Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Cadernos culturais: território colonizado


Esdras do Nascimento

 

C

omparados com os estrangeiros, os livros de autores brasileiros vendem muito pouco no país. Há forte preconceito contra tudo o que é nacional: cinema, teatro, música erudita etc. E esse preconceito é estimulado cada vez mais pela mídia, que dedica espaços generosos a tudo o que vem de fora e restringe ao mínimo a divulgação do que é produzido no Brasil. Dia 7.2.99, por exemplo, o caderno Idéias, do Jornal do Brasil, dedicou a capa e quase toda a segunda página a dois livros sobre Walter Benjamim: A travessia de Benjamim, romance de Jay Parini, traduzido por Maria Alice Máximo e editado pela Record, e Passagem de Walter Benjamim, ensaios de Pierre Missac e Lilian Escorel, publicados pela Iluminuras. A página 4 foi totalmente ocupada por um capítulo da coletânea de ensaios Clássico anticlássico, de Giulio Carlo Argan, lançada pela Companhia das Letras. Metade da página 5 divulga artigo de Sérgio Paulo Rouanet, sobre Goethe e a cidade de Marienbad. Na página 6 aparecem, ocupando três quartos da sua totalidade, entrevista de Pedro Sussekind, sobre tradução de textos de Hans Staden, e notícia longa sobre 116 reportagens focalizando a guerra do Vietnã, reunidas no volume Reporting Vietnam: American journalism, ainda não publicado no Brasil.

O caderno Prosa e Verso, de O Globo, da mesma data, dedica a capa, toda a segunda página e dois terços da terceira aos livros sobre Walter Benjamim. Essa terceira página é completada com resenha de um livro secundário de Émile Zola, ressuscitado pela Editora 34. Na contracapa, longa matéria sobre relançamento da Trilogia de Nova York, de Paul Austen, um escritor de quem se poderia dizer que, embora interessante, é de qualidade discutível. O detalhe, porém, é que os suplementos culturais, como norma, evitam publicar matérias sobre reedições de livros de autores brasileiros. Fechando o caderno, mais uma matéria sobre livros traduzidos: O saxofone baixo, A república das putas e A história do saxofonista. Os três, de um tcheco desconhecido – Josef Skovorecky – que os editores naturalmente pretendem vender como um novo Milan Kundera, que nunca foi grande coisa mas chegou várias vezes às listas de best sellers.

O Estado de S. Paulo, também de 6.2.99, exagerou essa tendência no seu Cultura – Caderno 2: capa e mais três páginas de artigos traduzidos sobre A Travessia, romance de faroeste do americano McCarthy, que a Companhia das Letras está lançando.

Quanto aos autores brasileiros… Bem, quanto aos autores brasileiros, Idéias, num ataque de generosidade, publicou três resenhas sobre Carta aos loucos, de Carlos Nejar, Cartas a uma jovem mãe, de Marion Penna, e Variações Goldman, de Bernardo Ajzenberg. Prosa & Verso deu colher de chá a dois poetas: Leonardo Fróes e Renato Rezende. E o Estadão publicou nota sobre Luís Fernando Verissimo e entrevista de Zulmira Ribeiro Tavares.

No dia 13 de fevereiro, Prosa & Verso deu capa e segunda página inteira sobre a biografia de Braudel, escrita por Pierre Daix e traduzida pela Record. A página 3 foi ocupada por matéria de Graça Magalhães sobre a violoncelista Anita Lasker, que conseguiu sair viva de Auschwitz porque tocava na orquestra de moças criada pelos seus carrascos. A última coluna trouxe resenha sobre Introdução a escombros, de Moacir Félix. A página 4, com exceção da coluna de Wilson Martins, que graças a Deus só fala sobre literatura brasileira, é dedicada aos contos de Ted Hughes (Dificuldades de um noivo) e ao ensaio Alucinando Foucault, de Patricia Dunker, traduzido pela Editora 34. Na página 5, além da relação dos mais vendidos e da seção Meu clássico, aparecem os Lançamentos, com notas sobre quatro livros traduzidos e um brasileiro. A contracapa inteira é sobre História de Florença, de Maquiavel, traduzida pela Musa Editora.

Idéias, da mesma data, dá na capa e na segunda página – onde aparecem a relação dos mais vendidos e uma resenha sobre os contos de Fernando Pessoa Ferreira – matéria sobre o romance Swann, de Carol Schields, traduzido pela Record. Na página 3, nos Lançamentos, três notas sobre livros estrangeiros e um brasileiro, além de resenha do livro Idéias fixas de João Cabral de Melo Neto. Toda a página 4 é ocupada por um texto de Júlio Bressane sobre Deleuze. Na página 5, além da coluna de Silviano Santiago, uma resenha grande, com foto do autor, sobre a tradução de O intocável, de John Banville. Na contracapa, entrevista de Nízia Villaça e notícia longa sobre autobiografia de Ernesto Sábato, publicada na Espanha.

O Estadão dedica a capa e as páginas 4 e 5 do seu Cultura ao Livro Negro do Comunismo, publicado na França e a ser lançado no Brasil no segundo semestre. As páginas 6 e 7 têm Spielberg como tema. Na página 3 aparecem entrevistas de Carlos Bratke, sobre a Bienal de São Paulo, e Sérgio Cabral, sobre música popular brasileira. A página 8 é sobre Chiquinha Gonzaga. E a contracapa divulga um livro sobre os bares de São Paulo.

Como se vê…

 

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