Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

"Brasil põe corrupção em evidência", copyright Folha de S. Paulo

ASPAS

CRISE DO PAINEL
Folha de S. Paulo / Financial Times

"Brasil põe corrupção em evidência", copyright Folha de S. Paulo, 4/05/01

"O Congresso brasileiro está colocando em prática um performance que mistura teatro, novela e circo, segundo o ?Financial Times?.

O jornal londrino anunciou em sua edição de ontem a acareação entre os senadores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e José Roberto Arruda (sem partido-DF) e a ex-diretora do Prodasen Regina Célia Peres Borges como um ?espetáculo político bizarro?.

Para o diário, os dois senadores não são políticos iniciantes.

O ?Financial Times? ressalta que, além de paralisar o Congresso, o ?escândalo? expõe à população o esquema de corrupção na base aliada do governo quando o presidente Fernando Henrique Cardoso está se preparando para lançar um candidato para as próximas eleições presidenciais.

O jornal destaca que os dois senadores correm risco de ser cassados. Mas, se ACM e Arruda caírem, as pressões se voltarão contra o presidente do Senado, Jader Barbalho (PMDB-PA), também acusado de corrupção."

Elvira Lobato

"ACM deu emissoras de rádio a senadores que o julgarão", copyright Folha de S. Paulo, 6/05/01

"Dois dos 16 integrantes do Conselho de Ética do Senado que vão decidir o destino político dos senadores Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda receberam concessões de rádio e televisão do governo Sarney (1985-90), quando ACM era o ministro das Comunicações.

Para eles, a votação sobre a cassação ou não do senador baiano representará uma prova adicional de imparcialidade.

O senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE) foi contemplado, na época, com duas emissoras de rádio FM no Ceará, com o aval de ACM: uma no interior do Estado -na cidade de Iguatu- e outra na capital, Fortaleza.

O segundo é o senador José Agripino Maia (PFL-RN). Sua família recebeu uma concessão de TV em Natal (TV Tropical), e uma rádio FM na cidade de Mossoró (RN).

Ambos descartam a possibilidade de votarem influenciados pelas concessões obtidas no passado.

?Não é hora para acertos, desentendimentos, pequenas vinganças e muito menos para solidariedades que extrapolem o dever de cada um?, diz Alcântara.

O senador diz que não feriu regras para obter as concessões: ?As regras eram aquelas?, afirmou, referindo-se à distribuição das concessões por escolha política do presidente da República e do Ministério das Comunicações.

Ele lembra que este critério perdurou até o início do primeiro governo de FHC, quando foi instituída a venda das concessões por concorrência pública.

Diz ainda que obteve uma das concessões quando trocou o PFL pelo PDT e que votou contra a prorrogação do mandato de Sarney para cinco anos.

Agripino Maia, por sua vez, diz que a concessão da TV Tropical foi prometida a seu pai por Tancredo Neves e que José Sarney, que assumiu quando Tancredo foi internado e morreu, honrou o compromisso. ?Se houvesse dívida de gratidão, seria com Sarney, não com ACM?, afirmou.

Para o senador, ACM nada teve a ver com a aprovação do pedido de concessão. ?Mesmo que não fosse assim, eu não teria qualquer constrangimento na votação. O que vai decidir meu voto é o sentimento de justiça e o interesse nacional. Nada a ver com compromisso pretérito?, acrescentou.

Agripino Maia, que estava na Argentina durante a acareação entre os senadores e a ex-diretora do Prodasen Regina Borges, diz que a votação só deve acontecer com todos os fatos apurados: ?Não vou votar como um macaco em loja de louça?, afirmou.

958 concessões

Antonio Carlos Magalhães esteve à frente do Ministério das Comunicações nos cinco anos do governo Sarney, quando as concessões eram moeda política.

Levantamento feito pela Folha, com base em dados oficiais do ministério do início dos anos 90, mostra que foram aprovadas 958 concessões de rádio e TV na gestão de Magalhães.

Grande parte das concessões foi dada a políticos e seus familiares, a começar pelo próprio senador baiano, então ministro. As concessões da TV Bahia, pertencente a sua família, no interior do Estado foram autorizadas na época.

Pelo menos uma delas (TV Santa Cruz, de Itabuna) foi autorizada em nome de um sobrinho da mulher de ACM, André Menezes.

Sete dos atuais senadores foram agraciados com concessões no período, em nome próprio ou de seus familiares. Na Câmara dos Deputados, o número chega a 26.

Até o presidente do Senado, Jader Barbalho (PMDB-PA), maior adversário político de ACM na atualidade, obteve concessões de rádio e televisão na ocasião, emitidas em nome da ex-mulher,Elcione Barbalho, e de parentes."

Gilberto Dimenstein

"ACM e a droga do poder", copyright Folha de S. Paulo, 6/05/01

"Uma eventual cassação do mandato seria apenas um detalhe na galeria de tragédias pessoais colecionadas pelo senador Antonio Carlos Magalhães. Na sua história estão algumas das mais agudas dores que podem ocorrer na existência de qualquer indivíduo -perto delas, a punição no Congresso é insignificante.

Uma de suas filhas se matou em consequência das baixarias de uma disputa eleitoral, atingida na vida privada: visavam o pai, mas a bala moral acabou acertando na filha.

Outro filho, seu herdeiro político, morreu prematuramente, graças, em parte, à falta de cuidados com sua saúde.

Um genro foi encontrado com uma bala na cabeça; ainda hoje perduram as acusações, publicadas em livro, de que a ordem de extermínio teria vindo do sogro, então governador.

O próprio ACM encostou o dedo na morte, atacado por sérias disfunções coronarianas; alguns médicos apostavam que ele não sobreviveria à cirurgia.

Extremo da fortaleza, todo-poderoso, temido, invejado, bajulado, o senador experimentou, com a mesma intensidade, o extremo da fragilidade humana.

Justamente essa vivência com a fugacidade da existência, o desamparo do pai que chora a morte dos filhos, faz com que ele ofereça uma notável lição neste episódio da violação do painel eletrônico do Senado.

Natural e previsível que, em meio a tantas situações-limite, se reflita sobre o que é essencial na vida. A imensa maioria das pessoas que conseguiram sobreviver a doenças graves olha para trás e despreza o desperdício de energia que gastou com coisas menores -somente o ato de estar vivo, respirar, já é uma celebração. Geralmente, aparece uma sensação de grandeza.

Como os leitores desta coluna sabem, sou um crítico antigo de Antonio Carlos Magalhães, por considerá-lo um representante do que existe de pior em costumes políticos: intimidação, clientelismo e chantagem. Não mudei de opinião, apesar de saber que ele consegue cercar-se, algumas vezes, de técnicos de inegável competência.

Sinto-me obrigado, porém, a reconhecer que, depois da morte de Luís Eduardo, ele, talvez tocado pela sensação de grandeza de quem sente a fragilidade extrema, fez gestos grandes.

Ajudou a elevar o valor do salário mínimo, criou a CPI do Judiciário e, mais importante, produziu o Fundo de Combate à Pobreza. Por causa desse fundo, a verba do Programa Bolsa-Escola pulou neste ano de R$ 160 milhões para R$ 1,7 bilhão e deve atingir 6 milhões de famílias; são 10 milhões de crianças em idade escolar.

O problema é que ACM foi vítima de si próprio, ferido em sua vaidade, derrotado por Jader Barbalho; a vingança passou a ser o essencial, a principal força que o movia.

Ao encontrar-se com os procuradores, falou sobre a lista da votação secreta que cassou o mandato de Luiz Estevão, origem de sua armadilha.

Ter o acesso à lista era ter o acesso à informação, a ser utilizada -quem sabe um dia- como arma de chantagem e de intimidação; acuar os inimigos com dossiês sempre foi seu estilo mesquinho de brigar. E, até aqui, sempre tinha dado certo.

ACM involuntariamente se torna um grande mestre porque o desenrolar de sua história ensina como pouco aprendeu com suas dores, por causa do vício ao poder.

Somos educados com a idéia de que valemos não pelo que somos, mas por aquilo que temos; sucesso é ter carros, casas, prêmios, mandatos, altos cargos, dinheiro no banco, roupas.

Esse comportamento não é novo, mas agora está quase consensual. Não existem mais utopias, sonhos. O pragmatismo impera, numa reverência ao dinheiro e ao poder como objetivos essenciais: é o que aparece em todas as pesquisas que ouvem os projetos de adolescentes.

Às crianças é ensinado -na família, nos meios de comunicação e nas escolas- que o grande objetivo é acumular conquistas materiais e aí é medida a importância de um indivíduo.

Nada contra, claro, as pessoas batalharem por ter uma casa confortável, um bom carro etc.

O problema é que as escolas ensinam muita geometria e pouca filosofia, muita gramática e pouca arte, muita razão e pouca emoção.

Educa-se para o futuro, não para o presente; educa-se para o trabalho, não para a vida. Não se cultiva aquilo que os gregos já diziam na Antiguidade: o sucesso está na realização do autoconhecimento. É a educação para ser -e não somente para ter.

Não vai aqui nenhuma vocação hippie retardatária. O caso de ACM é apenas mais um entre tantos a mostrar que o culto obsessivo pelo sucesso e pelo poder é um vício que nos tira humanidade: por causa dele, o senador e tantos outros perderam a chance de ser e, ao mesmo tempo, também perderam o que poderiam ter.

No lugar do criador do Fundo de Combate à Pobreza e da CPI do Judiciário, entra o articulador ou, na melhor das hipóteses, o conivente com um crime, uma indelével mancha na história do Senado, em particular, e na da democracia, em geral.

PS -Por falar em educação para a vida e droga, outra cassação virou assunto nacional. Durante uma viagem escolar, quatro alunos de uma escola do Rio de Janeiro fumaram maconha e, por isso, foram expulsos.

O estigma da cassação escolar vai ser muito mais prejudicial à vida daqueles adolescentes do que a maconha. O papel verdadeiro da escola é ensinar a voar, não cortar as asas. Já existem meios mais civilizados e produtivos de combate às drogas. (E-mail – gdimen@uol.com.br)"

Silvio Bressan

"TV põe senadores entre o sucesso e o desastre", copyright O Estado de S. Paulo, 6/05/01

"Estrelas do novo espetáculo da mídia nacional, os senadores que aparecem nas sessões do Conselho de Ética do Senado brilham hoje no céu do cenário político, mas podem estar muito mais perto do inferno do que imaginam. Por enquanto, depois de mais de 30 horas de exposição na TV Senado, nas emissoras a cabo e nos grandes telejornais, eles acumulam um saldo positivo na opinião pública e largam na frente para a disputa eleitoral de 2002. Todo esse capital político, porém, irá para o ralo se os senadores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e José Roberto Arruda (sem partido-DF) não forem cassados. Essa é a avaliação de alguns especialistas em marketing político e opinião pública. Segundo eles, se tudo terminar em um grande acordo, todos os que participaram do processo correm o risco de não sobreviver na próxima eleição.

Será um preço alto para quem está no fim do mandato, como 10 dos 15 senadores do Conselho de Ética, que terão de se candidatar no próximo ano.

Mesmo entre os cinco com mandato até 2007, pelo menos dois têm pretensões eleitorais no próximo ano. Amir Lando (PMDB) pode se candidatar ao governo de Rondônia e Heloísa Helena (PT) pensa em disputar o mesmo cargo em Alagoas. Entre os que não fazem parte do conselho, mas batem ponto na frente da telinha, Eduardo Suplicy (PT-SP) sonha em ser candidato à Presidência e Pedro Simon (PMDB-RS) já foi até lançado pelo seu partido para o mesmo posto. Por enquanto, apesar de alguns exageros, todos estão no lucro.

É o caso do presidente do conselho, Ramez Tebet (PMDB-MS), que até agora tem sido um dos maiores beneficiados pelos holofotes da TV. Embora tenha presidido a CPI do Judiciário, em 1999, o senador continuava praticamente desconhecido fora do seu Estado e de Brasília. Agora, bastaram duas semanas de exposição na mídia e Tebet, sempre no centro da mesa, tornou-se um dos rostos mais conhecidos do conselho. ?Como era pouco conhecido e conduziu com muita elegância os trabalhos, ele foi um dos que mais ganharam?, avalia o cientista político e pesquisador Rubens Figueiredo.

Nada disso, entretanto, na opinião do especialista, será suficiente para Tebet garantir a reeleição ou disputar o governo do Estado no próximo ano, se tudo acabar em pizza. ?De grande magistrado que tem sido até agora, Tebet pode ficar como o grande pizzaiolo dessa história?, anota Figueiredo. Nessa hipótese, até mesmo os maiores defensores da cassação correm risco de não resistir às próximas eleições. ?O prejuízo será geral?, adverte Marcos Coimbra, diretor do Instituto Vox Populi. ?Tem senador que se acha a consciência crítica da Nação, mas para o público ele faz parte do mesmo espetáculo e ficará tão desacreditado quanto os outros.?

Da mesma forma, o cientista político e professor da USP Gaudêncio Torquato acha que os senadores entraram num caminho sem volta. ?Não há mais retorno, porque muitas pontes já foram queimadas?, afirma. ?Se o Senado não cortar na própria carne, será fatiado nas próximas eleições.?

Pizza – O professor de Ciência Política da PUC-RS e diretor do Instituto Meta de Pesquisa, Flávio Eduardo Silveira, reforça a convicção geral de que uma pizza no Senado teria efeitos colaterais para os senadores na disputa de 2002. ?As imagens que um participante do conselho poderia usar no próprio programa de TV vão acabar no horário político do adversário, para comprovar seu envolvimento no processo de salvação de ACM e Arruda?, prevê.

Ainda que o processo acabe na cassação dos réus, os especialistas ponderam que a simples exposição dos senadores na mídia não vai garantir a reeleição de ninguém. Depois de coordenar várias pesquisas qualitativas, onde um grupo de pessoas analisa o desempenho dos políticos, Marcos Coimbra, Flávio Silveira e Rubens Figueiredo atestam que o eleitor está cada vez mais exigente.

Na acareação de quinta-feira, por exemplo, eles acham que a verborragia de Simon e Suplicy, com intervenções de quase meia hora, ajudou menos do que imaginam seus autores. ?Depois das primeiras perguntas do Saturnino (Braga, relator do conselho) e da intervenção do Jefferson Péres (PDT-AM), pouca coisa restou a dizer?, anota Coimbra. ?Para que, então, depois de horas de depoimento, o Suplicy precisava levar mais de 27 minutos em uma pergunta que começou com Rui Barbosa??, espanta-se o diretor do Vox Populi.

O grande equívoco, observa Silveira, é o político achar que os dividendos da mídia são proporcionais ao tempo de exposição. ?O eleitor não gosta de discursos prolixos, porque tem a sensação de que está sendo enrolado?, diz o professor gaúcho. ?Uma pergunta direta e uma observação incisiva, como a do Jefferson Péres (‘Alguém aqui está faltando com a verdade’) vale mais do que meia hora de discurso?, compara Figueiredo. ?É isso que fica na memória do eleitor.?

Ainda assim, pontifica Coimbra, nada garante que a vitrine de hoje vai render votos amanhã. ?A notoriedade desse conselho é muito transitória?, considera ele. ?Vem aí uma CPI da Corrupção e daqui a um ano poucos se lembrarão desse episódio.? No seu entender, a enxurrada de denúncias não favorece ninguém, nem mesmo os acusadores. ?O eleitor está cansado e não individualiza, como imaginam os políticos?, adverte Coimbra. ?Para ele, a bola da vez não é nenhum parlamentar, mas o próprio Congresso.?"

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