Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Elvira Lobato

LULA PRESIDENTE / ELEIÇÕES 2002

“Senado vota na terça concessão de rádio a Gugu”, copyright Folha de S. Paulo, 26/10/02

“A Comissão de Educação do Senado incluiu na pauta de votação da próxima terça-feira o processo para concessão de uma rádio para a empresa Pantanal Som e Imagem, do apresentador Gugu Liberato. A pauta foi definida anteontem, três dias depois de o ministro das Comunicações, Juarez Quadros do Nascimento, ter pedido a anulação da concessão de TV obtida pela empresa.

O processo para a concessão da rádio está com parecer favorável do relator, senador Jonas Pinheiro (PFL-MT). O parecer, segundo a assessoria do senador, foi redigido antes de virem à tona as informações sobre a venda ilegal da empresa para o apresentador.

O vice-presidente da comissão, senador Moreira Mendes (PFL-RO), disse que vai propor a retirada do projeto da pauta. ?Não há condição para a aprovação.?

Pinheiro não comentou o assunto, porque, segundo sua assessoria, estava internado ontem para exames médicos em São Paulo.

Juarez Quadros iniciou o processo para anulação da concessão de TV da Pantanal Som e Imagem na segunda. No domingo, reportagem da Folha mostrou que a empresa foi comprada por Gugu.

A anulação do contrato de concessão foi recomendada pela consultoria jurídica do ministério, que considerou ilegal a transferência do controle da empresa para o apresentador.

As duas concessões -para o canal de TV em Cuiabá e para a rádio em Cáceres- foram colocadas em licitação pública em 1997. A Pantanal Som e Imagem se habilitou para as duas concorrências tendo como sócios Mauro Uchaki e Irinéia Moraes da Silva.

A Pantanal venceu as licitações no ano passado. Em dezembro de 2001, Gugu Liberato comprou 98% das cotas da empresa em nome dele e 2% em nome de sua irmã, Aparecida Liberato Caetano, por meio de contrato particular.

O negócio foi formalizado em junho na Junta Comercial de Mato Grosso, quando os dois processos tramitavam no Congresso. Segundo a consultoria jurídica do Ministério das Comunicações, a venda da empresa constituiu fraude à licitação.

A Folha procurou ouvir Gugu Liberato. A assessoria informou que ele não iria se manifestar sobre o assunto.”

“O novo, o povo, os neobobos”, copyright Folha de S. Paulo, 26/10/02

“Foram muitas as frases risíveis pronunciadas por FHC ao longo dos últimos oito anos. Uma das mais recentes foi pronunciada anteontem, a respeito dos possíveis riscos da transição política.

?Como o brasileiro é um povo novo, não vai ficar com medo do que é novo?, disse o presidente. Talvez julgando que a frase tinha um excessivo sabor lulista, Fernando Henrique acrescentou logo em seguida, e com mais inspiração: ?Nós iremos vencer, vença quem vencer?.

Tudo bem. Não só a democracia, como também Fernando Henrique vence ao zelar por uma boa passagem do cargo. Com certa boa vontade, posso entender essa frase. Mas a outra, a anterior, acho bem menos clara: ?Como o brasileiro é um povo novo, não tem medo do que é novo?. Como assim?

Em tese, FHC estaria dizendo que, sendo a população jovem em sua maioria, não colam muito as advertências em torno de um crescimento da inflação, de uma desorganização financeira ou de tumulto político, que poderiam acontecer no governo Lula. Mas a volta da inflação (Sarney), a desorganização financeira (Rússia, Argentina, Brasil do plano Collor) ou o tumulto político (Jango, golpe militar) são justamente coisas passadas, não ?novas?.

Pegando a frase pela outra ponta. A eleição de Lula é um fato historicamente novo para o país. Nunca houve um presidente brasileiro saído do movimento sindical. Haveria motivo para ter medo disso? Não, diz Fernando Henrique. Talvez um povo velho tivesse medo. Mas ?um povo novo não tem medo do que é novo?.

Só que o raciocínio também fica esquisito desse ponto de vista. Se o povo, que é novo, não tem medo dessa novidade, por que esperou tanto tempo (cinco séculos, cem anos, ou pelo menos quatro eleições) antes de experimentá-la?

Provavelmente a idéia de que o povo brasileiro é novo não tem tanto a ver com a pouca idade biológica da maioria da população; talvez tenha um pouco mais a ver com a idade ?histórica?, no sentido de que é relativamente recente a instauração de uma democracia plena e representativa no país.

Desconfio que no fundo da frase há um outro pensamento. Quando FHC diz que o ?povo é novo?, talvez ele esteja tomando contato, só agora, com aquilo que durante os últimos oito anos teimou em ignorar. Antidemagógico por temperamento, convicção e asco, Fernando Henrique voltou seu governo muito mais para a obtenção de prestígio internacional do que para a exteriorização de grande solidariedade para com as classes populares. Ainda no primeiro mandato, FHC dava alegremente como imutável a existência de uns 40 milhões de ?excluídos?, com os quais não haveria nada a fazer, mesmo na hipótese (que não se confirmou) de grande crescimento econômico.

Não é à toa que José Simão sempre brincou com o lado ?Maria Antonieta? do PSDB. Se não há pão, que comam brioches. Na frase de Fernando Henrique, isso de alguma forma se combina com a famosa brincadeira de Brecht durante o stalinismo. Brecht dizia que se não é possível trocar o governo, que ao menos se troque de povo.

O governo, aqui, vai sendo trocado. Começa um governo novo. Na mente cardosiana, talvez isso seja inadmissível. Como assim, um governo novo? Pior ainda, um governo daqueles que eu chamei de neobobos… Ah, é que o povo também é novo. Trocaram de povo: só pode ser isso. O povo que eu conheço não desaprova, que eu saiba, a quantidade de coisas que deixei de fazer por ele.”

“Vantagem de Lula esvazia único debate no 2? turno”, copyright Folha de S. Paulo, 25/10/02

“Com a pesquisas apontando ampla vantagem de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o único debate do segundo turno, hoje, às 21h40, na Globo, perdeu parte da importância política atribuída ao duelo após a votação de 6 de outubro.

Apesar disso, os candidatos se prepararam ontem para o confronto, que terá formato inédito: os dois ficarão de pé, em uma arena, cercado por 150 pessoas, e não farão pergunta um ao outro. As questões serão elaboradas por eleitores indecisos, selecionados pelo Ibope para participar do programa.

José Serra (PSDB), além de gravar o último programa eleitoral, passou o dia ensaiando respostas para o debate e até o comportamento diante das câmeras.

?Tenho boa expectativa para o debate. É pena que tenha havido um só. Seria muito melhor, não para mim e para o Lula, mas para os eleitores ter tido mais?, afirmou o candidato ontem.

Serra gostaria de fazer perguntas diretamente a Lula. Quando concordou com a regra da Globo, o tucano acreditava que debateria com o petista em outras emissoras, como chegou a ser sinalizado pelo PT. Por isso, a propaganda do PSDB disse que Lula só havia aceitado o duelo da Globo porque não haveria confronto direto.

O petista, com 32 pontos de vantagem, segundo o último Datafolha, se recusou a participar de debates em outras emissoras.

Ontem, pela primeira vez nesta campanha, não utilizou toda a véspera para se preparar. Pela manhã e no início da tarde, gravou o último programa eleitoral. Às 17h, reuniu-se com o marqueteiro Duda Mendonça, em SP. Segue hoje ao Rio e, no debate, pretende manter uma atitude vitoriosa -avalia que o programa terá pouca influência nas urnas.

Performance

Nesse contexto, a maior expectativa do telespectador para a noite de hoje talvez se desloque para a estréia do novo formato -já usado nas campanhas dos EUA.

Para o cientista político Fernando Abrucio, professor da PUC-SP e da Fundação Getúlio Vargas, esse formato norte-americano de debate valoriza a performance dos candidatos diante do cidadão comum. ?No último debate presidencial dos EUA, a imprensa norte-americana avaliou que Al Gore foi muito técnico e ficou distante dos eleitores. Já Bush soube se aproximar do público e, por isso, teve um desempenho melhor.?

Segundo Abrucio, o esquema é saudável para o processo democrático. ?É importante avaliar a reação do candidato ao cidadão. Nem todos vão bem. Lembra-se do Ciro [Gomes] chamando o eleitor de burro no rádio??

Abrucio acredita que não seja um esquema ideal, já que não há questionamento especializado, nem confronto direto entre os adversários. Isso, para ele, evita que os políticos sejam ?questionados em seus pontos fracos?. ?Um debate ideal seria uma uma mistura de perguntas de jornalistas, entre os candidatos, e dos cidadãos.?

O formato, no entanto, tem a ?vantagem de dar voz ao cidadão comum pela primeira vez?, avalia.

Na opinião de Abrucio, a mudança do estilo do programa deverá atrair o telespectador, apesar de a disputa não se mostrar acirrada. No debate do primeiro turno, na quinta-feira antes da votação, a Globo registrou 31 pontos de média. Às quintas, no horário, costuma dar 26 no Ibope (cada ponto equivale a cerca de 47,5 mil domicílios na Grande SP).

?Reality show?

Como faz nos preparativos de ?reality shows?, a Globo mantém isolados desde ontem, em um hotel do Rio, os eleitores que estarão na platéia. Ontem, eles tiveram o único contato com a emissora antes do programa. À tarde, num salão do hotel, reuniram-se com Ali Kamel, diretor de jornalismo, para conhecer as regras e formular as perguntas. Numa parede, foram colocados cartazes com 20 temas. Sobre esses assuntos, foram elaboradas as perguntas, as últimas que serão respondidas por Lula e Serra como candidatos à Presidência. Em 2002, ao menos. (Colaboraram KENNEDY ALENCAR e RAYMUNDO COSTA, em São Paulo)”

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“Após polêmica de 1989, Globo não fará edição”, copyright Folha de S. Paulo, 25/10/02

“Em razão da polêmica edição do debate de 1989 exibida no ?Jornal Nacional? na véspera da eleição -que deu mais tempo a Collor do que a Lula- a Globo decidiu este ano não editar cenas do programa nos telejornais.

O último debate do segundo turno daquele ano foi realizado por um ?pool? das maiores redes de TV, em 15 de dezembro. Com isso, teve a histórica marca de 79% da audiência no horário.

A disputa estava acirrada -o Datafolha do domingo da votação registrou 47% dos votos válidos para Collor e 44% para Lula- e, por isso, a repercussão do debate era considerada vital pelas campanhas.”