanente. Não se ensina medicina sem um hospital, clínica ou ambulatório.
  • A pós-graduação em jornalismo é uma necessidade. É preciso separá-la definitivamente da pós em comunicação. A base é comum mas são matérias distintas, assim como farmacologia e medicina. O orientador de monografias ou teses sobre jornalismo deve ser um professor com experiência comprovada em redações para impedir que os trabalhos de pós-graduação em jornalismo continuem a conter as asneiras que serão reforçadas em trabalhos posteriores.
  • O provão veio para ficar. Se algumas definições precisam ser reexaminadas, que sejam reexaminadas. Se alguns critérios precisam ser revistos, que sejam revistos. Mas o processo regulador e fiscalizador como um todo não pode ser revertido. Ser contra o provão hoje é o mesmo do que proclamar-se contra a reforma do Judiciário [veja rubrica Diretório Acadêmico, nesta edição].

 

A.D.

  • Narcisa Tamborindeguy, a socialite carioca que neste ano forma-se em jornalismo, ganhou a capa do segundo caderno de O Globo (12/2/00) com chamada na primeira página. E o que fez a moça? Não fez. Ganhou o destaque pela não-notícia – o seu livro foi recusado por uma editora popular, também do Rio. A fabricação de celebridades não precisa de pretextos, qualquer coisa serve. Não fosse pela obra-prima que está produzindo, a divina Narcisa seria capa por que trocou de faculdade: ameaçada de expulsão de um estabelecimento (privado, é claro), foi contratada por outro. Certamente com bolsa de estudos.
  • O UOL faz hoje o onanista de amanhã. Eis as razões por que um adolescente precisa ser assinante do maior provedor brasileiro de internet, publicadas em cores num anúncio de página inteira – nas revistas saiu em página dupla: “Porque só no UOL ele pode encontrar tudo sobre sexo; porque pode entrar no comVC e conversar on-line sobre sexo; porque pode entrar na estação de esportes e saber tudo sobre peladas; porque pode encontrar nos amigos virtuais uma namorada para fazer sexo virtual; porque só no UOL ele pode encontrar no Miner um bom creme para espinhas.”
  • O verbo mais usado na primeira página do JB tem sido “esquentar”.
  • Sessão espírita em O Globo (14/2/00): “Noel Nutels aprova genéricos” (título de matéria na página 17). Noel Nutels morreu há 20 anos, a instituição que leva o nome do famoso sanitarista é Laboratório Central de Saúde Pública Noel Nutels. O redator do título poderia usar “laboratório” ou “saúde pública”.