Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

  Folha de S. Paulo

TV CULTURA EM CRISE
Jotabê Medeiros

“Verba de fundação supera a da Secretaria de Cultura”, copyright O Estado de S. Paulo, 12/05/03

“Vivendo uma grave crise administrativa, a TV Cultura experimenta situação curiosa: tem um orçamento maior do que o da própria Secretaria de Estado da Cultura. Em 2003, são R$ 120.726.527,00 para a Fundação Padre Anchieta e R$ 103.716.991,00 milhões para a Cultura, segundo informações da Secretaria do Planejamento.

Parte do desequilíbrio entre esses números deve ser creditada a uma espécie de ?chicana administrativa? que funciona na cultura estadual. Até hoje, por exemplo, a TV Cultura inclui em sua folha de pagamento os músicos e os maestros da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), organismo vinculado à Secretaria de Estado da Cultura. A Osesp tem cerca de 90 músicos e só os rendimentos mensais de seu maestro titular, John Neschling, beiram os R$ 400 mil (R$ 4,8 milhões em um ano, mais da metade do que a fundação pediu ao governo para investimentos no reaparelhamento técnico das suas emissoras de rádio e TV em 2003).

A direção da fundação demitiu 256 funcionários em fevereiro, buscando reduzir suas despesas com pessoal. Ficou com 1.177 empregados, incluindo-se aí mais de uma centena de músicos. Ou seja: está com a estrutura mais enxuta dos últimos dez anos. Nenhum dos funcionários ?agregados? foi incluído nos cortes, porque essa decisão foge à alçada da direção executiva da emissora – é de competência da secretária de Estado da Cultura, Cláudia Costin, que até nomeou recentemente um gestor para a orquestra, Cláudio Gaiarsa.

Essa situação, que não agrada ao governador Geraldo Alckmin, é objeto de estudos administrativos há anos. Tenta-se transformar a Osesp numa Organização Social (OS), uma figura jurídica criada pelo governo Fernando Henrique Cardoso, mas o projeto até hoje não decolou. Como uma OS, a sinfônica teria autonomia administrativa e legalidade jurídica para contratar, demitir e trazer solistas estrangeiros para apresentações no País sem a burocracia de hoje.

A situação vem sendo examinada de conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE). Para tentar habilitar-se para fazer contratações desse tipo, a Fundação Padre Anchieta pediu para tornar-se uma ?fundação de apoio?. No fim do ano passado, o TCE começou a julgar o mérito do pedido, inclusive para determinar se exigiria da fundação a obrigatoriedade do registro de admissões de funcionários.

Artigo publicado na semana passada no Estado revelou graves problemas de infra-estrutura na sede da emissora. Reutilização de fitas de arquivo, obsolescência técnica, falta de manutenção de equipamentos básicos e sucateamento de estúdios e equipes de externas. ?O governo reconhece que é necessário ajudar a TV Cultura?, disse Andrea Calabi, secretário de Planejamento do Estado.

Calabi vê, no entanto, um certo ?exagero? no quadro que foi apresentado pelo Conselho da Fundação, e acha que o diagnóstico veio à tona como uma forma de ?pressão? para que o governo liberasse verbas antecipadamente. Ele cita o orçamento da TVE, emissora pública federal, que terá apenas R$ 11 milhões em 2003 (menos de 10% da Cultura), para exemplificar que não é por falta de dinheiro a crise na TV Cultura.

?Foi uma exposição pública de ansiedades internas?, definiu o secretário. ?Isso é absolutamente negativo e prejudicial à imagem do Estado?, considerou.

A administração da TV Cultura acusou falta crônica de equipamentos tecnologicamente mais avançados, mas somente este ano incluiu na sua proposta de orçamento um valor razoável para compras dessa natureza, de R$ 8 milhões. Entre os itens solicitados, estão equipamentos básicos, como fitas.

Em 2001, a direção pedira R$ 500 mil. Em 2000 e 2001, não houve o diagnóstico da urgência desses investimentos.”

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“Funcionários fazem ?apitaço? na TV Cultura”, copyright O Estado de S. Paulo, 9/05/03

“Três sindicatos – radialistas, jornalistas e artistas – vão promover hoje, por volta das 13 horas, um ?apitaço? na frente da TV Cultura, protestando contra a atual situação caótica na emissora. Relatório elaborado pela direção da Fundação Padre Anchieta e divulgado pelo Estado mostra que a TV Cultura tem problemas estruturais profundos, que vão de goteiras, falta de fitas, rachaduras em caixas d?água, falta de equipamento.

O Sindicato dos Radialistas, no entanto, acha que o problema também é de responsabilidade da direção da fundação e acusa a atual gestão, presidida por Jorge Cunha Lima, de ?falta de transparência? em contratos e administração.

Com base no que os sindicalistas vêem como ?indício de irregularidade? (a instituição possuiria cópias de contratos assinados para a produção do infantil Ilha Rá-Tim-Bum, que teriam sido pagos dois anos antes da produção efetivamente ser iniciada), os sindicatos pretendem oferecer denúncia ao Ministério Público contra a direção da fundação.

A direção da emissora atribui a crise ao enxugamento progressivo das verbas que o governo do Estado destina anualmente à Fundação Padre Anchieta. O governador do Estado, Geraldo Alckmin, disse à reportagem que considera que a emissora precisa de um novo modelo de gestão.

Ontem, o deputado Vicente Cândido (PT-SP) entrou com requerimento na Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia da Assembléia Legislativa do Estado pedindo uma investigação e discussão pública sobre a atual crise na emissora. Cândido também propõe uma visita dos deputados à sede da TV.

Em 2002, a TV Cultura arrecadou por seus próprios meios – anúncios pagos na grade de programação, principalmente – mais de R$ 20 milhões. Ainda assim, foi obrigada a demitir 202 funcionários contratados e outras 54 prestadores de serviços em fevereiro. Também fechou-se a biblioteca do Setor de Pesquisas da Fundação, organismo que era considerado o ?coração? da instituição.”

“Cultura diz que terá socorro do Estado de SP”, copyright Folha de S. Paulo, 10/05/03

“O presidente da Fundação Padre Anchieta (mantenedora da TV Cultura), Jorge da Cunha Lima, disse ontem que a entidade está próxima de um acordo com o governo estadual pela liberação de verbas que irão aliviar a crise financeira da emissora.

Segundo Cunha Lima, as negociações evoluíram e devem ser concluídas na próxima semana. ?Senti boa vontade [do governo de São Paulo] para resolver o assunto?, diz.

A fundação pediu ao governo estadual a liberação de R$ 17,4 milhões para pagar dívidas com fornecedores, fazer reformas urgentes em suas instalações (a caixa-d?água da entidade ameaça desabar) e investir em equipamentos.

De acordo com Cunha Lima, o governo deve atender parcialmente aos pedidos.

O Estado, segundo ele, deve ampliar o desembolso para folha de pagamento da fundação de R$ 59,4 milhões para R$ 66,1 milhões em 2003. Segundo Cunha Lima, esse aporte permitirá que a fundação pague todos os salários e encargos trabalhistas.

Cunha Lima diz ainda que o governo estadual deve liberar R$ 3,5 milhões de verbas de custeio, que serão usados para pagar fornecedores. O presidente da fundação afirma que acredita que o Estado irá assumir compromisso de pagar sentenças judiciais da entidade, que devem atingir R$ 4,5 milhões neste ano.

Segundo Cunha Lima, o quarto pedido, o da liberação de R$ 8 milhões para investimentos em equipamentos, não deve ser atendido imediatamente pelo Estado.

A assessoria do governador Geraldo Alckmin não confirmou as informações de Cunha Lima.”