Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O jornal e o velho modelo búlgaro

O jornalista Elio Gaspari publicou em O Estado de S. Paulo (e simultaneamente em O Globo e na Zero Hora) críticas ao Banco Central por ter confirmado a existência de investigação contra operação financeira realizada por Celso Pitta (ver, nesta edição, Um mês para apurar 'Como Pitta deu prejuízo de R$ 1,7 mi em um único dia').

Segundo a Folha de S. Paulo, um dirigente do Banco Central pressionou a direção do Estadão. O mesmo jornal em que se publicava tão dura crítica teria recebido da direção do Banco valiosa informação. O Jornal da Tarde, da mesma empresa, atacou em editorial os críticos do BC. Chamou Gaspari, que nunca teve outra profissão desde que começou a trabalhar, há mais de três décadas, de jornalista "entre aspas". Esperava-se, talvez, o assevandijamento do jornalista, mas ele pediu demissão. Sua página continuará em O Globo e na Zero Hora. Em São Paulo, migrará para a Folha, a partir de 4 de novembro.

Curioso é que o Estadão tenha publicado Elio Gaspari duas vezes por semana com chamada na primeira página, durante mais de um ano, e não tenha considerado necessário obsequiar seus leitores com uma só linha a respeito de sua partida. Como se nada tivesse acontecido.

Na década de 70, houve na Bulgária um acidente de avião militar em que morreram oito generais. A informação vazou para o que na época se chamava de Ocidente, mas pedidos de informação eram respondidos pelo governo búlgaro com uma negativa: nada tinha acontecido. Le Monde glosou o episódio e, durante muitos meses, toda vez que se escrevia no jornal a palavra Bulgária, vinha o qualificativo: "país onde não acontece nada" ("pays où rien ne se passe").

O modelo "nada a declarar" tem longa vida.

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[Mauro Malin, jornalista]