Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Conhecimento versus opinião


Rádio é o meio mais furiosamente opiniático que existe, o que se explica em parte pela facilidade de fazê-lo. A matéria-prima do rádio é a fala. E quanto mais fala há no rádio, menos ela é editada


Editar pressupõe tratar um material já existente, organizá-lo no espaço (no caso do rádio, apenas no tempo; no da televisão, no tempo e no espaço). Só os locutores que lêem notícias trabalham com texto editado. Os âncoras improvisam o tempo todo, diante do bombardeio dos acontecimentos. Não podem fazer uma "pesquisa" antes de abordar cada tópico com que deparam. Não têm como editar. Valem-se de seus próprios conhecimentos. Quando o estoque se esgota – o que acontece rapidamente -, passam a valer-se de suas opiniões, daquilo que "pensam sobre o assunto". 

O grande jornalista não é evidentemente o que imagina conhecer tudo, mas o que tem boa noção da fronteira entre o que conhece bem e o que conhece mal, e sabe encontrar informações a respeito do que não conhece. O problema é querer tapar com opinião o buraco do conhecimento. Como dizia Hipócrates, há 2.500 anos, a ciência é a mãe do conhecimento e a opinião é a mãe da ignorância. 

Mas, como o rádio também induz a um tom coloquial, de conversa com o ouvinte, seria impraticável que o âncora-comentarista levasse sua sinceridade ao paroxismo. Leria uma notícia e diria: "Não tenho certeza a respeito disso". Leria outra e diria: "Não faço idéia do que seja". Ou então: "Já ouvi falar, mas nem me lembro mais do que foi falado". 

Na verdade, o ouvinte de rádio e o telespectador precisam da opinião. O emissor da notícia poderia ser indiferente ao seu teor? Ninguém imagina que alguém fosse apresentar no mesmo tom de voz a notícia de uma chacina e a notícia de que, ao fim de mais um ano, não se registraram casos de poliomielite no país. 

Quando narrou a derrota do Brasil no basquete feminino da Olimpíada de 1996, Galvão Bueno, ao sentir que a superioridade das americanas era definitiva, maduramente parou de fazer cobranças à equipe brasileira e começou a consolar os telespectadores, argumentando, com habilidade, que já tinha sido uma glória chegar até aquela final. Diariamente, Heródoto Barbeiro procura colocar-se, diante do fato que aborda, no papel do cidadão, com suas dúvidas, suas inquietações, seu código de ética, seus valores morais. 

Opinião, no jornal, no rádio e na televisão, não é crime. Crime é vender ou contrabandear opinião.