Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Furo, a Missão

Nos primeiros dias de fevereiro de 1989, Assunção ferve sob o sol de Carnaval e dos rumores sobre o destino do ditador deposto Alfredo Stroessner. Uma hora, o velho caudilho paraguaio havia seguido para o Chile. Na outra, estaria se preparando para embarcar para os EUA ou para a Suíça. É domingo de manhã e o mundo não sabe onde foi ou vai parar Stroessner. Descubro que seu destino já está definido: o ditador vai curtir seu exílio no Brasil, para onde embarcaria naquela tarde. Bomba na mão, frustração no coração. Em menos de uma hora, haveria o anúncio oficial e o jornal Zero Hora, para o qual cubro o golpe no Paraguai, não teria a menor possibilidade de dar a informação com exclusividade no dia seguinte. Desesperado por soltar a informação, ligo imediatamente para a Rádio Gaúcha, do mesmo grupo (RBS) do jornal, e entro no ar em edição extra. Furo. Mas na rádio. No jornal, a história ganha outra dimensão: os bastidores da operação diplomática para que o Brasil recebesse o incômodo Stroessner.

O furo clássico, aquele do acontecimento exclusivo de grande repercussão, já recebeu a extrema-unção na imprensa diária. O furo agora é diferente. É a visão exclusiva sobre um fato, o mergulho nos bastidores (rádio e TV não conseguem ainda reproduzir como e por que uma decisão foi tomada numa reunião fechada), é reportagem, é jornalismo investigativo de primeira linha, é a percepção de tendências e comportamentos em primeiro lugar, é a interpretação, a demonstração de que não há geração espontânea de acontecimentos. É isso que Zero Hora procura fazer a cada edição.

Com essa concepção, o jornal fez a opção pela informação consolidada, confirmada, fechada, abrindo mão da notícia apressada e capenga. Minha absoluta convicção é de que o leitor prefere receber um texto bem escrito, sem vácuos de informação, sem derrapagens na precisão do que a “última notícia”. Um exemplo: se for para acrescentar retalhos ou informações tortas, a editoria de Mundo, soterrada por mais de mil textos diários despejados nos terminais, não fecharia jamais. Mais vale um texto definitivo, sem estofar a mente do leitor com um fast-food editorial, do que a vã vaidade de publicar uma informação, supostamente mais atual, que os fatos tratarão de negar na manhã seguinte.

Mais grave ainda é a concorrência sem medidas. ZH, obviamente, tinha a informação sobre as suspeitas da Polícia Federal sobre um professor na explosão ocorrida no Fokker 100 da TAM. Não publicamos o nome e nem indicações que pudessem revelar sua identidade. Pelo Manual de Ética de ZH, ninguém será identificado como suspeito até que haja confissão, prisão em flagrante ou indiciamento policial. Era o caso e, apesar de amplamente divulgado por outros veículos, o nome continua sendo mantido em sigilo em ZH. Levamos um furo e estamos felizes. Sobretudo, estamos com a consciência tranqüila.

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