Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Crime e o fetichismo midiático

MATRICÍDIO & PARRICÍDIO

Alberto Dines

Psicanalistas, sociólogos, cientistas sociais, filósofos e toda uma legião de especialistas autoconvocaram-se para oferecer suas respectivas "pensatas" ou "gritatas" sobre o duplo crime na mansão do casal von Richthofen, no bairro paulistano de classe média alta do Campo Belo.

Nada contra: horror e indignação, mesmo que intermitentes e espasmódicos, deixam resíduos capazes de gerar antídotos. Reflexão faz bem, em qualquer circunstância. Catarses são recomendáveis em situações de pasmaceira.

Vale a pena adicionar um prisma ao estupor diante da ação dos três jovens assassinos: os estereótipos, o fetichismo mediático

A louraça bandida confessou que estava maconhada na noite em que matou a mãe e o pai. Não foi a primeira vez, não era cocaína, era uma droga "leve", dessas disponíveis em qualquer festa.

Aos 19 anos, nada tem de adolescente: mulher formada, sem repressões, vida sexual plena. Ao enterro dos pais que ajudou a matar, além das lágrimas parcimoniosas, vestia-se ao rigor da moda: umbiguinho à mostra como se recomenda em todas as bíblias de comportamento. Acreditava que estava "bem", integrada aos padrões visuais, atendia a todas as exigências, era normal.

O comportamento do namorado não discrepou do que se convencionou designar como vanguarda e modernidade. Vitrine ambulante de tatuagens ? última palavra em matéria de adornos do corpo e expressão da alma ?, tinha, além disso, um hobby inocente: possantes motos. Se há lojas que as vendem, ídolos que as usam e estímulos para exibi-las, não infringe código algum. Ao matar e roubar estava legal, numa boa, por dentro. In.

A opção do assassinato foi adotada por três adultos da classe média alta, alimentados, razoavelmente instruídos, a caminho de desempenhar suas funções sociais. A autora da idéia ainda tem a seu favor um atendimento psiquiátrico e psicológico ao longo da vida, propiciado pela mãe.

A trinca assassina nada fez de errado. Não são marginais, mas rigorosamente incluídos. Gente como a gente ? consome, diverte-se, busca prazeres, identidades e total liberdade.

Esta é a tragédia maior de uma sociedade que através dos seus condutos de comunicação dedica-se em grande parte a fabricar manias, modismos e "febres", incapaz de equilibrá-los com um mínimo de valores morais.

Os assassinos não precisam ir a júri, os rábulas já estão a postos para fazer das vítimas os vilões. Os comunicadores precisam de algo quente para comunicar.