Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Fernando Martins

JORNAL DE NOTÍCIAS

"A notícia está sempre no desejo de mudança!", copyright Jornal de Notícias, 14/9/02

"Raúl Castro, advogado, ex-deputado pela APU e com um longo passado de luta pela Democracia, endereçou ao Provedor um protesto pela forma como, em sua opinião, o ?Jornal de Notícias? vem favorecendo a causa dos ?renovadores?, em prejuízo das posições do Comité Central do PCP, no diferendo que opõe aqueles militantes e a estrutura dirigente do Partido Comunista. Diz Raúl Castro:

?Sabe-se que a ligação dos grandes grupos económicos capitalistas à Comunicação Social abriu as portas desta aos ataques ao PCP, por parte dos chamados ?renovadores?, porque o que está em causa é atingir e enfraquecer o PCP.

?Mas, com franqueza, tudo tem limites. E o que se passou com as notícias do JN a propósito das sanções aplicadas ao três chamados ?renovadores?, excede o que é possível imaginar.
?Assim, no dia 20 de Julho último, o JN, em relação ao Comunicado do Secretariado do Comité Central, na p. 13, publica uma ?Síntese dos Argumentos do Secretariado do CC?, em que oito dos oito pontos dessa ?Síntese? são apenas parte deles, dificultando a própria compreensão desses ?Argumentos? sintetizados!

?É como se os textos, artigos ou entrevistas dos chamados ?renovadores? fossem acompanhados das respectivas respostas ou comentários do PCP, logo esta estranha ?Síntese? é acompanhada duma resposta ?Renovação que mexe?, mais extensa do que a ?Síntese?!

?Diga-se, para terminar, que nunca vi no JN nenhuma ?Síntese? de textos dos chamados ?renovadores?, textos estes, aliás, sempre publicados na íntegra, e até com fotografias, para os destacar…

?Dias depois, em 26 do mesmo mês, o JN publica, na p. 12, um artigo ?Contradições explicadas no ?Avante? – Citações actuais dos três sancionados comparadas às que fizeram há dez anos?, em que o JN faz o ?milagre? de ?sintetizar? (outra vez) em menos de um quarto de página ?quase duas páginas de citações dos três sancionados?, mas excluindo das citações dois dos três sancionados, e além da habitual foto, quase metade da notícia respeita a comentários dos sancionados!

?Note-se que, em relação às ?mais de quatro páginas da intervenção de Carlos Carvalhas na Quinta da Atalaia?, publicadas no ?Avante?, o JN, consegue não transcrever sequer uma palavra do que disse Carlos Carvalhas !?

Convidada a pronunciar-se sobre as críticas do causídico e político, a Direcção, por intermédio do subdirector, David Pontes, contesta:

?Não posso deixar de começar por repudiar por completo a primeira afirmação constante da carta do dr. Raúl Castro, de que nos movem na nossa actividade outros interesses para além dos jornalísticos e dos de serviço público. O estafado cliché da Comunicação Social sujeita aos interesses dos ?grandes grupos económicos capitalistas? é uma acusação que a Redacção do JN rejeita por completo, por nada ter de verdadeiro.

?Não me parece também que assista muita razão à queixa do ex-deputado da APU.

?Na primeira notícia, o leitor acusa-nos de termos publicado uma síntese dos argumentos do Comité Central do PCP, aparecendo alguns deles reduzidos. Ora, o que JN fez foi transcrever, para além da notícia da decisão do CC do PCP, o texto da própria decisão, pelo que dificilmente consideramos correcta a acusação de que procurámos dificultar a sua compreensão. Pareceu-nos também de todo o interesse jornalístico acrescentar à matéria uma crónica de um nosso cronista residente com opinião sobre a matéria e um dos visados, ainda que indirectamente, pela resolução do CC do PCP.

?Quanto à notícia de 26, não nos parece que esteja nas nossas atribuições republicar trabalhos dados à estampa em outros orgãos de comunicação social, apesar de não nos abstermos de nos debruçarmos sobre as matérias por eles referidas, quando existe interesse jornalístico, o que era manifestamente o caso.

?Finalmente, para responder à critica mais genérica do leitor de que é dado mais espaço aos ?renovadores? do que às posições oficiais do PCP, é bom de notar que é a atitude deles que rompe com o estabelecido, e como tal é notícia — e não ao contrário. Acresce a isto que enquanto se tem encontrado disponibilidade por parte dos ?renovadores? para transmitirem as suas posições, o mesmo não se pode dizer da parte do PCP, que normalmente se recusa a comentar as posições assumidas por aqueles.?

Também o Conselho de Redacção enjeita toda e qualquer suspeita de parcialidade que quem-quer possa levantar sobre a Redacção do ?Jornal de Notícias?. Afirma, concretamente:
?Os jornalistas do JN sempre se pautaram pela isenção e pelo pluralismo. Além disso, têm como único objectivo o interesse jornalístico. Citações do jornal ?Avante? ou discursos de Carlos Carvalhos são sempre tratados de uma forma jornalística. No caso das sanções aos renovadores, os jornalistas do JN tentaram manter a equidistância, gerindo o espaço do jornal com base nesse mesmo interesse: jornalístico.

?Relativamente à opinião do renovador João Amaral, publicada no JN, o Conselho de Redacção lamenta a confusão feita pelo advogado Raúl Castro. João Amaral é cronista do JN, já o era antes das sanções aplicadas aos três renovadores. Tal como acontece com outros cronistas, é publicada a sua fotografia ao lado dos textos que assina.?

Por sua vez, Ana Paula Correia, editora de ?Política?, considera:

?A ?carta-protesto? que o dr. Raúl Castro entendeu enviar ao Provedor do Leitor do JN é, segundo a avaliação da editoria da secção Política, uma manifestação pública de uma opinião relativamente à forma como está a ser tratado jornalisticamente um determinado tema da vida político-partidária portuguesa. Para nós, todas as opiniões expressas livremente, em particular as que revelam uma apreciação negativa do nosso trabalho, são consideradas um contributo essencial para prosseguirmos a tarefa diária de informar.
Não pretendo, por isso, expressar outro qualquer comentário sobre o assunto.?

Conhecedor das sólidas convicções do dr. Raúl Castro, o Provedor acredita que ao velho combatente não movem outros propósitos que não sejam as tentativas de mudar aquilo que, em sua opinião, está errado. Porém, a paixão com que defende os seus ideais (bem mais próximos das posições do Comité Central do que da abertura e do diálogo preconizados pelo crescente movimento de militantes ?renovadores?), levam-no a socorrer-se da tese de um amplo movimento persecutório do capital contra o Partido. Assim, e resumindo as teses de Raúl Castro, a partir do momento em que os grandes grupos económicos capitalistas se ligaram à Comunicação Social, esta abriu as portas aos ?renovadores?, como instrumentos dos ataques que visam enfraquecer o PCP.

A paixão furta lucidez a Raúl Castro e fá-lo, decerto que impensadamente, enveredar pelo insulto a uma Redacção de que fazem parte também alguns militantes do PCP.

A verdade que os jornalistas em geral e os do JN em particular perseguem não depende das estratégias de um qualquer poder. Nem do poder económico que lhes paga os salários, nem do político que, continuadamente, tenta em vão fazer deles seus instrumentos.

Como se retira das posições da Direcção JN e do Conselho de Redacção, nem os interesses parcelares coincidem sempre com o interesse jornalístico, nem a imparcialidade se mede ao centímetro ou em número de linhas.

A contestação pública dentro de um partido historicamente tão hermético como o PCP é que é notícia, pelo insólito — a contestação e a repressão dos renovadores é apenas um complemento, também ele já histórico, dessa mesma notícia. Trata-se da ?audição das partes com interesses atendíveis na polémica?. Compreende-se, porque lógico, o desnível do destaque.

Fala-se, naturalmente, dos ?media? de informação geral — e não de jornais partidários como o ?Avante?, que, como é público, minimizou as teses dos ?renovadores?, no confronto com as posições dos dirigentes do Partido.

Tem o ?Jornal de Notícias?, entre os seus colunistas, representantes dos mais diversos quadrantes do pensamento. Também renovadores. E se uma qualquer figura da Direcção do PCP enviasse para publicação no JN um texto com as posições pessoais ou dos órgãos dirigentes do Partido, ela teria sido publicada. Não o fizeram. Aliás, era queixa generalizada dos ?media? o silêncio a que se remeteram, como sempre se remetem, os responsáveis comunistas. Porque acham que é em sede do Partido e só lá que deve verificar-se o debate? É um direito que lhes assiste, mas que não pode ser usado como arma de arremesso em acusaç&otildotilde;es de parcialidade."