Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Entra para dentro, Coca-Cola

DESCENDO PRA BAIXO

Marcos Linhares (*)

Estamos realmente a cada dia mais perdidos, ou mais despidos, se me permitem a ousadia. E nossos amigos publicitários têm grande parcela de culpa nessa história, ao apelarem para os modismos sem pesarem as conseqüências. Eles não se lembram que o jovem pobre e carente de oportunidades não consegue discernir as ditas "sacadas" do mercado de criação, mas são atingidos em cheio.

Explico: fui tomar meu café numa padaria, bem cedinho, quando me deparei com um deplorável cartaz com a frase "morena gelada". Até aí, tudo bem. Contudo, qual não foi minha surpresa quando li o complemento: "(…) sai fora".

"Entram para dentro" do mau exemplo a Coca-cola e seus publicitários, que contribuem para uma juventude pior. Que consagram uma expressão esdrúxula e totalmente redundante. Vamos subir para cima desse morro, que eu morro de vergonha. Também morro de vontade de perguntar, o que aconteceria com uma empresa brasileira se fosse para os States e avacalhasse o idioma deles?

Bem, no mesmo rastro de desrespeito com o público vem a produção do programa Mais você, apresentado por Ana Maria Braga. Na quarta-feira, dia 19 de novembro, a produção levou um grupo de rapazes para fazer evoluções e malabarismos com bandeiras. Até aí, sensacional. Só que na hora de escrever a função de um dos rapazes entrevistados nos deparamos com a incrível profissão de "flagwaver". Isso mesmo. A pobre dona-de-casa deve ter deixado o leite derramar tentando entender. A apresentadora global bem que ainda tentou ajudar, explicando que "flag" significava bandeira… Mas e o tal do "waver"? Deixa para lá, deve ter pensado a pobre doméstica, fã assídua do programa, que desistiu de esquentar a cabeça.

Brasil e orgulho

Só uma dúvida persistiu: por que não escrever em português? Será que nossa língua é tão pobre que não houve como achar correspondente? Será que é "brega" escrever na língua em que fomos criados, ou malcriados, como queiram os do contra…?

A questão é que, com a infeliz ajuda da Coca-cola e dos canais de televisão, estamos imbecilizando o país. Perdendo a identidade, as digitais, a verdade e a vontade de ser algo. Despretensiosamente, vamos assassinando a língua, os conceitos, os limites, e esquecendo o que verdadeiramente é nosso: o respeito. Depois disso, de transgressão em transgressão, chegaremos aos cativeiros, aos seqüestros-relâmpago, aos tiroteios, a gente sendo queimada, a jovens rompendo, retalhando e rindo da justiça. Que justiça…

Tenho medo… Quero "descer para baixo" desse sentimento e poder continuar a sonhar com um país que ainda agite bandeiras e deixe as "flags" e os pleonasmos em algum lugar distante. Quero mais é ajudar a construir um Brasil que ainda diga com orgulho: eu amo meu país.

Quer "love"? Sai fora!

(*) Jornalista, professor e editor-chefe da revista Saúde Agora