Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A matéria principal de 2001

11 DE SETEMBRO

Em todo o mundo, a grande maioria dos jornalistas elegeu os ataques de 11 de setembro e a subseqüente guerra contra o terrorismo como a matéria mais importante de 2001, é o que indica pesquisa da Associated Press.

A tragédia, coberta minuto a minuto pelas principais emissoras, tocou diretamente pessoas do mundo inteiro: entre as vítimas do World Trade Center estavam imigrantes de 26 países. No dia seguinte, as edições especiais e as manchetes atônitas ? "Apocalipse", publicou o Daily Mail ? refletiam a angústia que chegou à redação: em Bangladesh, as linhas telefônicas dos jornais foram congestionadas por parentes preocupados com o destino de 250 mil conterrâneos trabalhando em Nova York.

Segundo G.G. LaBelle [Associated Press, 27/12/01], a agência entrevistou seus 75 assinantes ? emissoras e jornais ? em 24 países para listar as 10 principais matérias do ano. A segunda reportagem mais votada foi o pânico causado pelo antraz e, com uma diferença de apenas 1% em relação à número 2, a terceira matéria foi a renovada onda de violência entre palestinos e israelenses.

Apenas quatro do 75 participantes da pesquisa apontaram outro assunto como principal, devido à importância regional da notícia: editores iugoslavos escolheram a prisão do ex-presidente Milosevic como o evento mais marcante, história que ficou em quinto lugar no ranking geral.

AFEGANISTÃO

Horas depois da retirada das tropas talibãs de Cabul, em 12 de novembro, a televisão afegã ? fechada há cinco anos pelo regime ? voltou ao ar. Segundo Bryan Pearson [Variety, 1/1/02], o chefe da emissora, Abdul Afiz, estima que a transmissão diária de notícias, filmes e eventos esportivos das 18h às 21h seja acompanhada por 500 mil telespectadores, tornando-se a principal fonte de entretenimento da população. De países como Irã, Japão, Índia, Turquia, Alemanha e China vieram ofertas, de governos e emissoras, de ajuda para reconstrução da rede local e fornecimento de programação; a Unesco reservou US$ 35 mil apenas para treinamento de equipe técnica.

Em artigo para o New York Times (26/12/01), Anthony Borden, diretor do Institute for War & Peace Reporting, e Edward Girardet, diretor da Media Action International, alertam para o fato de que esta ajuda não resolve a situação do jornalismo profissional no país. Muitos repórteres afegãos foram mortos ou tiveram que fugir nos últimos 23 anos de conflito. Agora, quando os cidadãos mais precisam de informações para compreender o processo de paz e tomar suas próprias decisões, as muitas facções políticas iniciarão disputa pelo controle da mídia local, interessadas em criar feudos jornalísticos, comprometendo a estabilidade do novo regime e fragmentando ainda mais a frágil sociedade afegã.

Embora as promessas de auxílio sejam muitas, todas até
agora consideram uma única opção: a de que
a produção e a transmissão de notícias
sejam feitas por estrangeiros. Foi pensando desta forma que o Congresso
americano destinou US$ 19,5 milhões para lançar a
Rádio Afeganistão Livre, enquanto o senador Joseph
Biden pede US$ 500 milhões para criar uma estação
islâmica pró-americana para se opor à al-Jazira.

Estes esforços podem fazer algum bem, ponderam os autores, mas absorverão quantias enormes de assistência preciosa. Algumas iniciativas, como a Rádio Afeganistão Livre, serão provavelmente temporárias e propagandísticas. Ademais, sendo estrangeiras, estas fontes de notícias dificilmente darão uma perspectiva local ou verão a importância de publicar matérias de serviço vitais à reconstrução do país, que informem, por exemplo, onde estão localizadas minas terrestres ou como conseguir pequenos empréstimos.

Este tipo de reportagem ? também fundamental para prestar contas da ajuda recebida ? não interessa a emissoras internacionais. "Elas simplesmente relatarão, um ano depois, que a corrupção generalizada e a falta de maturidade política conspiraram para destruir o Afeganistão pós-Talibã", observam Borden e Girardet. Os afegãos precisam urgentemente, de seus jornalistas, não de explicações do mundo exterior, mas informação confiável e debate honesto dentro de sua própria sociedade. Infelizmente, lamentam os autores, os doadores internacionais ainda não conseguiram perceber a importância de apoiar a mídia local.