Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1280

Bernardo Ajzenberg

CRÍTICA DIÁRIA

"Crítica Interna", copyright Folha Online (www.folha.com.br)

14/11/2001– Que o assunto principal era esse, não havia dúvida, mas, talvez pelo desgaste de ênfases dos últimos dois meses, não foi dado, pelos jornais (com exceção do ?Globo?), o devido destaque visual/gráfico à notícia histórica da queda de Cabul. Só o jornal carioca usou duas linhas de manchete, com força (?Rebeldes tomam Cabul e derrubam regime talibã?). O tratamento visual dado pelos outros jornais ficou aquém da notícia. Folha: ?Cabul cai; ONU prepara transição?; ?Estado?: ?Taleban foge e Aliança do norte toma Cabul?; ?JB?: ?Cai Cabul, falta Bin Laden?.

Por dentro do PMDB, de novo

A nota ?Recuo tático? (Painel, pág. A4) afirma que a direção do PMDB adiou a definição sobre enxugamento de suas prévias por temer que Itamar Franco entrasse na Justiça. Já a reportagem ?PMDB aprova prévia que prejudica Itamar? (Brasil, pág. A7) afirma que a cúpula mantém o projeto, com definição marcada para terça-feira. Não aventa a hipótese da Justiça, mas sim de uma eventual desistência do governador mineiro.

Censura

A Folha deu mal, em pequena nota ao pé da pág. A6, a informação de que a Justiça proibiu jornais gaúchos de divulgarem conteúdo de fita no caso PT-bicheiros. Lembremos do caso Garotinho, meses atrás, em que houve muito mais destaque e retrancas trazendo à tona a polêmica sobre censura prévia ou não.

Nova guerra

1) A cobertura da queda de Cabul e do avanço da Aliança do Norte está a meu ver adequada. Há, porém, uma falha: onde está Bin Laden? É ele, afinal, o objetivo principal, hoje, dos EUA. Não há retranca específica sobre o assunto;

2) O texto ?Guerra está longe do fim?, dizem EUA? (pág. A11) menciona sequência histórica de fotos de fuzilamento de um taleban publicada no ?New York Times? mas não remete para a contracapa do caderno da Folha, justamente onde essas mesmas fotos aparecem;

3) O mesmo vale para a coluna de Elio Gaspari, que comenta as imagens.

Geradoras ou distribuidoras?

A capa de Dinheiro de ontem noticiava acordo entre o governo e as distribuidoras de energia para sanar parte do rombo destas últimas com o racionamento. Hoje há uma reportagem (?Geradora terá ganho duplo com acordo?, Dinheiro, pág. B4) segundo a qual o tal acordo seria com as geradoras e não com as distribuidoras. Houve erro na primeira reportagem? Ou nesta? Ou são dois acordos diferentes? Quem acompanha o noticiário fica confuso, pois o texto de hoje não faz qualquer referência ao de ontem e os valores em questão são parecidos.

UOL versus IG

Mais uma vez o jornal publica reportagem que diz respeito a empresa-irmã sem mencionar esta relação (?Provedor iG ultrapassa UOL em número de visitantes de sites?, pág. B5). Não entendo o motivo. Creio que reflete falta de transparência -um dos pilares da credibilidade– na relação com o leitor.

Alarmismo

Parece-me alarmista o título ?Dengue hemorrágica é nova ameaça em SP? (capa de Cotidiano). Na reportagem reportam-se milhares de casos de dengue clássica, mas nenhum, atual, da hemorrágica. É natural que os especialistas apontem haver riscos, em se tratando de saúde pública, mas cabe ao jornal tentar evitar ao máximo o estímulo a um clima artificial de pânico.

Sísifo

1) Faltou a idade de Ilan Goldfajn na entrevista ?BC manterá intervenção no câmbio em 2002? (capa de Dinheiro);

2) O caderno Esporte não informa em nenhum momento o horário do jogo entre Uruguai e Argentina hoje, partida considerada importante para a definição dos rumos do Brasil em relação à Copa-2002 caso o time de Scolari não vença a Venezuela;

3) O texto ?Alex Ross encara o poder catártico dos super-heróis? (Ilustrada, pág. E3) dá conta do lançamento de HQ hoje nos EUA, mas não traz nenhuma informação a respeito de como o leitor pode adquirir exemplares da obra no Brasil. Faltou serviço.

13/11/01 – Sem dúvida as manchetes apontam para a principal notícia do dia: Folha: ?Avião cai com 260 a bordo e NY revive clima de pânico?; ?Estado?: ?Airbus com 260 pessoas cai em Nova York?; ?Globo?: ?Tragédia aérea em Nova York traz pesadelo de volta?; ?JB?: ?O medo que vem do céu?. Tudo indica, porém, que a informação mais importante, em termos históricos, a médio e longo prazos, foi introduzida na capa da Folha, embaixo da dobra, na edição da 1h30: ?Tropas da Aliança do Norte entram em Cabul?.

Por dentro do PMDB

A nota ?Briga no tapetão? (Painel, pág. A4) afirma que a cúpula do PMDB decidiu enxugar a prévia interna para escolha de seu presidenciável para um colégio de cerca de 3.000 votantes. Já a reportagem ?FHC convoca Serra e Tasso para conter crise? (Brasil, pág. A6) afirma que, pela mudança, votariam entre 5.000 e 6.000 pessoas. É uma diferença razoável. Qual das duas é a informação correta a respeito das pretensões dos governistas contra Itamar no PMDB?

Só amizade?

Segundo reportagem publicada no ?Correio Braziliense? hoje, as relações entre a jornalista da ?Veja? e o lobista APS seriam mais abrangentes, envolvendo inclusive dinheiro, do que afirma o texto ?Veja demite jornalista que é citada em agenda? (Brasil, pág. A5). Até para não dar ao leitor a impressão de corporativismo, o jornal deveria apurar o fato e noticiar tudo aquilo que de fato souber.

EJ

O ?Estado? traz novo lance no caso Eduardo Jorge. Segundo o jornal, em artimanha semelhante a outra revelada semanas atrás pela Folha, um procurador procurou incluir o nome do ex-assessor palaciano em pedido de quebra de sigilo no caso Marka, com o qual ele, em tese, nada teria a ver.

Nova York/Cabul

A cobertura da queda do Airbus em Nova York dá conta do básico, em dia de nova perplexidade. Algumas observações:

a) O texto ?Autoridades fecham prédio da ONU? (Pág. A10) afirma que foi feito ?minuto de silêncio? na ONU em homenagem às vítimas do 11 de setembro, antes da queda do avião de ontem. Já ?Casa Branca tenta tranquilizar americanos? (pág. A11) informa que o ?minuto de silêncio? foi feito depois do acidente, em função deste. São informações contraditórias;

b) Faltaram na cobertura da Folha dados e números a respeito do engajamento de bombeiros e equipes em geral no resgate de corpos. Segundo o ?Globo?, por exemplo, foram deslocados 44 caminhões de bombeiros, com 200 homens. Haveria 32 crianças entre as vítimas. Coisas desse tipo, que, obviamente, exigem confirmação;

c) A repercussão do caso na República Dominicana parece ter sido bem mais dramática e relevante do que a pequena Panorâmica ?Queda gera comoção entre dominicanos? (pág. A12) dá a entender;

d) A Folha conseguiu na edição SP atualizar o noticiário a ponto de dar a informação da tomada de Cabul pela Aliança do Norte, inclusive na Primeira Página. Positivo. Não atualizou, porém, o chamado entorno, como o texto ?Rápido avanço da Aliança já preocupa EUA?, no qual a tomada da capital figura ainda como possibilidade. Da mesma forma, permanece no texto principal a informação, polêmica, de que a Aliança do Norte havia atendido pedido dos EUA de não tomar Cabul enquanto não se resolvesse a questão da composição do governo pós-Taleban.

Sem memória

O texto ?Estudo sobre recontagem de votos confirma vitória de Bush na Flórida? (Mundo, pág. A17) falha em termos deontológicos ao não registrar, para o leitor, que estava equivocada a tendência apontada em reportagem da própria Folha do dia 3 de novembro segundo a qual a imprensa norte-americana estaria escondendo esse estudo porque, em síntese, ele não confirmava a vitória de Bush. A Folha cometeu, assim, um duplo equívoco.

Milosevic

Permanece a confusão na caracterização política do ex-governante iugoslavo Slobodan Milosevic. No texto ?Tribunal da ONU amplia acusação contra Milosevic? (pág. A17), ele é citado ora como ex-ditador ora como ex-presidente. Se existem, as definições devem ser respeitadas.

Cuidado

O título ?Médico é acusado de pedofilia na rede? (Cotidiano, pág. C3) parece enganoso. A acusação ao personagem em questão é de usar o computador para transmitir fotos de pedofilia na internet. Não são coisas distintas, embora graves? Se o texto explicasse o que diz o artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente (usado como base para a acusação), a questão ficaria mais clara para o leitor.

À beira da irresponsabilidade

Afirma a reportagem ?Mais votado, Melfi é escolhido novo reitor? (Cotidiano, pág. C4) que ele ?…não teve sua nomeação bem recebida pelos funcionários, professores e estudantes da USP?. Como o jornal sabe disso? Foi feita alguma pesquisa? Não dá para a Folha se basear em algumas opiniões ou posicionamentos políticos prévios para fazer afirmações tão genéricas e categóricas como essa. A meu ver, beira a irresponsabilidade.

Sísifo

1) O texto ?Oposição diz ter nomes para criar CPI contra Taniguchi? (Brasil, pág. A4) usa cinco vezes a palavra ?denúncia? para se referir à informação dada pela Folha de caixa dois na campanha do PFL no PR. Não há denúncia nenhuma (conforme definições às págs. 61 e 157 do ?Manual?);

2) Faltou o outro lado do governador Mão Santa na arte ?Entenda o caso?, Brasil, pág. A4;

3) O texto ?Juíza ouviu falar em ?venda de decisões? (Brasil, pág. A7) não informa onde se deu o depoimento da desembargadora Suzana Camargo;

4) Faltou o outro lado do ex-editor Francisco Alberto de Moura Duarte em ?Revista parada já tem novo editor? (Ciência, pág. A8), novela que parece bastante complicada;

5) Faltou o outro lado da Caixa Econômica Federal em ?OAB ameaça ir à Justiça contra a CEF para contestar acordo do FGTS? (Dinheiro, pág. B3);

6) Faltou o outro lado do ministro do Trabalho, Francisco Dornelles, em ?Empresa silencia; Marinho vai à Alemanha? (Dinheiro, pág. B3). O deputado petista Jair Meneguelli afirma que ele deveria ?tirar a bundinha da cadeira e vir fazer seu papel de ministro?. É pouco?

7) Faltou o outro lado das empresas aéreas na retranca ?Empresário usa crise e demite, diz sindicato? (Dinheiro, pág. B8);

8) Faltou a idade do promotor Roberto Porto em ?Baleado promotor que investiga PCC e máfia chinesa? (Cotidiano, pág. C3).

12/11/2001 – O cenário internacional esteve agitado no fim de semana, tanto com a ?nova guerra? quanto com a reunião da OMC e a assembléia da ONU. Hoje, porém, nenhum desses temas predominou nos jornais. Cada um dos principais diários ?abriu? com um tema diferente. Folha: ?Brasil tem apoio na OMC contra patentes?; ?Estado?: ?País busca maior influência no FMI e Banco Mundial?; ?JB?: ?Aparelhos vão gastar menos energia?; ?Globo?: ?Rebeldes desafiam os EUA e ameaçam invadir Cabul?.

Atenção: o ?New York Times? traz com destaque em sua capa hoje reportagem mostrando que, ao contrário do que se noticiou antes (há poucas semanas), inclusive na Folha, o trabalho encomendado de recontagem de votos nas eleições presidenciais dos EUA confirmou a vitória de Bush na Flórida contra Al Gore. O jornal (Folha) precisa apurar o que aconteceu (veja nota).

Edição de domingo, 11 de novembro

Sensação de engodo

A presença de anúncios/publicidade no jornal é sempre uma ?boa notícia?. Quanto mais, melhor. Mas é preciso assegurar uma proporção mínima entre espaço editorial e espaço publicitário. Visivelmente, essa proporção foi rompida nesse domingo, produzindo no leitor a dúvida se o jornal que ele assina ou compra em banca foi feito para ter mais publicidade ou mais notícia. Faltaram páginas editoriais.

Diz que é…

A Folha obteve com exclusividade relatório da Polícia Federal sobre produção de cocaína na fronteira com a Colômbia. O texto da reportagem, ?Polícia Federal descobre fábricas de cocaína das Farc? (Brasil, pág. A4), deveria, porém, munir-se de muito mais cautela do que se muniu, atribuindo à PF a afirmação de que a guerrilha colombiana é dona das ?fábricas?. Em especial, o título é muito afirmativo e compra a versão oficial. Mais adequado teria sido atribuir a informação, claramente, já no título, à PF.

Prévias no PT

Chama atenção reportagem do ?Estado? segundo a qual Lula não aceitará disputar as prévias internas no PT com Suplicy para a candidatura presidencial. É uma pequena bomba.

Caso pataxó

Não constatei haver na Folha desequilíbrio na cobertura do dia final do julgamento em Brasília (Brasil, pág. A15). Creio que faltou, apenas, um elemento informativo/didático. Afirma-se que os advogados dos réus vão recorrer ao Tribunal de Justiça. Qual é a relação ?hierárquica? entre o tribunal do júri e o TJ? O que acontecerá se o TJ decidir não acatar a decisão dos jurados e a sentença da juíza para os que mataram o índio Galdino? Isso fica no ar.

Por que o ?outro lado??

A reportagem ?Serra é quem mais usa rede nacional? (Brasil, pág. A16) informa objetivamente quanto algumas figuras de proa do governo usaram de tempo na TV. Não há, porém, corretamente, nenhuma acusação ou insinuação. Nesse sentido, parece-me excessivo, ?realismo maior do que o rei?, colocar uma retranca de ?outro lado? para o ministro da Saúde se explicar. O ?outro lado? não deve ser banalizado nem tampouco virar pretexto para dar a palavra a alguém quando não é preciso.

Perfis ausentes

Faltaram as fichas técnicas e estatísticas (idade, número de jogos, gols, anos de carreira etc) nos textos sobre as partidas de despedida de Maradona e de Raí, à pág. D2, Esporte.

Técnico trocado

O técnico da ponte Preta é Vadão (Osvaldo Alvarez) e não Marco Aurélio, como está na nota ?Goiás pega rival completo?, à pág. D7.

Edição de segunda-feira, 12 de novembro

Mau exemplo

A reportagem ?BOL recorre de decisão sobre publicidade? (Brasil, pág. A7) é um exemplo de como interesses econômicos de grupos ligados à comunicação podem influir no seu próprio noticiário. No caso, a própria Folha. Essa reportagem não tem equilíbrio. Ouve o ?outro lado? de modo burocrático, mas, claramente, em especial ao seu final, trata de ?demonizar? a AOL, rival do BOL, altamente elogiada pelo texto, nesse episódio. O texto, aliás, nem sequer menciona que o BOL tem ligação com o Grupo Folha.

Nova guerra

1) O lide da reportagem ?Britânicos atuam em solo afegão? (capa de mundo) está, a meu ver, a partir do oitavo parágrafo, quando se mostra que a Aliança do Norte ameaça invadir e tomar Cabul apesar da hesitação atual dos EUA e das dificuldades políticas de composição de um governo pós-Taleban. Acho que o ?Globo? acertou aqui, destacando, inclusive em manchete, essa questão crucial, ainda mais com os avanços militares e o aparente enfraquecimento do Taleban nos últimos dias;

2) Faltou hoje mapa para que o leitor pudesse entender as movimentações militares do fim de semana;

3) Insisto naquilo que mencionei na abertura desta crítica, a partir do que traz o ?NYT? (e não só ele) hoje. Ao que tudo indica, houve erro feio do jornal (Folha) em reportagem anterior sobre o fato de que a imprensa americana estaria escondendo dados que mostrariam que Bush, na verdade, perdera a eleição.

Poder na CVM

Afirma-se em ?Na teoria, CVM já é mais independente? (Folhainvest, pág. B8) que a nova Lei das SA prevê que o colegiado da Comissão não mudará mais conforme a dança de ministros da Fazenda. Haverá mandato com período determinado. OK. Mas não dá para entender como, então, será feita a escolha do colegiado. Quem definirá o presidente da Comissão? Não será o ministro da Fazenda? Não há explicação.

Sísifo (fim de semana)

1) Faltaram as idades dos especialistas Patrick Moulette e Barry Rider, entrevistados em ?Países terão de combater dinheiro do terrorismo? e ?Iniciativas são politicamente ingênuas, diz inglês?, em Mundo, pág. A29 (domingo);

2) Faltou a idade do DJ Marky em entrevista na Ilustrada (segunda, pág. E6)."