Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Carlos Alberto Di Franco

JORNAIS & TECNOLOGIA

"Acreditar nos jornais", copyright O Estado de S. Paulo, 18/08/03

"A melhor arma do jornal para se adaptar às novas tecnologias digitais é a qualidade do seu conteúdo. Há poucos anos, falando do alto da tribuna da Associação Mundial de Jornais, Bill Gates fez um exercício de premonição. O dono da Microsoft previu que no ano 2000 não haveria mais jornais impressos.

Hoje, ao contrário da sombria profecia de Gates, os diários continuam vivos.

Impõe-se, no entanto, um salto de qualidade, uma autêntica reinvenção. Foi disso que se falou no 4.? Congresso Brasileiro de Jornais, promovido pela Associação Nacional de Jornais (ANJ). O encontro foi bastante enriquecedor.

Gostaria, caro leitor, de sintetizar algumas das sadias inquietações que compartilhei com inúmeros colegas.

Os diários, não obstante a grave crise do setor, têm conseguido preservar seu maior capital: a credibilidade. A confiança da população na qualidade ética dos seus jornais tem sido um inestimável apoio para o desenvolvimento de um verdadeiro jornalismo de buldogues. O combate à corrupção e o enquadramento de históricos caciques da política nacional, apeados do poder e sem o respaldo de antigas impunidades, só foi possível graças à força do binômio que sustenta a democracia: imprensa livre e opinião pública informada.

Os jornais brasileiros têm cumprido um papel singular. Transformaram-se, de fato, numa instância decisiva de uma sociedade abandonada por muitas de suas autoridades. O Brasil, graças também à qualidade dos seus jornais, está experimentando uma profunda mudança cultural. A corrupção, infelizmente, sempre existirá. Faz parte da natureza humana. Mas uma coisa é a miséria do homem; outra, totalmente diferente, &eacueacute; a indústria da negociata e a certeza da impunidade. Estas, sem dúvida, devem e podem ser combatidas com os instrumentos de uma sociedade civilizada. A transparência informativa é o elemento essencial na renovação dos nossos costumes políticos.

Mas o cidadão que confia na integridade dos jornais é o mesmo que nos envia alguns recados: quer menos frivolidade e mais profundidade. Tradicionalmente forte no tratamento da informação, alguns diários têm sucumbido às regras ditadas pelo mundo do entretenimento. Ao atribuírem à televisão a responsabilidade pelo emagrecimento de suas carteiras de leitores, partiram, num erro estratégico, para um perigoso empenho de imitação. Acabamos, freqüentemente, imobilizados por uma falácia. A força da imagem, indiscutível e evidente, gerou um perverso complexo de inferioridade em algumas redações. Perdemos a coragem de sonhar e a capacidade de investir em pautas criativas. É hora de proceder às oportunas retificações de rumo.

A revalorização da reportagem e o revigoramento do jornalismo analítico devem estar entre as prioridades estratégicas. É preciso atiçar o leitor com matérias que rompam a monotonia do jornalismo de registro. Menos aspas e mais apuração. O leitor quer menos show e mais informação de qualidade. O sensacionalismo, embora festejado num primeiro momento, não passa pelo crivo de uma visão retrospectiva. Curiosidade não se confunde com aprovação. O prestígio de uma publicação não é fruto do acaso. É uma conquista diária. A credibilidade não se constrói com descargas de adrenalina.

O leitor não quer receber o noticiário do telejornal da véspera. Quer análise, interpretação, explicação. Quer, no fundo, algo que sirva para a sua vida. O que vai conquistar novos leitores é uma ágil e moderna prestação de serviços, é a matéria que ultrapassa a superficialidade eletrônica, é a denúncia bem apurada, é o texto elegante e bem escrito.

Há muito espaço para o jornalismo impresso. Trata-se de ocupá-lo. Com competência, ousadia, criatividade e, sobretudo, com ética. A percepção do cidadão a respeito do papel do jornal é um inequívoco reconhecimento do seu vigor editorial e da força da sua credibilidade. Isso é bom. Mas não pode se esgotar num mero reforço da auto-estima. Deve, sim, ser um ponto de partida.

Não podemos deixar a peteca cair. O Brasil depende, e muito, da qualidade técnica e ética dos seus jornais. (Carlos Alberto Di Franco, diretor do Master em Jornalismo para Editores e professor de Ética Jornalística, é representante da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra no Brasil E-mail: difranco@ceu.org.br)"

 

ZUZINHA vs. CLÁUDIO HUMBERTO

"Cláudio Humberto é processado por filho de Mário Covas", copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 13/08/03

"O colunista Cláudio Humberto não compareceu à audiência com o juiz Leandro Ribeiro da Silva, na 41? Vara Cível, no Rio, para tratar da ação de indenização que Mário Covas Neto, filho do ex-governador de São Paulo Mário Covas, move contra ele. O jornalista publicou notas em julho de 1999 na Tribuna da Imprensa, nas quais, segundo Zuzinha, como é conhecido Mário Covas Neto, prejudicaram sua imagem perante os patrocinadores do esporte que pratica – ele é advogado e piloto automobilístico e ficou em segundo lugar no campeonato brasileiro de stock cars.

Nas notas, o colunista diz que Zuzinha funcionaria como um operador ou testa de ferro de seu pai no atendimento de interesses e que haveria um tráfico de influências no governo paulista e na esfera da administração federal. ?O filho do governador paulista Mário Covas Neto, o Zuzinha, é reconhecido no submundo dos negócios como o operador de interesses do pai. Ele é afilhado de Antônio Dias Felipe, dono oficial da Tejofran e da Power, empresas muito ligadas ao governador paulista e cujos interesses contrariados terão inspirados ataques de Covas a Renan Calheiros?, escreveu Cláudio Humberto numa das notas.

Se Zuzinha ganhar a ação vai receber R$ 100 mil de indenização do colunista."

 

ASSÉDIO NA CORTE

"Assédio sexual mexe na caixa preta", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 19/8/03

"Glória Pádua Ribeiro Portela, ao apresentar queixa-crime contra o chefe que tentava boliná-la, não apenas encorajou outras mulheres a reagirem contra uma insistente prática machista. Ela abriu uma pequena brecha para que a imprensa e a cidadania brasileira dêem uma olhadinha na caixa preta do Judiciário, que o presidente Lula quer abrir através do mecanismo democrático do controle externo.

A natureza do sistema republicano é contrária à existência de qualquer corporação ou grupo de pessoas que o sistema legal considere intocável ou privilegiado – todos são iguais perante a Lei, afirma a Constituição. E a natureza do sistema democrático impõe a existência de controles e contrapartidas a qualquer centro de autoridade do Estado.

O presidente Bill Clinton praticou atos sexuais explícitos com uma estagiária, no centro máximo de poder dos Estados Unidos – o Salão Oval da Casa Branca. Com um pequeno detalhe: sequer cometeu um crime, porque Mônica Leviski entrou no Salão por sua vontade e o que ocorreu no Salão foi um ato livremente consentido por dois adultos. A imprensa contou tudo (infelizmente não conseguimos fotos!) e o Poder Executivo americano sobreviveu.

Além de prontamente colocar sob segredo de Justiça a ação iniciada por Glória, o presidente do STJ, ministro Nilson Naves, segundo alguns jornais, teria tentado um acordo (custo a crer porque a lei diz que uma autoridade não pode se omitir diante da denúncia de crime), procurando convencer Glória a simplesmente mudar de gabinete, indo trabalhar para outro ministro.

E é aí que a queixa de Glória permite uma olhadinha (e excelente sugestão de pauta) na caixa preta. Ela é filha de outro ministro do STJ, foi aprovada em concurso público realizado por esse tribunal e, logo depois de empossada, assumiu um cargo de confiança e dobrou seu salário, não convidada pelo pai, mas por outro ministro.

Se eu fosse repórter em Brasília, iria fazer um levantamento de todos os ocupantes de cargos de confiança no STJ, quanto ganham, em que concursos foram aprovados, natureza de suas funções etc. E, naturalmente, verificaria qual é a percentagem de parentes dos ministros, até para demonstrar o contrário, isto é, que Glória é apenas uma exceção.

O ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal, afirmou, em entrevista publicada pelo jornal O Globo na edição de segunda, 18/8, que o Judiciário está sob ataque por conta de erros cometidos por uma pequena minoria de magistrados. E vai mais longe, aponta a morosidade e a ineficiência como razões da descrença da sociedade na Justiça. Sem dúvida, ele tem razão.

Mas a melhor maneira de se manter um Judiciário acima de qualquer crítica – e, como a mulher de César, não seja apenas honesto, mas também pareça honesto – é a aceitação de controle externo, que permitiria um olhar menos temeroso da imprensa e uma confiança maior da cidadania na Justiça.

A imprensa e o povo brasileiros ficam lhe devendo essa, dona Glória."