Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Falta democracia. A culpa é nossa?

DEVER DE CASA

Fernando Torres (*)

Intelectuais são chatos. Julgam-se entendidos em qualquer assunto, tendem ao pessimismo e geralmente analisam um único viés do problema. Quando tocam no assunto mídia, a palavra-chave é manipulação. O discurso já se tornou repetitivo e enfadonho, mas convence leitores superficiais e desatentos.

Um dos temas mais discutidos atualmente é a influência dos mass media no processo eleitoral. Dizem que os jornais fragmentam e espetacularizam o fato, noticiando-o da forma que melhor lhe interessar. E mais: omitem o que acham que não deve ser dito, transfigurando a democracia em ditadura mental. De acordo com esses teóricos, a mídia bestializa os receptores, transformando-os numa legião de escravos, prontos a obedecer sem qualquer questionamento.

É bem verdade que os meios de comunicação, em especial a TV, influenciam o comportamento do eleitor diante do voto. Afinal, eles são a maior fonte de informação para a maioria da população. Manipulam? Sim, manipulam. É clássica a história da edição do Jornal Nacional no debate de 1989 ? novamente em pauta quem seria o culpado ?, o qual teria dado margem à vitória de Fernando Collor. Também é famosa a infiel cobertura que a Rede Globo fez do movimento Diretas-Já, disfarçando-o em festa de aniversário. Mas será que a culpa é sempre nossa? É impossível ver aspectos positivos nas coberturas jornalísticas?

Um mundo pior

Restrinjo-me à atual cobertura eleitoral. Nunca, pelo menos no Brasil, houve tanta informação sobre uma corrida presidencial. Praticamente todas as mídias, da impressa à online, colocaram como protagonistas de seus veículos os candidatos Lula, Ciro, Serra e Garotinho. Versões diferentes sobre o mesmo fato estão disponíveis ao eleitor preocupado em usar o direito ao voto. Basta folhear algumas páginas, escolher os melhores canais ou, para os mais modernos, clicar o mouse em busca de notícias.

Ainda falando do eleitor inteligente, é válido observar que ele nunca se contentará com a visão de um veículo apenas. Caso isso ocorra ? sejamos realistas ?, possivelmente estará desinformado. Ao contrário, procurará comparar as informações obtidas e, aí sim, chegar a uma conclusão racional. Também levará em conta a política partidária, bem como a economia vigente no período histórico.

Mas insistem em dizer que a grande imprensa é um perigo à democracia. Esquecem-se de apontar os verdadeiros culpados, os verdadeiros estrategistas da manipulação. O que dizer dos jornais dominados por clãs políticos, como a Gazeta de Alagoas, há décadas no poder dos Collor de Mello? E o que dizer de ACM, que mesmo cassado (?) não perdeu seu posto na adoração baiana? E os Sarney no Maranhão? E as pequenas cidades interioranas, onde duas famílias se revezam no poder há séculos? De quem será que eles recebem apoio?

Ora, é óbvio que o jornalismo muitas vezes abusa de sua liberdade. Mas, pelo ponto de vista político, a função jornalística tem valor democrático, sim. Apesar de a mídia deturpar e alimentar fantasias, o mundo seria pior se não houvesse jornalismo. Simples: as denúncias ficariam restritas a uma pequena parcela da população, centrada no próprio umbigo. Doa a quem doer, o jornalismo é um fator a mais ? de muito peso ? na sustentação da democracia.

(*) Aluna do 3? ano de Jornalismo do Centro Universitário Adventista (Unasp)