Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Fabio Diamante


INFORMAÇÃO vs. CORRUPÇÃO


"País limita acesso a dados públicos, diz professor", copyright O Estado de S. Paulo, 14/7/02

"?Um governo do povo, sem informação para o povo ou sem os meios para que ele a obtenha, não é nada mais do que o prólogo de uma farsa ou de uma tragédia ou talvez de ambas.? A frase é de James Madison, quarto presidente dos EUA e um dos principais autores da Constituição americana, e retrata o atraso do Brasil no quesito transparência em relação ao acesso à informação pública. Um instrumento fundamental para o aperfeiçoamento das democracias e suas sociedades.

A comparação entre a legislação brasileira sobre o tema com a de outros países foi feita pelo diretor da cátedra de jornalismo na Universidade do Texas, Rosental Calmon Alves, em seminário realizado no dia 8 pela Associação Nacional dos Jornais (ANJ). Ele defendeu a necessidade de uma lei de acesso à informação pública, ?um seguro contra a corrupção?, legislação que está se disseminando pelo mundo. Para ele, os EUA possuem a melhor norma sobre o tema. ?Não existe no Brasil sequer o conceito de informação pública. Não existe uma cultura de governo aberto?, diz o professor.

Enquanto no Brasil a garantia de acesso a informações públicas está expressa ?de forma genérica?, como define o professor, na soma de um artigo da Constituição Federal, de uma lei federal e de um decreto presidencial, os EUA possuem a FOIA (Freedom of Information Act), que pode ser traduzida como Lei de Liberdade de Informação. A campanha americana pela criação da FOIA teve início em 1954, o que acabou ocorrendo em 1966. Mas a burocracia de Washington não deixava a lei funcionar.

Modelo – Os escândalos da década de 70 – os Papéis do Pentágono, documentos secretos sobre o envolvimento dos EUA na Guerra do Vietnã, e o Watergate, esquema de espionagem contra o Partido Democrata que levou à renúncia do então presidente, o republicano Richard Nixon – motivaram a ampliação da FOIA. Entre os destaques, estão a determinação de que os órgãos federais devem publicar o máximo possível de informações sobre suas atividades.

Enquanto isso, a prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT), vetou no mês passado parte de uma lei aprovada pela Câmara Municipal, que obrigava o Executivo a disponibilizar na internet a íntegra de todos os contratos assinados pelo Município. O argumento foi que esse tipo de lei tinha de ser de iniciativa do Executivo e não do Legislativo. Ainda segundo a Prefeitura, os contratos são divulgados e estão à disposição. ?Se você ganha dinheiro público, você está a serviço do público. Você está ali para servir ao público?, define o professor.

A FOIA prevê ainda que qualquer pessoa ou organização, mesmo estrangeira, pode requisitar informações ao governo. Da mesma forma, não é necessário explicar o motivo. No caso de recusa, a decisão caberá a um juiz, que poderá avaliar se o documento é de fato sigiloso – casos que envolvam segurança pública, por exemplo. Cada repartição é obrigada a informar anualmente ao Congresso sobre todos os documentos que se negou a liberar e seus motivos. Funcionários que escondem informações podem ser punidos pelos tribunais.

A evolução da FOIA é a E-FOIA, que prevê a entrega de documentação em disquetes ou CD-ROMs. Os órgãos públicos foram obrigados a criar ?salas virtuais de leitura? de documentos oficiais na internet. Um detalhe: jornalistas são apenas 5% entre as categorias que usam a FOIA. Quarenta por cento são empresas, 25%, advogados e 16% são pessoas que não se identificam. ?Mais do que os jornais, a FOIA beneficiou o cidadão comum, a sociedade.?"

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"Para especialista, Brasil vive momento propício para o debate", copyright O Estado de S. Paulo, 14/7/02

"Para o professor Rosental Calmon Alves, da Universidade do Texas, nos EUA, o Brasil tem muito o que aprender com o México sobre o tema acesso a informações públicas. Os mexicanos aprovaram sua lei no mês passado. Entre seus princípios, está o de que ?uma lei de acesso protege um direito humano universal?.

No México, o movimento teve início numa mobilização de jornalistas (77 jornais), advogados e acadêmicos. Daí, nasceu o Grupo Oaxaca, que elaborou um projeto de lei. Em 2000, a pressão da sociedade levou o tema para a pauta dos candidatos à eleição presidencial.

O governo de Vicente Fox convocou discussões populares e elaborou um projeto de lei, mais restritivo que o do Oaxaca. O Congresso aprovou em tempo recorde o projeto do Oaxaca. Para o professor, a situação do Brasil tem algumas semelhanças. A iniciativa de discutir o tema também foi da imprensa, no seminário da Associação Nacional de Jornais (ANJ). E o ano eleitoral favorece o debate. ?É um momento propício.?

Apesar do acesso à informação pública estar expresso em três leis brasileiras, entre elas a Constituição, o professor defende a criação de uma norma específica. ?A Constituição do Brasil diz que todo cidadão tem direito a dignidade. E daí??, pergunra. ?É como o exemplo do Código do Consumidor, que já tinha seus direitos, mas o código detalhou e definiu tudo.?

Inglaterra – Os ingleses também discutem a criação de uma lei específica desde 1911. O professor explica que por lá, embora existam algumas normas sobre o tema, a decisão final ficou para 2005.

Buenos Aires possui sua própria lei para acesso a questões públicas. Uma lei federal estava em discussão, mas a crise na Argentina paralisou o debate no Congresso. Alves aponta o nascimento desse conceito em 1766, na Suécia. A possibilidade de acesso a informações foi adotada pela constituição sueca em 1949. A Finlândia, em 1951, foi a segunda a adotar esse princípio de transparência."

 


ESPÍRITO SANTO SEM LEI


"Repórter da Globo ameaçado de morte", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 11/7/02

"Divulgado oficialmente na Câmara dos Deputados, em Brasília, nesta quinta-feira (11/07), o relatório ?A Situação Atual da Defesa dos Direitos Humanos no Estado do Espírito Santo?, produzido pela ONG Jutiça Global, revela que um repórter da TV Globo está sob ameaça de morte.

A revelação aparece em uma carta assinada por Jeremias Muniz, enviada ao deputado federal João Miguel Feu Rosa (PSDB), autor de denúncias sobre violação dos direitos humanos no Espírito Santo. O remetente afirma que ouviu conversas entre um homem identificado como ?coronel? Ferreira e outro cujo nome desconhece. Os dois planejavam a morte de Feu Rosa e do repórter da Globo, que produziu matérias para o Fantástico revelando um esquema de corrupção entre uma empresa capixaba e a prefeitura de Belford Roxo, no Rio de Janeiro.

Segundo Sandra Carvalho, diretora de Comunicação da ONG Justiça Global, o relatório também foi divulgado no Espírito Santo, em ato público realizado na tarde desta quinta-feira. ?As denúncias do repórter sobre a empresa Marval falava de superfaturamento de equipamentos médico e escolar?, disse.

De acordo com a carta, a morte do repórter aconteceria no Rio de Janeiro, em um assalto simulado: ?… o coronel Ferreira falou que o repórter da Globo (…) tinha deixado de comer um milhão para não berrar e agora ia morrer no assalto para fazer denúncia no inferno?. Em outro trecho, Muniz afirma que o plano é da Marval Comércio e Serviços: ?eu ouvi que o pessoal da Marval ia cobrir tudo, que eles têm dinheiro e que jornal não pára bala?.

Procurada por Comunique-se, a emissora não quis falar sobre o assunto, apenas disse que o relatório foi encaminhado à Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio. O nome do repórter não foi identificado nesta matéria a pedido da Rede Globo, sob o argumento de que também não se encontra no relatório. A emissora alega que ocultar a identidade do jornalista é uma medida de segurança para o profissional.

Abaixo, trecho do relatório que fala da ameaça:

?João Miguel Feu Rosa é deputado federal e membro do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Desde que foi eleito em 1999, ele tem denunciado violações de direitos humanos. Nos últimos meses, João Miguel Rosa e dois dos seus parentes, que são juizes no Espírito Santo, vêm recebendo reiteradas ameaças por causa do seu trabalho na defesa de direitos humanos. O escritório do deputado Rosa em Brasília tem recebido varias ameaças de morte contra ele e contra os seus parentes através de telefonemas anônimos, cujos números rastreados apontam para cabines telefônicas públicas (?orelhões?) no Espírito Santo. Ademais, seu escritório também recebeu uma carta anônima que não somente faz referência às pessoas suspeitas de crime organizado no Espírito Santo, mas também demonstra conhecimento profundo dos movimentos do Rosa.

O Centro de Justiça Global teve acesso a uma carta assinada por Jeremias Muniz dirigida à Família Feu Rosa, que vale transcrever na íntegra:

?Família Feu Rosa

Conheço voces a muito tempo. Na semana passada eu estava no posto e ouvi a conversa do coronel ferreira com um homem que eu não sei quem e mas que ele chamava de Diu e era conversa de morte. Eles ficaram muito tempo acertando a morte do delegado Baiense de um reporter la do Rio e do Feu Rosa e eu ouvi quando o coronel Ferreira falou que Feu rosa ia se fuder porque criou problema pro pessoal da marval e fudeu ele no tribunal e eles sabia do negocio do Denadai e que o pessoal da marvalia garantir o serviço porque era gente poderosa e ele falou que o delegado baiaense deu sorte de não virar presunto mês passado porque um filha da puta caguetou mas que agora era coisa seria. eles sempre vem la no posto para acertar morte e já apareceu ate deputado la e eles tem muito dinheiro e eu ouvi o Diu dizendo que o serviço vai ser feito la pelo pessoal do Rio e o coronel Ferreira falou que o reporter da globo era viado e burro que tinha deixado de comer um milhão para não berrar e agora ia morrer no assalto pra fazer denuncia no inferno. Eu ouvi o Diu falar que no mato na saida do tribunal da pra raja qualquer filho da puta. Eu fiquei com medo porque muita morte foi acertada la no posto e quem falou me falarem que foi escondido pra não morrer e eu vou xipar do posto amanhã mas eu quero avisar voces que eu devo muito a familia de voces e voces tem que toma cuidado que tem gente grande e ate deputado cubrindo e eu ouvi que o pessoal da marval ia cubrir tudo que eles tem dinheiro e que jornal não para bala.

Eu não posso falar mais eu tenho que avisar vocês para tomaram cuidado que tem gente poderosa ate deputado nesse pessoal. Quem sabe de toda conversa de morte no posto e o Dionisio que e frentista velho. Ele mora em Barcelona na rua vereador batista no fundo da padaria do souza que o genro dele e dono.

Outro que tem pra cantar e o Zeca que era garsom do bar do posto e foi até na policia e falou la no posto que era do posto que eles mandava NO ESTADO E Zeca fez um serviço pro coronel Ferreira em troca de um gol. Ele mora na rua Ulisses Guimarães em Feu Rosa e ele falava que era peixe do coronel.

Eu vou para Teixeira Segunda mas aviso voces pra pagar o tratamento do meu pai que eu recebi. Jeremias Muniz de Barcelona. (sic)?."