Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Crítica da mídia como solução de conflitos

OBSERVATÓRIO,
7 ANOS

Alberto Dines

Contenciosos sempre foram resolvidos
através da negociação. Arbitragens, intermediações
de terceiros ou contatos diretos entre as partes têm sido
as soluções para desarmar conflitos, bélicos
ou não.

Nesta Era da Informação, litígios travam-se principalmente
na esfera da comunicação ? o que torna decisiva a batalha
pela conquista dos corações e mentes nos campos adversários
(independente de quem arrebanhou os louros da vitória).

Em países democráticos, ao contrário dos regimes autoritários, a disputa informativa vai além do mero confronto entre versões, sofisticou-se a contra-informação de tal forma que hoje inclui a avaliação dos emissores adversários.

Significa que a crítica da mídia hoje faz parte do arsenal daquilo que antes era designada como “guerra psicológica”. A partir dos conflitos na ex-Iugoslávia (incluindo a guerra do Afeganistão, a Intifada-2 e a crise interna na Venezuela), a mídia, ela própria, tornou-se uma frente de batalha. E, por conseguinte, observada com os mais sofisticados recursos.

Hoje temos ONGs e instituições para-acadêmicas organizadas com a finalidade precípua de examinar a lisura da batalha midiática. Algumas buscam a neutralidade assumindo o desconforto de serem criticadas pelos contendores, outras usam a camuflagem da isenção para melhor servir aos seus interesses.

Ambas são bem-vindas. Vale o confronto. Os militantes “incorporados” à crítica ganham nos primeiros momentos e perdem na crise seguinte.

Forçar repetições é fazer o jogo das simplificações, mas como mero exercício referencial é possível encontrar traços do final do século 18 neste início do 21. Estamos num período algo parecido com o Iluminismo (Aufklärung, esclarecimento em alemão, seria mais preciso), violenta irrupção de saberes, conhecimento, informações e até preconceitos derrubando fronteiras nacionais e barreiras de classe, encurtando distâncias e arredondando diferenças.

Apesar dos enciclopedistas e dos filósofos, o fim do absolutismo trouxe também muito lixo (como o demonstra Robert Darnton nos seus trabalhos sobre o período na França). Com o entulho e a baixaria, sedimenta-se um resíduo que na geração (ou safra) seguinte funcionará como adubo. Os niilistas, pessimistas e zangados que nos perdoem, mas os avanços são inevitáveis. Apesar da aparência de caos, da prepotência, das guerras, do ódio religioso e da violência política.

Tendências reais

A contracultura dos anos 1960/1970 materializou-se no conceito de contrapoder, cuja manifestação mais importante pode ser chamada de antimídia. Passeatas e quebra-quebras não representam o contrapoder, são meras exibições de voluntarismo. A crítica da mídia, esta sim, representa uma forma institucionalizada de oposição porque está focada (o uso do verbo é intencional) no mais importante vetor da atual conjuntura.

A observação da mídia não é apenas arma de guerra, ao contrário, é arma para garantir a paz. Entre nações e dentro das nações. Neste momento, a solução de conflitos passa obrigatoriamente pela implantação de um amplo processo de conscientização e monitoração capaz de desarmar as distorções informativas. Aleatório, desregulado e múltiplo estabelecerá uma trincheira de ceticismo contra o avanço do marketing imagético ou conceitual que tanto prejudica o entendimento entre criaturas tribos e nações.

Observatórios da imprensa na Venezuela, em Cuba, na Rússia, no Oriente Médio inteiro e não apenas na Palestina, devidamente saneados de quaisquer ressentimentos ou idiossincrasias, poderiam ajudar a distensão e arrefecer as animosidades que transitam na ? e são exacerbadas pela ? mídia.

A meta da despolitização e do desengajamento partidário não é absurda ou utópica. Basta estabelecer o princípio de que a verdade é uma ficção e a busca da verdade é uma alternativa concreta, permanente. A cada afirmação deve corresponder um esforço não para negá-la ? isso sim seria impraticável ?, mas para equacioná-la.

Quando examinamos o “jornalismo patrioteiro” americano convêm verificar se a imprensa francesa também não cerrou fileiras em torno da posição do seu governo. Não poderia ser chamada de patriótica (ou responsável) uma certa benignidade da nossa imprensa com relação ao governo Lula passados os ajustes dos primeiros 100 dias? Claro que sim, e isto não pode ser encarado como desserviço ao leitor. A idéia de que a imprensa legitima-se apenas quando faz barulho é fruto da noção de que a mídia é uma criatura e, não, um sistema polimórfico e livre.

Estas reflexões sobre a mídia e a crítica da mídia servem de pano de fundo para a rememoração e comemoração do 7? aniversário deste Observatório da Imprensa. Projeto concebido numa universidade pública (Unicamp), gerou um website e um programa semanal de TV em rede nacional, que agora completa cinco anos de ininterrupta existência enquanto a edição online entra no seu oitavo ano de atividades. Ambos estão abrigados numa entidade autônoma, o Instituto ProJor (Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo).

O UOL, maior e mais antigo portal brasileiro de informações, festeja seus sete anos de vida. A ele o Observatório online esteve associado ao longo dos quatro primeiros anos de vida até transferir seu conteúdo para o iG, em 5 de agosto de 2000 (edição n? 95) [ para ver o índice da edição] .

A web (interface gráfica da internet) completa a sua primeira década de vida. Graças a ela viabilizou-se uma rede mundial de informações que mudou drasticamente a forma como o cidadão de hoje converte-se em homem do mundo. Sem a internet e a web não existiria o Observatório da Imprensa, e o conceito da observação da mídia não teria entre nós a dimensão que alcançou.

Esta não é uma efeméride particular e isolada. É um conjunto de tendências que se tornam realidade.