Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Disparates e dissonâncias cognitivas

ORIENTE MÉDIO

Francisco Moreno de Carvalho (*)

Em sua resposta ao artigo de Luis Millman sobre a revista Caros Amigos e suas posições sobre o Oriente Médio [remissões abaixo], o jornalista José Arbex Jr. parece demonstrar completa incapacidade de entender por que suas posições são tachadas de anti-semitas. Considera “um disparate” dizer que a revista Caros Amigos vem repetidamente veiculando idéias deste matiz.

Como patologia social, como todas as formas de preconceito e discriminação, certos portadores do anti-semitismo, ou sob sua nefasta influência, desenvolvem uma abulia afetiva no que diz respeito às suas posições e atos. Tal fato já foi apontado no caso Adolf Eichmann, quando ele realmente não entedia o que queriam dele. Afinal, namorara uma judia antes da guerra e conhecia, em hebraico, os primeiros versículos do Gênesis.

José Arbex Jr argumenta que a alegada “bomba étnica” não foi devidamente desmentida e reclama da falta de precisão de Luis Millman ao contestá-la. Sim, é verdade, a contestação é frágil. Assim como até hoje ninguém me convence que não há um monstro no Loch Ness, na Escócia, nem que o Abominável Homem das Neves é uma pura invenção. Ah, sem contar o Papai Noel, que tenho certeza existir lá pelos lados da Lapônia (vi, inclusive, fotos dele na internet, ao menos que isto também seja parte de um “complô sionista”).

Em política há determinados “fatos”, “eventos”, que tratar de refutá-los é em si um ato de submissão aos caluniadores que o inventaram. Será que alguém vai se dar ao trabalho de desmentir que Trotsky era realmente aliado de Hitler e que ambos tramaram o ataque à União Soviética? Claro, Trotsky já estava morto em 1941 mas, quem se importa, não é mesmo?

Quem se importa que não há declaração de nenhum deputado israelense a respeito da tal “bomba étnica”? Ou que a própria idéia da mesma ? para além da questão moral ? seria um atestado de burrice, já que, sendo a maior parte da população israelense de origem meso-oriental, qualquer eventual bomba que visasse exterminar palestinos, por alguma peculiaridade genética, mataria 4 dos 6 milhões de israelenses?

Mas nada disso é substancial ou importante. O que conta é que posta a mentira compete não ao mentiroso, mas sim à vítima, o ônus da prova. Para quem acredita que Israel é um “estado nazista”, qualquer argumento racional é pura perda de tempo.

Como corolário de seu viés anti-semita na análise da questão do Oriente Médio, José Arbex Jr. declara sua identificação com uma lista de judeus importantes. Que ele prefira judeus já falecidos, é compreensível. Mas na sua lista entrou Franz Kafka e Albert Einstein, dois ardorosos defensores do sionismo. Mesmo Hanna Arendt militou no movimento Hashomer Hatsair, sionista de esquerda, em sua juventude. Sendo assim, já fica difícil saber se as opiniões de José Arbex Jr. sobre Israel, Palestina e Oriente Médio, e também as expressadas na revista Caros Amigos (será que nela escreve só o George Bourdokan ou este trouxe consigo seu antigo colega do jornal Jerusalém, conhecido delator durante a ditadura militar?), são fruto do anti-semitismo ou da falta de informação.

Certa vez Isaac Babel definiu o anti-semitismo como o “socialismo dos tolos”. A revista Caros Amigos não costuma oferecer nenhuma análise séria e consistente sobre temas ligados ao socialismo, enredada em sua teia de jornalismo marrom com pretensões a vermelho. Parece que neste caso estamos com falta de socialismo e somos só brindados com a tolice.

(*) Médico e historiador