Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A importância da análise

CIRCO DA RENÚNCIA

No dia seguinte à renúncia de Antônio Carlos Magalhães, dois jornais brasileiros ? Correio Braziliense e o Estado de S.Paulo ? brindaram seus leitores com informações precisas sobre o fenômeno do carlismo na Bahia.

O Correio Braziliense, em brilhante artigo do cientista político baiano Joviniano Neto, analisa com precisão a força do carlismo. No texto, o cientista demonstra, por A mais B, o que sempre se procurou esconder da opinião pública brasileira: a liderança de ACM na Bahia não é a unanimidade que se apregoa país afora. Os seguidores do carlismo representam menos de 1/3 do eleitorado baiano, e o analista comprova isso com números extraídos das eleições majoritárias de 1986, 1990, 1994 e 1998 e da última eleição municipal em Salvador.

Já o Estadão apresenta um histórico da carreira política de ACM, demonstrando em narrativa cronológica como foi a construção do poder do carlismo na Bahia, que se aproveitou competentemente das três vezes em que foi alçado pelos militares aos cargos de prefeito da capital e de governador, este por duas vezes. O histórico apresenta as três grandes tragédias pessoais de ACM: o suicídio do genro, o suicídio da filha e a morte súbita de Luiz Eduardo, o filho escolhido para sucedê-lo na política. O único fato histórico não-citado é a destruição do Jornal da Bahia por asfixia comercial, imposta por ACM e seus seguidores. O mesmo processo que impõe hoje ao jornal A Tarde, fato mencionado pelo Estadão. Mas a tarefa agora é difícil: vivemos numa democracia, ao contrário dos anos 70, além do processo de privatização das telefônicas e da globalização.

O Estadão trouxe, ainda, um editorial sobre a renúncia considerado um dos mais duros já publicados pelos Mesquita, e uma excelente análise do senador Roberto Freire mostrando que a pesada roda da política continua a girar, só que agora a passos mais rápidos. O Jornal do Brasil publicou a desmoralizada lista da votação secreta, na qual ninguém de bom senso acredita, pois vem sendo levantada por ilações. Ainda no JB, Dora Kramer fez análise corretíssima sobre a renúncia.

O restante da imprensa tratou o assunto de maneira burocrática. Foram unânimes em afirmar que o discurso foi rancoroso, fraco, dirigido ao povo da Bahia.

Na sexta-feira, 1? de junho, o Bom Dia Brasil, da Rede Globo, deu o tom ao não produzir uma linha sobre as duas manifestações ocorridas em Salvador ? uma pró-ACM e outra contra ACM. A imprensa escrita diária decretou o fim da cobertura maciça ao episódio do estupro do painel, cada jornal ao seu estilo. O JB ignorou a manifestação contra ACM, o Estadão noticiou a pró-ACM. O Globo e Correio Braziliense deram as duas manifestações. O Correio, em entrevista da repórter Arlete Salvador com o deputado federal baiano Waldir Pires, foi o único a mencionar que está sendo desconsiderado o parágrafo IV do artigo 55 da Constituição, que prevê, em caso de renúncia de parlamentar, a continuidade do processo. A intenção foi evitar a repetição da manobra dos "Anões do Orçamento". Estadão e Globo trouxeram, ainda, belo artigo de Luis Fernando Verissimo, "A despedida do malandro", uma obra-prima sobre a renúncia.

Em todo o Brasil, quebraram a unanimidade da imprensa os veículos de ACM, e não poderia ser de outra forma: mais uma vez a TV Bahia driblou o manual da Central Globo de Jornalismo com flashes ao vivo da manifestação pró-ACM.

Ao fim de todo esse episódio vale a pena citar trecho de artigo do Luís Nassif, publicado no dia 1? de junho: "Ao embarcar nesse jogo e avalizar cada denúncia de fundo político, sem conferir sua veracidade e sem apontar sua intenção política, deixa-se de fazer jornalismo e se passa a fazer política". No início do episódio do estupro do painel, muita gente agiu assim, mas felizmente a opinião pública recolocou os pingos nos iis e a parcela carlista da mídia recuou e praticou jornalismo consciente, repetindo o episódio das "Diretas Já".

** Crescem os rumores de que a Rede Globo vai punir a TV Bahia, adquirindo sua antiga afiliada baiana, a TV Aratu. Quem afirma é o Informe JB e Cláudio Humberto.

(*) Jornalista

    
    
                     

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