Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Assessorias (e/ou/versus) Imprensa

JORNALISMO INSTITUCIONAL

Alberto Dines

Introdução do livro Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia ? Teoria e técnica, Jorge Duarte (org.), Editora Atlas, Brasília, 2002

É preciso encarar a verdade: assessorias nem sempre estão a favor da imprensa, às vezes estão contra. Pode parecer incongruente que tendo profissionais do mesmo ramo nas duas pontas do processo e com objetivos organicamente iguais ? a busca do esclarecimento ? haja um conflito de interesses entre as partes.

Como administrá-lo? A resposta está implícita ao longo deste livro.

De minha parte, combinando a técnica do lead, da ouverture e da provocação, ofereço uma explicação sobre o cabalístico título que inicia esta apresentação. Sugere três leituras distintas: a) Assessorias e Imprensa; b) Assessorias ou Imprensa; c) Assessorias versus Imprensa.

Complicado, hermético, contraditório, explosivo? Nem tanto.

Primeira Opção, otimista: Assessorias de Comunicação e Imprensa agregando-se em tarefas comuns. Desde que compreendam e, sobretudo, respeitem as diferentes funções, objetivos e limites. O jornalista não pode ser nem pode pretender a onipotência, a onisciência ou a onipresença. Ele não pode tudo, não sabe tudo e não pode estar em mais de um lugar ao mesmo tempo. Mas tem condições de superar as limitações recorrendo a referências informativas, apoio técnico ou mesmo suporte logístico (com o imperioso registro na matéria).

Exemplo hipotético: a admirável Embrapa (que acompanho há duas décadas na condição de ruralista-sonhador) quer mostrar à sociedade brasileira sua produção fitoterápica lá nos cafundós da Amazônia. Só ela tem condições de fornecer ao repórter o background científico, transporte aéreo-hidroviário e, eventualmente, material televisível sobre outras experiências em outros locais, no Brasil ou exterior.

Há aqui espaço para uma colaboração estreita sem qualquer comprometimento do texto final com o objeto da matéria. O repórter não terá sido desrespeitado, o leitor sairá ganhando, o jornal ficará satisfeito com uma matéria que o enriquece sem prejudicar sua credibilidade e a instituição focalizada saberá que atendeu aos seus objetivos sem atropelar códigos deontológicos de ninguém, inclusive os seus (assessorias e clientes deveriam ser os primeiros a estabelecê-los).

Segunda opção, pessimista: Assessorias de Comunicação ou a Imprensa. A conjunção alternativa e sua aplicação nesta equação significam substituição, também pode ser lida como Assessorias de Imprensa usando a e servindo-se da Imprensa para satisfazer suas necessidades privadas. São as infiltrações, "plantações" e vazamentos que exploram a indolência, incompetência, má-fé, boa-fé ou falta de recursos dos veículos. Infrações morais, cívicas e também cumplicidade criminal que pode ser caracterizada como formação de quadrilha. Sabotagem contra um dos poderes da República porque desrespeita-o, vulnerabiliza-o e interrompe o fluxo de confiança entre a sociedade e suas fontes de informação.

Exemplo, nada hipotético: Assessorias de imprensa de partidos, candidatos, políticos, governos (em todos os níveis), lobbies políticos e ideológicos, aproveitando-se da febre eleitoral para enfiar informações, comentários, inocentes "reflexões" que possam servir a seus interesses ou prejudicar os do adversário. Manipulação flagrante.

Tiram proveito da velocidade e timing da operação jornalística para evitar checagens e contra-checagens. Este tipo de situação acontece nas noites de quinta e sexta-feira nos diários brasileiros quando, por força de uma prática empresarial absurda, as redações são obrigadas a fechar (ou adiantar), simultaneamente, páginas e cadernos das edições de sexta, sábado, domingo e segunda.

Terceira opção, dramática: Assessoria de Comunicação versus Imprensa. Grau máximo da irregularidade, subversão de todos os princípios éticos, tabula rasa nas regras de respeito e convivência.

Exemplo freqüente: Quando um cliente (privado ou público) usa seu poder de dissuasão (econômico ou político), abertamente (ou de forma dissimulada), para intimidar, calar e modificar a informação (ou opinião) de um determinado veículo (ou grupo) em benefício daquilo que deseja divulgar (ou omitir).

Estado de guerra. Crime de lesa-pátria, lesa-decência, lesa-consciência. Bem comum, público, vandalizado por interesses escusos.

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Como a maioria das súmulas, também esta pode pecar pela abrangência. A solução para os eventuais lapsos, o leitor encontrará na esmerada e variada organização dos textos deste livro. Em compensação, este resumo dramatiza um problema que só os irresponsáveis não querem enxergar e coloca jornalistas a serviço do antijornalismo.