Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

De mal com a lógica

I 
Estadão, 24/11/96 (domingo). Título principal da primeira: "Paulistano apóia venda da Vale". Título da capa do caderno Economia: "Paulistano desconhece a Vale, mas apóia venda". 

Deve ser um novo estilo de paradoxismo. Mas digamos que os paulistanos conhecessem perfeitamente a Vale e, em grande maioria, apoiassem sua venda. Continua fazendo falta a boa e velha lógica: que importância tem saber se "os paulistanos" apóiam ou não a venda da Vale, na ordem geral das coisas? Seria mais um rompante de provincianismo de um jornal chamado "O Estado"? Ou só uma contribuição canhestra à ofensiva propagandística pró-privatização? 

II 
Folhão, 25/11/96. Título na primeira: "Erro eleva número de mortes em naufrágio". Imagina-se que mais gente morreu porque alguém cometeu um erro. Chamada: "O Corpo de Bombeiros de Belém (PA) retificou o número de mortos no naufrágio de um barco, anteontem de madrugada, no rio Acará. Morreram no acidente 5 pessoas, e não 22, como havia sido divulgado." Ou seja: a informação a ser transmitida não diz respeito a uma elevação, como está no título, mas sim a uma redução, como está no texto. Que tal, nas mesmas quatro linhas de dez toques, "Naufrágio/ no Pará/ matou 5/ e não 22"? Simples demais? 

Só para chatear. A respeito da localização de capitais ["Belém (PA)"], o Novo Manual de Redação da FSP recomenda: "Não insulte a inteligência do leitor. É jornalisticamente errado dizer que São Paulo fica no Estado de São Paulo ou que Brasília é a capital federal. Isso vale para cidades como: São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, Recife, Manaus, etc." Faltou mencionar explicitamente Belém, entre outras capitais, mas imagina-se que, sendo maior do que Manaus, estaria ipso facto contemplada no conceito. 

O comentário final detalhista, jornalisticamente correto, é mesmo só para chatear. Quanto a insultar a inteligência do leitor, que tal "Erros multiplicam agressões à lógica"? 

Mais uma perguntinha: os erros – que sempre houve, mas eram compensados por brilhantes e educativos acertos – são acidentes ou diferentes manifestações de um mesmo fenômeno, o rebaixamento geral dos padrões da imprensa considerada séria, que ainda não tinha invadido com tanto ímpeto as primeiras páginas?