Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Cobertura de sucesso

MÍDIA BRITÂNICA

Em matéria de cobertura, esta guerra é dos britânicos. Recentemente, o Sunday Telegraph de Londres foi o único veículo a divulgar que Osama bin Laden justificou os ataques de 11/9 em vídeo que circulava entre seus seguidores, fato que o primeiro-ministro Tony Blair citou como evidência de sua cumplicidade. O jornalista Anthony Loyd, do Times londrino, descobriu em Cabul documentos que ensinavam como montar um dispositivo nuclear. E quando o mulá Omar, líder do Talibã, quis dar declarações diante do recuo de suas tropas, foi para a BBC que ele ligou.

Mas a quantidade de furos de reportagem não é mero reflexo do zelo dos repórteres ingleses, salientam Alessandra Stanley e Bill Carter [The New York Times, 16/11/01]. Ajuda, e muito, ter um governo mais cooperativo e menos reticente que o americano: foi um alto militar britânico quem revelou, em outubro, a possibilidade de que tropas terrestres operassem no Afeganistão. Além disso, o World Service da BBC conta com inúmeros fãs naquele país; sua popularidade se deve, em parte, ao sucesso da novela New home, new life.

Em matéria para o The Guardian (15/11/01), Matt Wells comenta os principais destaques da conferência News World, em Barcelona. Em debate sobre a cobertura televisiva do 11 de setembro, o vice-diretor de notícias da BBC, Mark Damazer, revelou a política da rede de não descrever os ataques aos EUA como terrorismo. Embora convidados e colaboradores do World Service possam classificá-los como atos de terror, os correspondentes devem usar "ataque", um termo mais neutro.

Damazer defende que não há intenção de minimizar o ocorrido, mas evitar o uso de um termo "subjetivo". "Por mais aterrador e repugnante que tenham sido [os ataques], parte de nossos ouvintes não os considera terrorismo. Descrevê-los como tal poderia comprometer nossa reputação de emissora independente e imparcial", explicou. Pelo mesmo motivo, os ataques do IRA não são apresentados como terroristas.

No mesmo debate foram feitas críticas ao comportamento da imprensa dos EUA. Tony Burman, diretor executivo da Canadian Broadcasting Corporation, afirmou que a mídia americana falhou ao dar conta da perspectiva internacional: "É deprimente ver o nacionalismo exacerbado que lamentavelmente faz parte da cultura e do espírito da cobertura."

NA LINHA DE FRENTE

Enquanto programas de entretenimento da TV americana tentam ajudar o povo a fugir da realidade, os noticiários atrapalham. Até três semanas atrás, ou seja, antes das recentes derrotas do Talibã, a mídia parecia ter o consenso de que a guerra no Afeganistão era um fracasso. Os substantivos mais usados pelos repórteres, sobre cenários deprimentes e perspectivas de um longo e escuro inverno, eram "pântano" e "Vietnã", conta Howard Kurtz [The Washington Post, 19/11/01].

Charles Krauthammer, colunista do Washington Post, é um dos jornalistas que se mostram céticos, como na coluna de 30 de outubro. "A guerra não vai bem. O Talibã não recuou. Nem um único líder importante do Talib&atildatilde; foi morto ou capturado. Ao contrário", afirmou. Um artigo do New York Times de 31 de outubro segue a mesma linha. "O Afeganistão poderia se tornar um outro Vietnã? Estão os EUA enfrentando outro beco sem saída no outro lado do mundo?", pergunta o jornal. "As dúvidas podem ser prematuras, três semanas depois de iniciada a luta. Mas absurdas não são."

Jacob Helbrunn, do Los Angeles Times, acha que o governo americano não está sabendo lidar com o desafio. Escreveu em 4 de novembro que "os esforços na guerra estão em grande perigo. Os EUA não estão se dirigindo à lama; já estão lá. O país não está perdendo o primeiro round contra o Talibã; já perderam." O USA Today de 9 de novembro também não se mostrava otimista. "Apenas um mês depois de iniciada a guerra dos EUA no Afeganistão, especialistas militares cada vez mais chegam à mesma conclusão: ataques aéreos e comandos não serão suficientes para derrotar o Talibã e a al-Qaeda, rede terrorista de Osama bin Laden."

Não é de estranhar que o vice-presidente americano Dick Cheney tenha se revoltado. "Quando se lê na imprensa de Washington o que todos os especialistas e formadores de opinião têm a dizer, é bom lembrá-los de que muito do que falam têm se revelado absolutamente errado", disse Cheney.