Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Faltam métodos para apurar os fatos

DIPLOMA EM XEQUE
(*)

Luís Nassif

A técnica jornalística propriamente dita pode ser obtida em cursos técnicos de prazo relativamente curto. O maior aprendizado é no trabalho mesmo.

É possível até defender o curso superior de jornalismo, desde que em outras bases curriculares. Quando os cursos foram constituídos, no final dos anos 60, houve um movimento corporativo destinado a garantir cadeiras para alguns especialistas. Houve uma divisão do bolo que resultou em um Frankenstein. Cadeiras que poderiam, quanto muito, ser extensão de outros cursos, transformaram-se em matérias de jornalismo. Tomem-se os casos de Antropologia da Comunicação, Filosofia da Comunicação, Sociologia da Comunicação. Supõe-se que, primeiro, se conheça a respectiva ciência para, depois, se aventurar em uma especialização. Essa estrutura curricular maluca tenta enfiar em um ou dois semestre não apenas os conceitos básicos da ciência em questão, como sua "especialização", a comunicação. Resulta disso um conhecimento inútil como formação de jornalismo ou de cultura geral. Estive em um seminário da ECA, quando completou 30 anos de existência, e essa excrescência curricular continuava incólume, porque os interesses envolvidos haviam se estratificado.

O que falta hoje em dia na formação do jornalista são métodos para se apurar os fatos. Todo fato é, por definição, complexo, tem vários ângulos que precisam ser abordados, várias visões que precisam ser apuradas, sem preconceito. No entanto, o padrão jornalístico atual é do mais absoluto maniqueísmo, do jornalista se fixar na primeira versão e rejeitar qualquer indício que a conteste. Essa visão é extremamente reforçada no ambiente acadêmico. Em geral, as faculdades de humanas são as mais maniqueístas e ideológicas ? seja a visão de "esquerda" de uma Filosofia da USP, à visão de "direita" de uma Economia da PUC do Rio de Janeiro. O patrulhamento é uma constante, assim como a condenação moral de quem ouse pensar de forma diferente.

Esse tipo de pensamento tem levado a imprensa a cometer, corriqueiramente, atentado continuado aos direitos individuais, seja do japonês da Escola Base, seja do Paulo Maluf. Não se reconhecem direitos nem de inocentes, menos ainda de suspeitos. Posso falar tranqüilo do Maluf porque, na CPI dos Precatórios, fui o primeiro a investir contra a maioria e mostrar que o golpe tinha sido planejado por ele.

Mas esse procedimento de atropelar direitos individuais, não conferir provas, divulgar suspeitas, fechar os olhos a qualquer evidência contrária à tese defendida é uma forma de violentar a busca objetiva da informação. Por isso mesmo, uma cadeira de processo jurídico seria adequada na formação de um jornalista. Não o conhecimento das instâncias de julgamento, mas da sistemática do processo em si, de ouvir todas as partes, estabelecer o contraditório, exigir que o ônus da prova seja de quem acuse.

A falta desses cuidados acarreta dois problemas sérios. O primeiro, o da simplificação dos fatos e da qualidade da informação. O segundo, do descrédito da Justiça. Quando o caso chega ao Judiciário ? que trabalha com provas ? em geral não se levantam nem provas nem um conjunto forte de evidências. A visão que passa não é a de que o acusado é inocente, mas de que a justiça sempre é venal.

Mas quem vai ensinar os alunos esses princípios básicos de direitos individuais, ou esse método não preconceituoso de buscar os diversos ângulos da verdade? Muito difícil que a Universidade e, especialmente, as escolas de jornalismo passem esses conceitos.

(*) Mensagem postada no grupo de discussão de jornalismo científico em <http://www.grupos.com.br/grupos/j.cientifico>, aqui reproduzida com autorização do autor


    
    
                     

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