Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Gabriela Goulart

COBERTURA DA GUERRA

"Bastidores da notícia", copyright Jornal do Brasil, 13/10/01

"No dia 11 de setembro, quando atentados terroristas chocaram os Estados Unidos e paralisaram espectadores do mundo inteiro diante da TV, a CNN, maior rede de notícias 24 horas do planeta, registrou um aumento de 633% em sua audiência. No horário nobre, o percentual foi de 357%. Os números impressionam. A estrutura da emissora para a cobertura jornalística da primeira guerra do século 21 impressiona ainda mais. Segundo Chris Cramer, presidente da CNN Internacional Networks, são 75 pessoas enviando material da Ásia Central e do Oriente Médio. Comparada ao efeito fliperama criado pela CNN na Guerra do Golfo, a total pobreza das imagens dos bombardeios americanos ao Afeganistão – registrados in loco apenas pela emissora Al Jazeera, uma das ?200 afiliadas internacionais da CNN?? – não preocupa o executivo. ?Eu diria que esta guerra é apenas diferente de qualquer coisa que vimos até hoje??. Diferente no que se vê e também no que circula nos bastidores. Apesar de ressaltar a isenção da CNN na cobertura, Chris Cramer demonstra que a emissora está respeitando os ?limites jornalísticos?? impostos pelo governo americano – que fez um apelo à imprensa pedindo que não fossem veiculadas, na íntegra, declarações de Osama Bin Laden e outros líderes da Al Qaeda. ?A CNN decidiu não pôr no ar, ao vivo, declarações da Al Qaeda, incluindo Osama Bin Laden. A política da emissora é evitar divulgar qualquer material que possa facilitar diretamente atos terroristas??. A seguir, sua entrevista.

– A Guerra do Golfo foi uma das mais importantes coberturas da CNN, com o efeito fliperama criado com a ajuda de câmeras que o Pentágono instalou nos caça-mísseis. Como é, para o maior canal de notícias 24 horas do mundo, cobrir, agora, uma guerra quase sem imagens?

– Nós temos pessoas na região. Não diria que a cobertura esteja sendo mais difícil, porque estamos acompanhando os fatos da mesma maneira que cobrimos a Guerra do Golfo e muitos dos acontecimentos mais importantes do século passado. Diria que é apenas diferente de qualquer coisa que vimos até hoje. Não vai acabar rapidamente como a Guerra do Golfo. Esta guerra contra o terrorismo é algo que vamos cobrir ainda pelos próximos meses e anos.

– E a restrição das imagens?

– Temos imagens sim dos bombardeios. Temos equipes no Afeganistão que viajam até as frentes de guerra e registram imagens para a CNN. Em termos de qualidade, são o mesmo tipo de imagem que colocamos no ar durante a Guerra do Golfo.

– Os repórteres estão se baseando em fontes, o Pentágono fornece uma versão dos fatos e os líderes talibãs desmentem. Como o senhor analisa este tipo de cobertura jornalística?

– A CNN tem pessoas no Afeganistão que estão investigando e fazendo reportagens. Nós estamos apresentando os dois lados do conflito e temos mostrado responsabilidade em nossa cobertura.

– Qual é a estrutura da CNN nesta cobertura? Quais as principais dificuldades enfrentadas?

– Isto muda a cada dia. Neste momento, temos mais de 75 pessoas enviando material da Ásia Central e Oriente Médio, incluindo 35 no Paquistão e 12 em solo afegão. Este número inclui tanto áreas controladas pelo Talibã como a região Norte do Afeganistão. No momento, estamos usando várias tecnologias para reportagens, incluindo satélites, antenas parabólicas em satélites, videofones e pagers.

– Quanto a CNN está investindo nesta cobertura? É mais do que foi investido na Guerra do Golfo?

– Vamos comparar a situação atual com a que tínhamos na época da Guerra do Golfo. A CNN tem o dobro de funcionários, o dobro de jornalistas e o dobro dos escritórios que tinha naquele que talvez tenha sido nosso melhor momento, a Guerra do Golfo.

– As únicas imagens divulgadas são da TV Al Jazeera, do Catar, que está sendo chamada de CNN local. Como é a relação entre a Al Jazeera e a CNN?

– A Al Jazeera é uma das mais de 200 afiliadas internacionais da CNN espalhadas pelo mundo. Temos mantido relações há vários anos. Isso significa que a Al Jazeera nos dá suporte tecnológico e logístico na região em troca do livre acesso ao nosso sinal. Não temos nenhuma influência nas decisões editoriais deles, nem eles sobre as nossas.

– A CNN colocaria no ar uma entrevista ao vivo com Osama Bin Laden?

– Decidimos não pôr no ar, ao vivo, declarações da Al Qaeda, incluindo Osama Bin Laden. Primeiro vamos ver as fitas para decidir como lidar com elas. A política da CNN é evitar divulgar qualquer material que poderia facilitar diretamente atos terroristas. Ao tomar uma decisão, a CNN levará em conta a orientação das autoridades apropriadas.

– Qual é a estrutura atual da CNN?

– A CNN atualmente emprega mais de 3,9 mil profissionais da área de jornalismo em todo o mundo, em 42 escritórios. Temos uma rede de mais de 850 afiliadas locais ao redor do mundo. No total, a CNN dos EUA e a CNN internacional são vistas em 240 milhões de lares.

– O senhor acredita que o tamanho da CNN faz uma grande diferença diante das outras?

– Enquanto rede internacional, a CNN não tem rival. Esse é o nosso negócio e temos investido nele nos últimos 21 anos. Não sei em que medida isso afeta as outras redes. Mas, com toda certeza, continuamos a ser uma referência quando se trata de saber as últimas notícias. É preciso lembrar que fomos criados para pôr notícias no ar 24 horas por dia. É isso que sabemos fazer melhor.

– Como tem sido a audiência da cobertura da guerra?

– A CNN está empregando um volume extraordinário de recursos na cobertura da guerra contra o terrorismo. No entanto, no dia dos atentados, tivemos um aumento de 633% na nossa audiência em termos da média do dia inteiro, em comparação à mesma data do ano passado. E um aumento de 357% no horário nobre. No Brasil, tanto a CNN Internacional como a CNN em espanhol ficaram entre as cinco redes a cabo mais vistas no dia 11 de setembro.

– Alguns repórteres estão sendo criticados por expressar opiniões a favor e contra George W. Bush. Como a CNN está orientando seus repórteres e âncoras neste caso?

– A política da CNN é não editorializar. Na nossa cobertura, apenas relatamos os fatos em questão, procurando assegurar uma isenção entre as partes em conflito. A CNN não tem posições políticas."

"As batalhas vencidas da internet", copyright Jornal do Brasil, 14/10/01

"Da televisão à internet. A guerra televisionada é agora a guerra online, disponível 24 horas na Rede, que desde o dia dos atentados nos EUA, 11 de setembro, tem-se mostrado a mídia mais usada, e mais eficaz, para a divulgação de informação.

Há 10 anos, ligamos a televisão para ver a primeira guerra ao vivo. Na tela, um esverdeado que só os militares conheciam, para visualizar o terreno no escuro. Os clarões indicavam os bombardeios da coalizão formada para acabar com a invasão de Saddam Hussein ao Kuwait. Era a Guerra do Golfo. No domingo passado, as primeiras imagens de um Afeganistão deserto e arruinado chegaram pela internet, com a ajuda de equipamentos que transmitem os sinais de vídeo, voz e texto pela Rede. Ao invés da nitidez da TV, a pouca definição característica das transmissões pela internet. Em comum, a dramaticidade de ver lugares já áridos, completamente destruídos.

A mudança não foi só técnica. No dia 11 de setembro, a internet quase parou com o tráfego intenso de pessoas que buscavam informações atualizadas nos sites de notícias. Por algumas horas, as páginas mais populares tiveram que mudar seus desenhos para atender à demanda. Enquanto as estações de televisão repetiam incessantemente as cenas dos aviões se chocando contra seus alvos, a internet recebia os relatos das pessoas que escaparam dos prédios. O meio online estava ?esquentando?? a notícia, mostrando o drama por trás das paredes de vidro, aço e concreto do World Trade Center e da fuselagem dos aviões.

Menos sexo – Pela primeira vez, nos dias seguintes ao ataque, a palavra ?sexo?? não só saiu do primeiro lugar dos 10 termos mais procurados na internet como desapareceu da lista, em troca de ?Pentágono??, ?Bin Laden?? e outros relacionados ao atentado.

Ninguém ficou de fora do ciberespaço. Cidadãos comuns, americanos ou não, criaram páginas com seus relatos e oferta de ajuda, empresas abriram canais de doações e até Osama Bin Laden, principal suspeito da organização dos atentados, se pronunciou pela primeira vez depois dos ataques numa página de notícias árabes.

Enquanto o acesso à internet via banda larga não se popularizar (o que proporcionaria a transmissão de vídeo de alta qualidade), a televisão continuará a ser o meio ideal para a divulgação das imagens da guerra. No entanto, a importância da internet em situações de conflito já é inquestionável. O que começou com uma simples e diluída troca de mensagens dos iugoslavos com o mundo exterior, denunciando as atrocidades de Slobodan Milosevic na década passada, cresceu para a participação ampla e efetiva da população, na internet.

Quatro letras – A revolução do jornalismo pessoal deve-se a quatro letras – blog. Os blogs são homepages pré-montadas onde qualquer um com conhecimentos básicos de internet pode publicar textos, imagens e áudio, de graça. O maior serviço do gênero é www.blogger.com, que criou uma seção exclusiva para blogs sobre o conflito.

Mas o maior exemplo de que o equilíbrio entre as mídias pode estar mudando vem da Biblioteca do Congresso americano, considerada uma das maiores instituições culturais do globo. Tradicional guardiã da história impressa, a Biblioteca patrocina, junto com o site www.webarchivist.com, uma iniciativa para armazenar e organizar todos os sites pessoais sobre os atentados do dia 11 de setembro. E para a mídia impressa, é só acessar www.poynter.org e visitar o arquivo com mais de 400 primeiras páginas sobre os atentados."

    
    
                     
Mande-nos seu comentário