Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Christiane Samarco

REFORMA MINISTERIAL

“Lula nega, mas reforma ministerial avança”, copyright O Estado de S. Paulo, 7/1/04

“BRASÍLIA ? O presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou ontem, em nota oficial, ter tomado qualquer decisão sobre a reforma ministerial e desautorizou especulações sobre prazos. A nota não interrompeu as negociações de bastidor, mas esfriou as expectativas de que as mudanças ocorram esta semana. Com ela, segundo interlocutores, o presidente quer pôr ?ordem na casa? e deixar claro que só ele define o tamanho e o tempo das mudanças em sua equipe.

?Tendo em vista notícias desencontradas nos últimos dias sobre possíveis alterações no ministério, o presidente reitera que ainda não tomou qualquer decisão. Desautoriza assim especulações sobre prazos para uma possível reforma ministerial?, diz a nota. ?O presidente considera que tal noticiário especulativo não ajuda o País, na medida em que pode ter como efeito prejudicar o bom andamento da administração.?

Embora a agenda presidencial dos últimos dias inclua personagens que estão em todas as especulações do próprio governo ? caso do ministro Miro Teixeira (Comunicações) -, nem o PMDB acredita mais em reforma antes da viagem de Lula ao México, segunda-feira. Segundo fontes do governo, ele teria ligado a alguns ?demissionários? para dizer que continuem trabalhando normalmente.

Por mais que Lula tenha optado por uma reforma pequena e pragmática agora, ganha força no governo e nos partidos aliados a idéia de que ele precisará de mais tempo para fechar o xadrez da inclusão do PMDB na equipe. Primeiro, por causa das dificuldades com o PMDB do Senado, que tem uma dezena de candidatos a ministro.

Social

Além disso, dois interlocutores de Lula disseram ontem que ele não descartou a idéia de unir a questão administrativa à política e ir além da simples inclusão de um deputado e um senador do PMDB na equipe. ?O presidente ainda cogita aproveitar esta reforma para dar mais eficiência ao governo, especialmente na área social?, contou um interlocutor. Segundo ele, Lula quer centralizar os programas sociais.

Ainda assim, a reforma terá de ocorrer este mês. De um lado, a convocação extraordinária do Congresso, que começará dia 20, abre espaço às pressões políticas de aliados que desejam ficar ou ingressar na equipe. De outro lado, o PDT estabeleceu prazo de saída do governo. Reunida ontem no Rio, a executiva do partido decidiu que todos os integrantes do governo terão de abandonar seus postos até dia 31. Além de Miro, o PDT tem três ex-deputados no segundo escalão: Airton Dipp preside os Correios, Neuton Friedrich é diretor da Itaipu Binacional, e Vivaldo Barbosa é presidente da Braspetro.

Miro

Com isto, Miro precisa definir seu novo partido, possivelmente o PSB. Apesar do silêncio de Lula, continuava alta ontem a aposta de que Miro sairá para ceder as Comunicações ao líder do PMDB na Câmara, Eunício Oliveira (CE). Embora não afirme que a escolha de Eunício já é certa, o vice-líder do governo na Câmara Sigmaringa Seixas (PT-DF) reconhece que ele é forte candidato. ?Eunício conseguiu que a bancada da Câmara votasse praticamente fechada com o governo. Isso se deve à liderança e à autoridade do líder sobre a bancada e o governo é reconhecido.?

Como a situação no Senado é confusa, o líder Renan Calheiros (AL) decidiu que só vai reunir os candidatos a ministro depois que o governo decidir. ?Vamos aguardar pacientemente que o presidente nos convoque para dizer que espaço pretende destinar ao partido. Se não for chamado, só voltarei ao Congresso no início da convocação?, disse Renan ontem. (Colaboraram Eugênia Lopes, Cida Fontes e Leonêncio Nossa)”

 

“Especulando”, copyright Folha de S. Paulo, 8/1/04

“BRASÍLIA ? Desde maio de 2003, a imprensa anuncia que o Planalto pretende fazer uma reforma ministerial, até mesmo para dar vagas no ministério para o PMDB e para consolidar a base parlamentar do governo. Pura especulação.

Com a notícia da reforma, logo passou-se a destacar que alguns ministros não estavam funcionando e que precisavam ser mudados. Nem vale repisar aqui, para não parecer implicância. Chegou-se também à inevitável conclusão de que há ministérios e secretarias de mais para resultados de menos. A hora seria boa para trocar quem não deu certo e para reduzir a máquina. Pura especulação.

No meio de tanto ?noticiário especulativo? -como recriminava a nota oficial da Presidência anteontem-, publicou-se até que José Dirceu (o superministro político) havia negociado cargos com o PMDB. Pelo sim, pelo não, o presidente da República resolveu dar um chega-pra-lá em Dirceu e avisá-lo de que quem manda no boteco é ele, presidente. Pura especulação.

A reforma foi sendo postergada para o início deste ano até pela falta de disposição de Lula de afastar amigos, meter a mão da cumbuca, azeitar a máquina, chacoalhar o próprio governo. Pura especulação.

Agora, com a nota que desautoriza ?as especulações?, advertindo que o noticiário especulativo ?não ajuda o país? e prejudica ?o bom andamento de setores da administração pública?, parem-se as máquinas!

Jornais e jornalistas devem entrar em recesso, com o Judiciário, o Legislativo e alguns ministros que andam tomando banho de mar por aí. Nada se apure, nada se diga, nada se escreva e nada se pense sobre a reforma, aguardando que Lula tome uma decisão e anuncie oficialmente.

Até lá, senhoras e senhores, tenham o dito pelo não dito. Pela nota, não há reforma nenhuma, os ministros são todos eficientíssimos, os ministérios e secretarias estão de bom tamanho. Ah!, e o PMDB não vai ter cargo nenhum, nem o líder do partido na Câmara, Eunício Oliveira, vai ser ministro. Era tudo especulação!”

 

“Fora do tom”, copyright Jornal do Brasil, 8/1/04

“Há muitos assuntos nos quais não convém o Estado se imiscuir, e um deles é o trato da informação. Qualquer interferência nesse campo tem, sempre e inevitavelmente, conotação restritiva, o que é incompatível com a normalidade institucional.

Quando o presidente da República faz divulgar nota oficial considerando o noticiário sobre a iminente troca de ministros prejudicial ?ao bom andamento de setores da administração pública?, emite juízo a respeito de um valor absoluto para a coletividade.

O acesso à informação é um direito constitucional, não uma questão de gosto.”

 

“?Especulações? que Lula quer banir do noticiário”, copyright Folha de S. Paulo, 11/1/04

“O Palácio do Planalto anda abespinhado com a imprensa. Em nota, abominou as ?especulações? em torno da prometida reforma ministerial. Mas Lula demora a se decidir. E não resta senão raciocinar com hipóteses. Das mais pessimistas às mais otimistas.

Com o PT na Presidência é grande o leque de alternativas. As surpresas não param de saltar de dentro do embrulho preparado por Duda Mendonça. Por trás dos slogans e dos efeitos especiais de 2002 se esconde um espetáculo que 2003 mal insinuou.

Na pior das hipóteses Lula trocará o que resta da aura de castidade petista pelo vago apoio do PMDB. Um aliado que, acomodado no ministério, será favorável a tudo e contra qualquer coisa. Na melhor das hipóteses o apocalipse virá antes da reforma. De volta à Terra, Cristo excluirá o PMDB do grupo dos justos. E mandará o partido para o inferno.

Na pior das hipóteses, Lula manterá inalterada a atual equipe. Em comunicado oficial, dirá aos eleitores que não lhes deve nada, muito menos explicações. Na melhor das hipóteses o presidente informará ao país que em 2004 tudo será diferente: ?Vamos tentar de novo, pessoal, só que agora com o PMDB?.

Na pior das hipóteses Lula entregará dois ministérios ao PMDB. Na melhor das hipóteses o presidente será acometido por um surto de amnésia. Fugirá do hotel na viagem ao México. Um velho amigo o reencontrará numa porta de fábrica em São Bernardo. Vendo-o ali, roupas em desalinho, barba por aparar, repetindo uma única frase -?Há 300 picaretas no Congresso?-, discará para Marisa.

Na pior das hipóteses Lula confiará ministérios a Eunício Oliveira e Garibaldi Alves apenas para restituir ao PMDB os cargos e as verbas a que o partido se habituou. Na melhor das hipóteses o presidente os fará ministros só para completar o ciclo de prazeres do poder. O horário no Planalto é flexível, o dinheiro é razoável, viaja-se bastante. Mas nada deve ser tão prazeroso quanto a sensação de poder demitir Eunício e Garibaldi um dia depois de tê-los nomeado.

Na pior das hipóteses Lula acomodará o PMDB nos ministérios das Comunicações e das Cidades. Na melhor das hipóteses o presidente entregará à legenda de José Sarney as pastas dos Transportes e da Integração Nacional. Os peemedebistas já estão afeiçoados à lama e ao movimento de máquinas nos canteiros das obras rodoviárias, ao vaivém de influências nos guichês da Sudam e da Sudene… Escândalo por escândalo, melhor ficar com os de sempre.

Na pior das hipóteses Lula manterá Ricardo Berzoini no Ministério da Previdência. Na melhor das hipóteses o presidente deslocará o companheiro petista para uma turbinada pasta social. Governo que se dispõe a eliminar desigualdades não pode humilhar apenas os velhos. Há uma legião de pobres a ultrajar.

Na pior das hipóteses Lula demitirá Benedita da Silva. Na melhor das hipóteses o presidente poupará a amiga. O camarada José Dirceu não admite perder atribuições. Não seria recomendável eliminar-lhe a prerrogativa de atacar cotidianamente a colega nos bastidores.

Na pior das hipóteses Lula conservará Ciro Gomes onde se encontra. Na melhor das hipóteses o presidente o transferirá para o Planejamento. Corre-se o risco de criar um salseiro na área econômica. Mas cada nova divergência será uma oportunidade para que Antonio Palocci reafirme os rumos traçados. Mudanças na economia, só aquelas que não inspirem na minoria privilegiada o temor da perda do controle da situação.

De viagem marcada para hoje, Lula terá mais alguns dias para pesar prós e contras. Deveria esquecer a imprensa. Não há motivo para preocupações. Tome as decisões que tomar, receberá do pseudojornalismo um tratamento ameno.

Hipnotizada pela perspectiva de socorro do BNDES, parte expressiva da mídia venderá a capitulação como ?amadurecimento?. Lula será sempre o líder realista obrigado a lidar com políticos sórdidos.

Numa atmosfera de tolerância tática, o contraditório tende a ser extinto. Só uns poucos chatos ousarão atravessar o ritmo de oba-oba. Gente impatriótica, interessada em prejudicar o bom funcionamento da administração pública.”