Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Daniel Castro e E.L

FUTEBOL & TV

"Relação da Globo com cartolas é investigada", copyright Folha de S. Paulo, 14/10/01

"O tribunal do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica, do Ministério da Justiça) decidiu, por unanimidade, instaurar inquérito para investigar os contratos de venda de direitos de transmissão dos campeonatos de futebol em televisão.

A investigação foi aberta, na semana passada, diante de indícios de abuso de poder econômico e formação de cartel, tanto por parte das emissoras quanto dos clubes de futebol.

Serão analisados os contratos assinados em 1997, que vigoraram até 1999, mas a decisão final do Cade pode mudar o relacionamento comercial entre as TVs e os clubes daqui por diante. Um dos pontos questionados é a legalidade da exclusividade de transmissão, da qual a Globo é hoje a principal beneficiária. Para a procuradoria do Cade, a exclusividade constitui ?forte elemento de abuso do poder econômico?.

As Organizações Globo detêm direitos de transmissão de mais de 20 torneios e dos amistosos da seleção brasileira. A maioria, desde 2000, é exclusiva da Globo. A emissora está comprometida com direitos que somariam cerca de US$ 570 milhões. Só pela Copa do Mundo de 2002, a empresa desembolsou, oficialmente, US$ 120 milhões, mas há no mercado versões de que esse valor seria de US$ 220 milhões.

A investigação vai abranger duas empresas das Organizações Globo -TV Globo e Globosat- além da TV Bandeirantes e da TVA, do grupo Abril. Da parte dos times, serão investigados o Clube dos 13, que representa os maiores clubes de futebol do país, e o Clube dos 11 (ou Clube Brasil), que representa os times da segunda divisão. A CBF (Confederação Brasileira de Futebol) foi excluída, por não fazer parte dos contratos.

Histórico

Em 97, Globo e Bandeirantes se juntaram para negociar com o Clube dos 13 a exclusividade de transmissão do Campeonato Brasileiro em televisão aberta. O contrato chamou a atenção dos procuradores do Cade Chandre de Araújo Costa, José Cândido Carvalho Júnior e Rogério Santos Munizes. Segundo eles, as duas emissoras se uniram para derrotar o SBT -que também se candidatava a adquirir os direitos de transmissão-, o que configuraria indício de formação de cartel.

Naquele mesmo ano, o Clube dos 13 rompeu o contrato com a TVA (grupo Abril) para transmissão dos jogos pelo canal ESPN Brasil (então controlado pela TVA, mas que hoje é 25% da Globo). Paralelamente, firmou compromisso de exclusividade com a Globosat, o braço das Organizações Globo para o fornecimento de programação às empresas de TV por assinatura do sistema Net.

Sem acesso aos jogos de maior prestígio, a TVA fechou acordo semelhante com os times da segunda divisão, ao mesmo tempo em que iniciou batalha judicial contra o Clube dos 13, para retomar o contrato perdido. Para os procuradores do Cade, a exclusividade firmada entre a TVA e a segunda divisão também seria irregular.

O entendimento dos procuradores (encampado por unanimidade pelo conselho) é de que os clubes de futebol formaram cartel, quando negociaram em bloco a venda dos direitos de transmissão dos jogos. Segundo eles, a constituição de ligas ou associações entre clubes adversários, com o propósito comercial de vender os direitos por melhor preço, fere o direito econômico e as normas de concorrência.

Do mesmo modo, dizem os procuradores, as empresas Globosat, TV Globo e Bandeirantes teriam violado o princípio constitucional que diz que os meios de comunicação não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

Esse é o segundo processo existente no Cade sobre exclusividade de transmissão de eventos esportivos. Em maio deste ano, a Associação Neo TV, que representa 46 empresas de televisão por assinatura, entrou com processo na SDE (Secretaria do Direito Econômico, do Ministério da Justiça) contra o suposto abuso de poder econômico por parte da Globosat.

Segundo a Neo TV, a Globosat nega-se a fornecer o canal SporTV, que tem exclusividade de transmissão dos principais eventos esportivos do país, às empresas de TV por assinatura que não fazem parte do sistema Net. Com isso, afirmam não terem condição de competir em igualdade de condições com as afiliadas Net.

A direção da Globosat diz que está impedida de fornecer o canal às associadas da Neo TV, pois tem contrato de exclusividade em andamento com a Net Brasil (outra empresa das Organizações Globo), que faz a distribuição dos canais às franqueadas Net."

"?Querem revogar a lei de mercado?, diz Clube dos 13", copyright Folha de S. Paulo, 14/10/01

"O gerente de Comunicação do Clube dos 13, Eduardo Negrão, disse que todos os clubes de futebol serão prejudicados se o Cade concluir pela ilegalidade da exclusividade de transmissão. ?Querem revogar a lei de mercado, o que é sintomático, na semana em que morreu Roberto Campos, maior defensor no país do liberalismo econômico?, afirmou o porta-voz.

O Cade decidiu investigar os contratos de direito de transmissão dos campeonatos de futebol em TV. A investigação deverá abranger as Organizações Globo, a TV Bandeirantes e a TVA. Da parte dos times, serão investigados o Clube dos 13 e o Clube dos 11.

Segundo Negrão, qualquer emissora pode disputar os contratos e assina a que oferecer maior preço. ?Não vejo ilegalidade nisso?, acrescentou.

Segundo o gerente, a Globo tem contrato de exclusividade com o Clube dos 13 até 2005 e paga anualmente o equivalente a US$ 78 milhões por isso. O dinheiro, diz ele, equivale a 60% do faturamento total dos clubes vinculados à entidade.

A verba é distribuída de acordo com o porte dos clubes. Vasco, Flamengo, São Paulo, Corinthians e Palmeiras recebem o equivalente a US$ 4,5 milhões por ano. Na segunda faixa estão sete times, que recebem cota anual de US$ 2,5 milhões. O Bahia recebe US$ 2,1 milhões. Os demais clubes estão em mais duas faixas: de US$ 2 milhões e de US$ 1 milhão, respectivamente.

As Organizações Globo detêm hoje direitos de transmissão de mais de 20 torneios e dos amistosos da seleção brasileira. A maioria, desde o ano passado, é exclusiva da Globo.

O advogado da CBF, Luís Roberto Barroso, diz que os direitos de transmissão tornaram-se a principal fonte de renda dos clubes por causa da exclusividade.

Segundo ele, se a decisão final do Cade for contra a exclusividade, haverá uma mudança completa de comportamento no mercado. ?A decisão criaria uma jurisprudência, que teria de ser obedecida?, afirmou.

A advogada Ana Paula de Barcellos, que também assessora a CBF, diz que as empresas acusadas podem ser punidas também com multa de 1% a 30% do faturamento obtido no último exercício fiscal.

Emissoras

Procuradas pela Folha, nenhuma das emissoras que estão sendo investigadas pelo Cade se pronunciou formalmente sobre o assunto. A Globo, por meio de sua assessoria, afirmou que ainda não foi notificada sobre a decisão do Cade de instaurar processo administrativo para investigar os contratos de transmissão de futebol.

Executivos da emissora, no entanto, refutam a acusação de que a Globo monopoliza os direitos de futebol. Afirmam que alguns campeonatos não são exclusivos (como a Libertadores, que também é da Traffic/ Band) e que a emissora sempre negocia com as concorrentes a cessão dos direitos. Neste ano, ela dividiu o Campeonato Paulista e a Copa do Brasil com a Rede TV!. Iria compartilhar também o Brasileiro, mas rescindiu o contrato com a Rede TV! por causa de atrasos no pagamento das parcelas.

A Globo negocia com a Record a cessão da Copa de 2002. Mas a iniciativa seria mais uma forma de compensar o investimento na compra dos direitos do que de ?democratizar? as transmissões.

Bandeirantes e TVA afirmaram, informalmente, que são vítimas do monopólio da Globo. Disseram que são alvo da investigação do Cade porque, em 1997 (quando o órgão começou a estudar o caso), tinham contratos de transmissão. A Band dividia campeonatos com a Globo e a TVA disputava guerra jurídica com a Globosat pelos direitos do Brasileiro. A Globosat não se manifestou."

"Europeus também questionam exclusividade em transmissões", copyright Folha de S. Paulo, 14/10/01

"Os contratos de exclusividade de direito de transmissão de eventos esportivos estão sendo questionados também na Europa. Dois casos, envolvendo campeonatos de futebol, estão sendo analisados pela Comissão Européia, em Bruxelas.

Na Itália, foi proibida a transmissão dos campeonatos principais apenas por ?pay-per-view?. Segundo o chefe da Divisão de Mídia do Departamento Antitruste da Comissão Européia, Herbert Ungerer, o primeiro processo foi aberto contra a UEFA (União Européia de Futebol), por ter vendido os direitos de transmissão dos campeonatos, por período muito longo, a apenas uma emissora por país.

A Comissão Européia, segundo Ungerer, não concorda com essa prática e abriu procedimento de investigação baseado na lei antitruste. A comissão já expressou publicamente sua preocupação com o fato de os direitos serem negociados pelas ligas.

O segundo caso em análise na comissão aconteceu na Espanha. Foi aberto um procedimento, também baseado na lei antitruste, contra a Telefónica e a Sogecable, que se associaram para ter exclusividade de transmissão dos jogos da liga espanhola para o Canal Plus (TV paga por satélite).

A comissão concluiu a primeira parte do processo no final do ano passado, quando mandou que as demais TVs por assinatura tivessem acesso aos campeonatos. Outros aspectos do caso continuam em análise.

Segundo Ungerer, as emissoras de outros países europeus queriam transmitir o campeonato espanhol e não podiam, o que levou a Comissão Européia a abrir o processo contra Telefónica e a Sogecable."

    
    
                     
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