Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Esporte, merchandising e diatribes

MÍDIA ESPORTIVA

Clóvis Luz da Silva (*)

Foi chocante a edição de 16/11/03 do programa Terceiro Tempo, na Record, sob o comando de Milton Neves, pelos fatos a seguir.

Quando cheguei em casa o programa já havia iniciado. Estavam presentes participantes oficiais e convidados, entre os quais se destacava Eurico Miranda, reeleito para a presidência do Vasco, e a quem Milton Neves concedia espaço para que se defendesse das acusações feitas por Roberto Dinamite, candidato da oposição vascaína na disputa. Apenas para situar o leitor, dias antes da eleição no Vasco outro jornalista esportivo, Jorge Kajuru, em seu programa esportivo na Band, afirmara que Eurico Miranda, a quem chama de "Elvírus", era o candidato de Milton Neves, opinião compartilhada por outros jornalistas, como Juca Kfouri.

Quando tomou o microfone para se defender Eurico Miranda, no estilo que todos conhecem, afirmou que todas as acusações de que é alvo foram alimentadas por alguns jornalistas que querem ser paladinos da justiça e da retidão, mas que não passam, segundo ele, de hipócritas. Para fundamentar suas afirmações, acusou Jorge Kajuru de ter fugido de Goiânia, onde responde a mais de 30 processos. Não especificou nenhum desses processos, dando-se por satisfeito em sugerir ao espectador que Jorge Kajuru é elemento perigoso à sociedade, um criminoso que deveria estar preso, e não apresentando programas esportivos, coisa de gente de bem e de caráter ilibado.

Quando se referiu a Juca Kfouri, Eurico foi mais incisivo, acusando-o de receber dinheiro por meio de empresa de que é proprietário, pois assim, afirmou Eurico, pagaria menos impostos. Além disso, acusou os dois jornalistas de se esconderem atrás de um nome, dizendo os nomes completos de Kajuru e Kfouri. Isso é crime?

De graça?

Durante os longos minutos em que Eurico atacava seus adversários, Milton Neves fez caras e bocas, como se desaprovando a atitude do dirigente vascaíno. Quem analisou com alguma argúcia sua fisionomia não estará longe da verdade, se concluir que a aparente indignação de Milton Neves foi puro jogo de cena para que o telespectador não concluísse estar ele, intimamente, vibrando com aquela verborragia ensandecida de Eurico contra os dois jornalistas.

Por quê? Simplesmente porque Milton Neves está movendo processos contra Jorge Kajuru e Juca Kfouri, em decorrência das ácidas críticas que tem recebido dos dois pela opção em favor do mais puro merchandising em seu programa. Em recente edição do OI, um leitor disse ter ouvido durante 10 minutos Milton Neves fazer propaganda dos produtos que patrocinam seu programa, e anunciar, para depois dos comerciais, gols do futebol brasileiro!

O aspecto bizarro do programa se tornou bem evidente enquanto Milton Neves, timidamente, anunciava que os jornalistas citados por Eurico Miranda tinham até meia-noite para se defender, assim querendo.

Alguém acha que, depois de tanta baixaria saída da boca de Eurico, os dois jornalistas telefonariam, mandariam e-mail ou sairiam de onde estavam para ir aos estúdios da Record dar suas explicações ao grande público? A impressão que ficou do episódio é que Milton Neves, um jornalista esportivo admirado por muitos, desta vez pisou feio na bola, compactuando com Eurico Miranda, dirigente esportivo contra quem pesam suspeitas, ou certezas, devastadoras, usando-o como instrumento para execrar publicamente os dois jornalistas, e tudo por causa de dinheiro?

Afinal, ele não faz merchadising de graça, não é mesmo?

(*) Estudante de Letras, Ananindeua, PA