Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Conar propõe medidas pífias

BEBIDAS ALCOÓLICAS

Didymo Borges (*)

As indústrias de bebidas alcoólicas, mancomunadas com o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar), querem dar um golpe na nação e nos predicados cívico-morais da família brasileira. Antecipando-se aos resultados de diversos projetos em tramitação no Congresso Nacional, bem como às anunciadas normas do governo para regulamentar a propaganda de bebidas alcoólicas, o Conar anunciou uma série de medidas regulatórias [veja remissão abaixo] que supostamente substituiriam a legislação da propaganda destes produtos, ou seja, de cervejas, vinhos e destilados.

Ocorre que a regulamentação proposta pelo Conar é pífia, e se constitui numa tentativa de ludibriar a nação, pois não coíbe a publicidade nos seus aspectos mais perversos. Por exemplo: a obrigatoriedade da aposição de aviso sobre os riscos de dependência é enganadora, pois em geral se resume à inscrição, na embalagem, da mensagem "Beba com moderação".

Bêbados e armados

Ora, isso, com o verbo no imperativo, não é advertência, é um apelo para que o consumidor beba! As mensagens nos rótulos deveriam ser redigidas pelo Ministério da Saúde, como nos maços de cigarros. Uma advertência muito pertinente para as cervejas seria: "O consumo freqüente pode criar dependência". Ou ainda: "Seja moderado. O excesso de consumo inabilita para dirigir veículos automotores".

A suposta oportunidade do Conar levanta a suspeita de que foi combinada com as indústrias de bebidas. Há pouco ouvia uma rádio transmitir um jogo de futebol com patrocínio de uma indústria de cachaça. Isto é moralmente inadmissível, se existe o objetivo de se evitar que o hábito de beber não seja desenvolvido por jovens em idade de escola fundamental e de nível médio. Sabe-se desde já que a luta contra as indústrias de bebidas será extenuante, pois só as cervejarias têm verbas publicitárias que atingem, anualmente, soma superior a 600 milhões de reais. Sabe-se, também, que as bebidas alcoólicas matam tanto quanto as armas de fogo, que vitimam anualmente mais de 40 mil brasileiros, que tombam baleados. O número de brasileiros vitimados por acidentes de trânsito ocasionados por motoristas alcoolizados é da ordem de 30 mil mortos/ano.

Uma verdadeira e consentânea regulamentação da propaganda de bebidas alcoólicas só entrará em vigor com vontade política. Sem vontade política continuaremos vítimas potenciais de embriagados, do mesmo modo que sujeitos às balas de pessoas armadas indevidamente. Pior ainda é quando temos de enfrentar o desvario daqueles que, além de embriagados, estão armados!

(*) Professor de Economia aposentado, Recife

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