Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Contingências da teoria e da prática

CATEDRA DE JORNALISMO

Victor Gentilli

A ostensiva e evidente piora na qualidade do jornalismo praticado no Brasil, fruto sobretudo dos vícios decorrentes do sistema midiático que se consolidou a partir dos grandes grupos que dominam a mídia brasileira, em especial na década de 1990, impôs aos cursos um novo e muito mais complexo desafio.

Se antes o grande problema era vincular teoria e prática, o que sempre foi uma coisa complicada nestas terras, particularmente em virtude da inexistência de modelos de jornalismo em que os novos estudantes pudessem mirar-se, a situação hoje vai se tornando cada vez mais desafiadora. Como explicar aos alunos que jornalismo é serviço público, se jornalões e revistas semanais fazem apenas jornalismo declaratório, superficial, editorializado e espetacularizado?

Vale o registro do pioneirismo dos colegas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), instituição na qual subsiste talvez o único curso em que novos modelos de prática profissional (alguns ainda nem praticados no Brasil, como o jornalismo de precisão e o jornalismo assistido por computador) podem ser conhecidos pelos alunos. Além disso, já há alguns anos ali se montou um curso onde a prática e a reflexão sobre esta prática são duas atividades quase inseparáveis. Quando criaram a Cátedra RBS, permitindo aos estudantes um diálogo franco e aberto com dirigentes e profissionais das empresas do maior grupo de comunicação sulino, foram incompreendidos por muitos. Pouco depois, evidentemente que numa espécie de contraponto, criaram a Cátedra Fenaj, muito interessante e aberta, mostrando que o pluralismo pode ser praticado de fato.

A Cátedra Fenaj é uma experiência interessantíssima. Os convidados para debater com os estudantes têm as mais variadas posições em relação à política e ao jornalismo. As cátedras Fenaj e RBS se realizam em atividades de aula, para grupos de no máximo 40 alunos. Há debates, questionamentos, as inquietações aparecem e se manifestam claramente.

Lamentavelmente, não é o que ocorre agora em São Paulo com a parceria entre as Faculdades Integradas Alcântara Machado (FIAM) e o Grupo Folha. Significativo que o primeiro ato da parceria seja a concessão ao empresário Octávio Frias de Oliveira do título de "Professor Honoris Causa". Se algum leitor estranhou a expressão, explico: o nome comum dessa homenagem é "Doutor Honoris Causa". Mas este título apenas as universidades podem conceder. Como as empresas educacionais de Edevaldo Alves da Silva, embora criadas em 1972, continuam apenas como "faculdades integradas", tiveram que inventar um novo nome para o título ? que, aliás, não tem valor acadêmico algum.

Os indícios de que a nova Cátedra de Jornalismo será mero espaço de divulgação institucional do jeito Folha de fazer jornalismo infelizmente parecem muito fortes. É verdade que profissionais de renome vão participar e relatar suas experiências aos alunos. Mas não serão aulas. Serão palestras, e em palestras há apenas o monólogo; no caso, a propaganda do modelo de jornalismo da Folha de S.Paulo.