Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Elio Gaspari / Ciro Gomes

ELEIÇÕES 2002

"ENTREVISTA" , copyright Folha de São Paulo, 2/09/01

"Ciro Gomes (43 anos, candidato a presidente da República pelo PPS)

Há dois anos, o senhor propôs uma rediscussão negociada para a dívida pública brasileira e foi tratado como um excêntrico. Como o senhor se sente agora, quando o FMI e a banca internacional estão oferecendo à Argentina novos prazos para o pagamento de sua dívida externa?

Se tivessem me chamado só de excêntrico, estaria tudo bem. Fui chamado de caloteiro, maluco, despreparado e novo Collor. Os banqueiros internacionais estão renegociando a dívida argentina porque não tem a selvageria da banca nacional. Quando Fernando Henrique Cardoso tomou posse, a dívida interna equivalia a 28% do PIB. Não se esqueça de que naquela época a Vale do Rio Doce, o sistema das teles e a rede de distribuição de energia valiam 80% da dívida. Pois vendemos o patrimônio, e a dívida equivale hoje a 52,5% do PIB. Os banqueiros sabem que essa situação é explosiva. Outro dia estive com um deles, dos maiores. Falei-lhe da necessidade dessa discussão. Ele respondeu que se trata de coisa inaceitável. Eu lhe perguntei o que teremos pela frente, e ele respondeu: ?O caos?. Perguntei-lhe então se não seria melhor conversar antes, como a banca internacional está conversando com a Argentina. Ele disse que é melhor negociar depois que houver o caos.

O que se poderia fazer para abrir essa discussão?

Abri-la. O único jornal que publicou minha proposta com fidelidade foi o ?The New York Times?. No Brasil, nenhum. Assistimos a uma interdição do debate. Quero lhe confessar que hoje em dia tenho medo de falar para a grande imprensa paulista. É medo mesmo. Como sei que não sou um sujeito medroso, acho que a gente deveria se perguntar o que está acontecendo com a imprensa quando um candidato a presidente fica com medo dos jornais. Eu digo que um acusado tem direito de defesa e publicam que defendo o encobrimento de irregularidades. Condeno a diluição de uma investigação e publicam que tento barrar a apuração dos fatos. Depois desmentem, quando desmentem. Tomemos outro exemplo, o das pesquisas. A cada 25 dias, a Sensus publica uma pesquisa nacional. Quem paga é a CNT, que é presidida por um suplente de senador do PFL mineiro. O Ibope publica outra pesquisa, paga pela CNI, que é presidida por outro deputado do PFL. Cada pesquisa dessas custa cerca de R$ 150 mil. Nelas, o governador Garotinho aparece com 14% e depois despenca para 9%, enquanto Roseana Sarney sai do Maranhão e aparece com 14%. É tudo fantasia.

O que o senhor propõe para mudar essa situação?

Proponho que se reflita em torno do seguinte:

A imprensa acha que está ajudando a democracia na maneira como cobre a divergência política? O que ela poderia fazer para reduzir o espaço das fofocas, aumentando o espaço dado à discussão dos temas, como segurança, saúde e educação?

As rádios e televisões acham que nada há além da opinião do governo e do entrevistado que eles vão achar na rua? Será que não existe uma maneira mais civilizada de apresentar o debate político?

No caso das pesquisas, se cada patrocinador dissesse quanto pagou e explicasse de onde saiu esse dinheiro, daríamos um bom passo.

Finalmente, proponho que se debata. Todo mundo com todo mundo. De minha parte, estou pronto para discutir temas da vida do povo com qualquer candidato ou com qualquer ministro do governo. É só marcar hora e lugar."

    
    
                     

Mande-nos seu comentário