Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Folha de S. Paulo

LIBERDADE DE IMPRENSA

“Marco Aurélio defende nova Lei de Imprensa”, copyright Folha de S. Paulo, 30/09/03

“O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio de Mello defendeu ontem a criação de uma nova Lei de Imprensa, em seminário sobre direito de acesso a informações públicas organizado pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), em Brasília.

?Seria interessante nós discutirmos para o país uma nova Lei de Imprensa?, disse ele.

Criada em 1969, durante o regime militar, a lei traz dispositivos que autorizam a apreensão de publicações e punem a violação de segredos de Estado.

O ministro se disse preocupado com a proibição de veiculação de reportagens, o que considerou ?censura que não se coaduna com os novos atos constitucionais?.

?Refiro-me à censura administrativa e refiro-me também, com uma preocupação maior, à censura do próprio Judiciário. Não cabe proibir a veiculação dessa ou daquela matéria. Não cabe afastar do cenário profissional esse ou aquele jornalista ou apresentador. Um possível desvio de conduta nessa atuação é que deve ser punido?, declarou.

Processos judiciais

Marco Aurélio de Mello se disse ainda preocupado com o número de processos judiciais contra os veículos de comunicação. Segundo ele, os cinco maiores grupos respondem a 3.342 ações, das quais 3.192 são na área de direito civil, em que se busca indenização por danos morais e materiais.

Ele afirmou que ?3.342 é um número substancial se compararmos com o número de processos existentes há dois anos e meio?, quando, segundo ele, esse número era a metade do que é hoje.

Também compuseram a mesa de debates o presidente do STF, ministro Maurício Corrêa, o presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha (PT-SP), o procurador-geral da República, Claudio Fonteles, o ministro do Controle e da Transparência, Waldir Pires, e o presidente da Abraji e diretor da sucursal da Folha no Rio, Marcelo Beraba.

Todos defenderam mais rigor nas apurações jornalísticas e a escuta do ?outro lado? em reportagens que envolvam acusações.

?Será que as informações foram checadas, será que as partes foram ouvidas??, perguntou João Paulo.

Corrêa disse que é preciso apurar os desvios de conduta do poder público e que as investigações são ?desagradáveis para quem está no funcionalismo?.”

“Mello vê risco para a liberdade de imprensa”, copyright O Estado de S. Paulo, 30/09/03

“O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse ontem que nos últimos dois anos as ações judiciais movidas contra cinco dos principais grupos jornalísticos do País quase duplicaram. ?Há um quadro que me preocupa?, afirmou, no Seminário Internacional sobre Direito de Acesso a Informações Públicas, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).

Conforme levantamento do site Consultor Jurídico apresentado pelo ministro, há hoje 3.342 processos em andamento na Justiça envolvendo os grupos Estado, Folha, Globo e Abril e a Editora Três. Desses, 3.192 são cíveis e incluem pedidos de indenização. Só 150 são penais. Ex-presidente do Supremo, Mello disse que há casos nos quais são pleiteadas indenizações de cerca de R$ 1 milhão. ?Uma verdadeira loteria esportiva.? Segundo ele, porém, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), usando de ?bom senso?, tem fixado valores de cerca de R$ 20 mil.

Mello afirmou temer uma inibição dos veículos. ?Sem a imprensa livre não podemos cogitar de democracia.? Recentemente, citando o direito à liberdade de expressão, ele votou pela concessão de habeas-corpus ao editor Siegfried Ellwanger, acusado de racismo por divulgar idéias discriminatórias contra judeus. Mas o STF resolveu manter a condenação.

Mello afirmou que, pela Constituição, não é possível proibir a veiculação de informações nem o afastamento de jornalistas ou apresentadores. Ele lembrou que recentemente foi concedida liminar determinando que uma publicação fosse analisada antes de veiculada. ?Isso é censura que discrepa das balizas constitucionais.?

O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), criticou o comportamento de parte da imprensa que, segundo ele, não dá o tratamento adequado às informações e, às vezes, pode destruir a vida das pessoas. O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, lembrou do episódio em que o ex-ministro Alceni Guerra ?sofreu um linchamento violentíssimo? antes de ser inocentado. Mas defendeu o jornalismo investigativo. ?Segredo é incompatível com democracia.?”

 

TRANSGÊNICOS EM DEBATE

“Vamos consumir o fato consumado”, copyright No mínimo (www.nominimo.com.br), 29/09/03

“O Brasil descobriu um método exótico de lidar com questões potencialmente polêmicas. Quando surgem, finge-se que não existem. Quando não se consegue mais ignorá-las, cria-se um reboliço e atropela-se o que houver pela frente. Trata-se o fato como consumado e acrescenta-se uma Medida Provisória, com a promessa de que, no final, vai dar tudo certo. Fez-se assim na epidemia de dengue, na crise de energia e agora na ?maldição? da soja transgênica. Tenta-se com isso apresentar ao dono da conta uma espécie de solução. Poderia até ser, não fosse falsa. Na saída que criou para a brigalhada da soja, o governo tenta fazer crer que no fim de 2004 não restará grão geneticamente modificado nas áreas em que agora permitiu plantá-los. Ainda que seja necessário queimar os estoques. Não há uma linha verdadeira nessa promessa. Até lá, ou o país terá construído mecanismos que garantam a produção amparada na lei, ou o governo irá espetar outra medida provisória no Congresso. A soja natural acabou. O resto é ficção petista.

No Brasil planta-se soja geneticamente modificada há sete anos e todos os governos sempre souberam disso. Na administração do companheiro Olívio Dutra, no Rio Grande do Sul, foi registrado o maior salto da lavoura de soja GM. Seu secretário de Meio Ambiente, Cláudio Langone, é o atual secretário-executivo da ministra Marina Silva. O que ele reclama hoje nos jornais corresponde a tudo o que deixou de fazer quando era autoridade num estado onde estava sendo feito um plantio proibido por lei. Era crime. O que se faz agora é tentar tapar o sol com a peneira, como dizem os conterrâneos de Langone. Grande parte dos integrantes do MST, que Langone ajudou a organizar no Sul para pintar a Monsanto como representação do Demo na agricultura, são hoje diligentes plantadores da soja amaldiçoada.

Jose Bové, o ativista francês que depreda lojas da cadeia McDonald?s a título de combater o capitalismo, quando destroçou plantações e algumas pesquisas da Monsanto no Sul sabia menos que seus colegas brasileiros. Os manifestantes que prepararam a invasão deram-lhe para destruir diante dos fotógrafos 25 disquetes com uma pesquisa sobre milho. A da soja guardaram incólume. O MST conhece o terreno onde pisa. Tanto que o ministro Miguel Rosseto, apesar de não conseguir livrar-se, na época, das acusações de ter ajudado a organizar os protestos, está aí, no comando da reforma agrária. O próprio Bové, que buscava muito mais propaganda do que resultados efetivos, cruzou o episódio no papel de paspalho. Seu partido na França, o Via Campezina, precisava dizer que fizera no Sul seu primeiro parlamentar brasileiro. Até hoje, porém, ninguém sabe quem é frei Sérgio Görgen, um enclave no PT gaúcho.

De volta à soja. Do Rio Grande do Sul, aonde chegou de mansinho com algumas sementes da chamada ?soja Maradona? contrabandeadas da Argentina, a lavoura GM já fincou raízes por Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia e até no Piauí, além do triângulo mineiro. Garantir, portanto, que a produção ficará restrita ao Rio Grande do Sul ou que em dezembro de 2004 o que sobrar terá sido incinerado é apostar na falta de memória de quem se dá ao trabalho de ler as bobagens que se escrevem em Brasília.

O que faltou ao governo foi cacife para encarar o petismo e botar as fichas na ?Carta de Recife? assinada por Leila Oda, presidente da Associação Nacional de Biossegurança. Se não a leram, não foi por falta de destinatários, já que Leila a enviou a Lula, Sarney e João Paulo Cunha, no dia 24 passado. O importante, porém, é que transmitiu-lhes as conclusões de 700 cientistas de Brasil, Argentina, Colômbia, Chile, Equador, Venezuela, México, Cuba, Bélgica, Espanha, Itália, França, Reino Unido, Estados Unidos e Canadá. Não se pode dizer que tenham sido poucos ou pouco representativos, não é? Reunidos em Recife esses personagens produziram um conjunto de observações entre as quais a de que ?o atraso tecnológico no campo da agrobiotecnologia poderá não só representar perda da competitividade do agronegócio brasileiro, bem como a não-disponibilidade no país de alternativas agrícolas ambientalmente menos agressivas, com menor uso de defensivos agrícolas, menor erosão do solo, economia de água e de insumos?.

Só isso, num coro de 700 cientistas, já seria suficiente para dar uma freada de arrumação na conversa. Mas a carta leva adiante: ?O debate ideológico e desprovido de fundamentação científica representará um caminho sem volta e irrecuperável para o Brasil, mais grave do que o que foi a reserva de mercado para a Informática?. De reserva de mercado o senador Sarney entende bem e ideologia, sabemos todos, é o exercício preferido dos políticos brasileiros, quando não estão ocupados em trocar de partido; dos integrantes do MST, quando não estão invadindo a propriedade alheia; e dos funcionários públicos, quando não estão em greve.

Na tecla da ideologia também bate Denis Rosenfield, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. ?Em nosso país, a discussão sobre os transgênicos tem um forte viés ideológico, como se a introdução desse tipo de plantio fizesse parte de uma luta política de conteúdo anti-imperialista?, escreveu ele. Observados os números dessa discussão, é difícil não concordar com Rosenfield, quando afirma que ?a ciência brasileira e os produtores rurais são os grandes prejudicados? pela versão ideológica da batalha agrícola. Em Tupanciretã, pequena cidade gaúcha localizada no centro do estado, a soja que se planta é toda geneticamente modificada. Ali vivem 20 mil pessoas. População pequena, mas gente séria, que não atira pedra em submarino movido a energia nuclear para defender o meio ambiente. Como também não rasgam dinheiro, produziram números muito interessantes. Vamos a eles:

Para proteger contra pragas um hectare de soja convencional gastam-se 66 dólares. O mesmo serviço em igual área plantada com soja transgênica custa 22 dólares. Por quê? Porque a lavoura GM é mais resistente, exige volume e variedade menor de produtos agroquímicos. Os mesmos números do povo de Tupanciretã mostram que em 1 hectare de lavoura convencional colhem-se 45 sacas de soja. Na mesma área de soja GM o resultado é 55 sacas. Impossível, então, discutir a questão pelo lado dos resultados.

Em alguns momentos, a argumentação contra os transgênicos incluiu a dependência dos agricultores em relação à Monsanto para o fornecimento de sementes. Os próprios plantadores de Tupanciretã, no entanto, derrubaram a tese em carta a todos os deputados federais. Nela admitiam trocar as sementes da multinacional pelas da Embrapa, desde que continuassem plantando soja GM. Como enviaram a carta em março, concluiu-se que há mais de meio ano a Câmara dos Deputados sabe que não só a Monsanto produz sementes, que a lavoura GM estava em pleno crescimento e que não havia a menor disposição de mudar o rumo. Como soja transgênica e MST fervem no mesmo caldeirão, os deputados preferiram esperar que entornasse no colo do governo.

Mas não ficaram só na carta, os agricultores. Enviaram também os números com um recado para quem quisesse discutir meio ambiente. ?Sob o aspecto ambiental a quantidade de princípios ativos para a soja convencional (uma média de 3,06 kg/ha) diminuiu (1,44 kg/ha) para a soja geneticamente modificada, o que para a atual safra brasileira de 16 milhões de hectares, daria uma diferença de 26 mil toneladas a menos de princípios ativos na natureza a favor da soja geneticamente modificada. Sob o aspecto econômico o produtor economizaria 704 milhões de dólares, que não seriam pagos às multinacionais para poluir o solo brasileiro?.

Testemunha desse fenômeno, a jornalista Sandra Terra, que há 20 anos percorre áreas de plantio de grãos geneticamente modificados no país, garante que as diferenças que observa têm sido sempre para melhor. Com a redução no uso de agrotóxicos, relata, ?as lavouras estão limpas. Os lagos e açudes estão repovoados e os pássaros estão de volta?, entusiasma-se.

Por conta disso, o que resta são acusações e ameaças de cada um dos lados. De recebimento de dinheiro que vem da Europa, onde tem sede a maioria dos fabricantes de agrotóxicos; e de boicotes, invasões e destruição de lavouras – armas preferidas dos opositores dos geneticamente modificados. Quando o deputado Fernando Gabeira, devotado soldado da causa ecológica (nem sempre bem postado, é verdade), diz que vai exigir do governo o confinamento da soja transgênica ao Rio Grande do Sul apenas demonstra que precisa aproximar-se do campo para desvendar-lhe os segredos. Para transportar sementes, além dos métodos convencionais, já foram inventados os ventos e os pássaros. Pior, pela frase de Gabeira descobre-se que a liderança de seu partido não lhe conta tudo o que sabe.

Em qualquer supermercado encontra-se infinita variedade de alimentos e temperos cujos ingredientes foram geneticamente modificados. Grandes marcas de ketchup, mostarda, óleo de canola, tomates, batatas fritas, algumas marcas de leite de soja, entre centenas de outros produtos. Pouco se fala, mas o país também consome milhares de doses diárias de insulina geneticamente modificada. Diabéticos a inoculam diretamente no corpo. A vacina contra hepatite B, importada de Cuba, também é GM. Sobre isso pouco ou nada se ouve. Há também um silêncio sinistro em torno de outro herói das exportações e ex-símbolo do poder de compra do real: o frango destinado ao mercado interno.

Não há registro de que outro animal preparado para o consumo humano receba tamanha carga de antibióticos e hormônios para estimular o crescimento. Apesar disso, não se sabe de invasão do MST aos aviários que enchem de veneno a panela do brasileiro. Talvez ocorra se a Monsanto montar um galinheiro. Aí, quem sabe, vire assunto para outra Medida Provisória.”

“A discórdia dos transgênicos”, copyright O Estado de S. Paulo, 30/09/03

“O mundo todo está preocupado, inquieto, com os alimentos transgênicos.

Nada mais natural. Ao dominar o fogo, a humanidade já se assustava com o poder da tecnologia. A ciência agride, muitas vezes, o sentimento íntimo das pessoas.

Em O Nome da Rosa, a biblioteca era proibida pelos frades obscurantistas.

Ler significa saber. E o saber é intrinsecamente revolucionário. Quando Copérnico afirmou que a Terra não era o centro do universo, foi excomungado.

Da mesma forma, os primeiros cientistas foram considerados ?feiticeiros? e hereges. Muitos cérebros queimaram na fogueira.

Assim tem sido a evolução do conhecimento científico. Uma história recheada de incredulidade e, até, revolta. Certas descobertas, por mais maravilhosas que sejam, despertam sentimentos reacionários. Ao criar as bases do progresso, impulsionando a sociedade para o futuro, a tecnologia incomoda a cultura humana. Fere o conservadorismo.

Darwin foi o maior dos hereges contemporâneos. Seu estudo sobre a evolução das espécies permitia concluir que o homem era parente do macaco. Estava contestada, cientificamente, a origem bíblica do homem. A ciência pagou caro pela ousadia. Depois a bronca religiosa passou.

Reside aqui, nos marcos da cultura e da religião, a origem da discórdia atual sobre os transgênicos. Saber que os seres vivos, inclusive o homem, podem trocar germoplasma significa, no limite, descobrir que as espécies são, todas, parentes entre si. A consciência da insignificância humana diante da natureza choca o espírito.

Transferir genes de uma espécie para outra, criando um ser vivo funcional, acaba entendido como uma afronta à ordem natural do mundo. Os transgênicos seriam ?antinaturais? e, portanto, piamente detestáveis. Seres mutantes, perigosos, que poderão dominar o mundo: esse é o estereótipo terrível construído pelo medo do desconhecido. O alimento Frankenstein.

Não é bem assim. Por incrível que pareça, o mecanismo da transgenia foi copiado da própria natureza. Em 1972, os cientistas descobriram que bactérias do gênero Agrobacterium deslocavam parte de seu genoma para plantas hospedeiras, induzindo estas a produzir açúcares para seu crescimento. Esse evento mostrava a possibilidade real da transferência de carga genética interespécies. Uma década depois, na Bélgica, os cientistas conseguiram efetuar a transgênese com interesses agronômicos. A ciência tinha dado um passo fundamental.

A biotecnologia vinha modificando geneticamente os organismos vivos havia décadas, pela seleção genética. Com a chamada revolução verde, na década de 70, o melhoramento genético evoluiu, a partir dos novos conhecimentos sobre a estrutura do DNA. Os cruzamentos controlados entre variedades da mesma espécie misturaram as cargas genéticas dos seres vivos, desenvolvendo raças híbridas, que se revelaram altamente produtivas.

Com a técnica da transgenia, o processo tornou-se mais certeiro, seguro e rápido. Ela permite selecionar e transferir para outra planta, ou animal, apenas uma determinada característica positiva, eliminando os graus de incerteza comuns no melhoramento genético clássico. Uma verdadeira revolução científica, semelhante à provocada na Física por Einstein.

É descabido, em sã consciência, opor-se à técnica da transgenia. Ser contra ela significa estar a favor do atraso científico, na defesa do obscurantismo humano. Uma cópia da Idade Média.

A discórdia dos transgênicos está mal focada. Questionável não é o conhecimento, o método científico, mas sim seus produtos tecnológicos e, principalmente, o uso das tecnologias desenvolvidas. Desde a bomba atômica a humanidade receia o (mau) uso da tecnologia. As técnicas, soberbas, podem ser desvirtuadas e resultar em desastres para o homem.

Quem se coloca, simplesmente, contra ou a favor dos transgênicos, comete um equívoco. Pode-se aceitar ou criticar, isso sim, cada organismo geneticamente modificado. Colocá-los todos numa panela só, eliminando ou engolindo o caldo, a estupidez será a mesma. Um evento científico será sempre diferente do outro. Cada qual exigirá rigorosos estudos e análises, sobre a saúde, o ambiente, a economia, antes de ser oferecido à sociedade.

Esse cuidado é inerente ao processo do desenvolvimento tecnológico. Os cientistas nacionais, da Embrapa ou das universidades, têm dele pleno conhecimento. Se afirmarem que a soja RR é segura, não há por que temer. O algodão Bt parece uma maravilha, o feijão pode provocar alergia. Cada caso, um resultado.

A conclusão é óbvia: na questão dos transgênicos não pode haver nem preconceitos nem ideologia. Primeiro, é preciso acabar com uma espécie de discriminação contra a agricultura. A insulina pode ser transgênica, a soja não. Condenam-se os organismos geneticamente modificados (OGMs) no campo, mas se aplaudem os da medicina. Inaceitável.

Segundo, é necessário superar o ranço político. Os transgênicos não são nem de esquerda nem de direita. Esse reducionismo é lamentável. Quem defende a tecnologia está a serviço das malvadas multinacionais; opõem-se os nacionalistas bonzinhos. Francamente, esse reducionismo é lamentável.

Terceiro, há que se livrar do temor divino. Os transgênicos não ofendem a Deus nem à razão. Pecado capital, isso sim, será cometido se vingar a descrença na ciência nacional. Políticos de segunda categoria querem entender mais que pesquisadores premiados. Aqui reside a insânia: o perigo da desmoralização dos cientistas brasileiros.

Xico Graziano, agrônomo, foi presidente do Incra (1995) e secretário da Agricultura de São Paulo (1996-98) E-mail: xicograziano@terra.com.br”