Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

“Homem morde cachorro”, hoje, é ordenar a informação e explicar seu contexto


Nahum Sirotsky, correspondente da RBS, Zero Hora e Rádio Gaúcha em Israel

 

J

erusalém – Tive em minha vida muitos mestres. Mas, no começo, a sorte de ter Francisco Alves Pinheiro como chefe de reportagem e Roberto Marinho, na prática, fazendo o copydesk, a correção dos textos. Eram os tempos de O Globo sem dinheiro, com sua redação no Largo da Carioca,. junto ao desaparecido Tabuleiro da Baiana, Rio de Janeiro.

Alves Pinheiro, que, velho de idade e sem o seu trabalho entrou em depressão e se matou, foi o maior chefe de reportagem que conheci em toda a minha longa vida de jornalista. A melhor peça de teatro sobre o jornalismo foi, no meu ver, Front Page (Primeira Página), do americano Ben Hecht, ex-repórter de policia em Chicago nos tempos de Al Capone..Pinheiro era a própria primeira página.Foi quem me ensinou o significado da noticia naqueles dias.O significado de “noticia é quando o homem morde o cachorro”.

Roberto Marinho, que deve ter esquecido disto, insistia em que o texto tinha de ser absolutamente claro. Menino, gostava de mostrar conhecimentos com palavras pouco usadas Ele chamava minha atenção. E dizia que jornal é para ser entendido. Ninguém tem tempo de ler jornal com dicionário na mão, ensinava. A grande prova de sua competência como jornalista e administrador é o império de comunicação que ele criou como poucos iguais no mundo.

Um me ensinou ir em busca do fato ou criá-lo, outro, a importância da palavra e significados. No começo foi o verbo, e assim será até o fim. E se é um truísmo que uma imagem fala mais do que mil palavras, também é verdade que é compreendida com palavras que escrevem para lermos ou por nos mesmos, em nossas imaginação e pensamento.

Mas inúmeros veículos impressos caíram pelo caminho com a entrada do rádio, a televisão, a televisão a cabo, por satélite e, agora, Internet. Esqueceram da importância da palavras, quiseram competir com outras mídias. E ainda o tentam. Cresceram em poder e influência, em prosperidade, os veículos que, com editores inteligentes, têm sabido dar respostas adequadas ao desafio das novas mídias.

Por exemplo: nos Estados Unidos, o New York Time, o Washington Post ,o Los Angeles Times, o Boston Globe, para citar os mais conhecidos, sempre cresceram com a concorrência de novas mídias. São, hoje, mais ricos, poderosos, influentes e respeitados do que nunca.

Não tenho lido os balanços da imprensa brasileira. Leio as edições digitais de inúmeros jornais, não raramente antes de serem lidos no Brasil pelo simples motivo de que aqui, 8 da manha são duas da madrugada no Rio. Levo seis horas de vantagem.. O Globo, Estadão, Folha, JB, Correio Braziliense, Correio do Povo, do Paraná, Zero Hora, são uns tantos exemplos de adequação aos novos tempos. De forma geral, onde existem problemas financeiros, e estejam certos disso, decorrem de falhas da administração, gerencia anacrônica, incompetência do marketing. Entre esses jornais, na minha opinião, o que mais se aproxima do que deve ser um veículo em nossos tempos são as Folhas, Veja, e algumas da publicações do grupo Civita só não competem no mercado internacional porque falam português.

E, para quem vive dentro da Internet, como eu, lendo ou trocando figurinhas com amigos no mundo árabe do Oriente Médio, minhas fontes mais do que confiáveis, como se comprovaram, só tenho aplausos para Universo Online e,dentro dele, o Brasil Online, um excelente informativo diário sobre o nosso pais.

Democratizar a informação

Civita e Frias, empresários inteligentes, entenderam que as novas mídias, por mais incríveis que pareçam, são, na essência, meios altamente desenvolvidos de comunicação, o meio de levar ao mundo, instantaneamente, imagens e palavras. Meios de democratizar o acesso a informação e ao conhecimento sem jamais esquecer a palavra. Hoje, estima-se haver mais de 4 milhões de sites, de lugares na Internet com informações (notícias) e conhecimentos, nisso se incluindo também o pior da sociedade dos homens, dos pedófilos aos sádicos, dos ladrões aos assassinos. hooligans. É o nosso mundo. Diante desse número, as grandes empresas estão pagando fortunas pelos sites mais visitados. A Disney acaba de pagar 900 milhões de dólares pelo Infoseek. Interessa o seu papel de vitrina interativa, de meio de promoção de negócios, de publicidade.

O OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, por exemplo, é conhecido até no exterior. Entra em inúmeras listas de veículos sobre o Brasil, ou formação de jornalistas etc. Lamentável, ou falta de inteligência de patrocinadores, que não se apresente em outras línguas.

Mas, o que é resposta adequada da mídia impressa – jornais e revistas- ao desafio das novas mídias? Pela análise dos que têm sido mais bem sucedidos, em termos de receita e influência, verifica-se que aplicam a velhíssima lei das vantagens competitivas que maximizam. Mais e mais mostram uma tendência a não competirem, no que vão sendo compreendidos pelas agencias de publicidade e anunciantes. Eles se dirigem um percentual relativamente pequeno da população, aquele de indivíduos ou empresas de maior poder de consumo e influencia, às elites, digamos assim, que, além dos fatos consideram essencial compreender, logo, o seu significado no contexto micro e macroeconômico, político, etc. Tê-los comunicando os elementos para compreender que se pode ler e reler, digerir, assimilar, pensar. Um norte, uma bússola na incrível massa de fatos que a instantaneidade dos meios de comunicação lança sobre todos.

É relativamente simples ser convencido a comprar uma marca de pasta de dentes. Mas, e o que Clinton andou dizendo na China? Ou o presidente do Banco Central americano em sua mais recente coletiva? O entendimento do significado é vital para que o indivíduo se oriente e dê direção a seus negócios, por exemplo.

A lei dos retornos decrescentes

Os veículos que atualizaram sua concepção do que deve ser o papel de cada uma das novas mídias são os que estão prosperando. Eles finalmente entenderam que , dependentes de matérias-primas concretas, como papel, tinta e etc., não podem fugir da lei dos retornos decrescentes. Num determinado instante maior circulação tenderá a significar menores lucros até que uma circulação gigantesca leve a empresa à falência.

Aconteceu inúmeras vezes no começo do rádio como veiculo, da televisão. A revista Colliers, americana, faliu por ter chegado aos 8 milhões de exemplares de circulação numa tentativa de competir com a massa colada na televisão. E o mesmo tende a acontecer com mídia impressa e emissoras de televisão que tentarem competir com a Internet nos termos dessa última. Fracassarão. A mídia é a mensagem, é uma lição que não se pode esquecer.

Ainda não se tem idéia exata de até onde irá a Internet. O que se sabe, sem duvida, é que as leis que regem a informação diferem daquelas que regem a economia de coisas concretas. Informação, quanto mais se tem mais se terá, exatamente o oposto da escassez dos bens materiais. Nos nossos tempos verifica-se que a velocidade das mudanças é cada vez maior por causa dessas mesmas mudanças. O futuro é cada vez mais o imediatamente após, estonteante, levando a um crescimento dos que procuram a alienação do real no real virtual. Então, aqueles veículos impressos que apóiam os que não podem correr o risco de tal alienação, os que atuam como radares ou faróis, são os que têm presente e futuro.

Os que entenderam que na economia da informação “homem morde o cachorro” não é apenas o bizarro e o anormal. É, principalmente, tentar ordenar a informação para que explicá-la no contexto em que vivemos: de mudanças ultra-rápidas em todos os campos da vida humana. Não basta o fato. Por exemplo que realmente significa o “Brasil em ação”, de Fernando Henrique. Trocar tudo em miúdos. Não foi o que vimos acontecer. Infelizmente.