Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Instituto não deve estar a serviço da pesquisite


Alberto Dines

 

T

odos se autodenominam “institutos”. Ninguém reparou que o nome veio do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística, o primeiro no gênero no Brasil, o famigerado Ibope, único dicionarizado como substantivo e também conotado como adjetivo (= prestígio).

Instituto é instituição ou entidade dedicada a altos estudos, estabelecimento de ensino ou pesquisa. Dedica-se a atividades não-lucrativas, não faz parte de empresas comerciais. Tem estatuto e formato próprio, definido por lei. O IBGE, o IPEA, o IBMEC e o Instituto Uniemp são alguns exemplos clássicos de institutos, centros de estudos ou atividades cívicas. Na Unicamp, os Institutos são centros de produção de conhecimento especializado.

No entanto, na onda do Ibope todas as empresas dedicadas ao negócio de sondagens de opinião assumiram-se como “institutos”. Inclusive o Datafolha, que, apesar do subtítulo “Instituto de Pesquisas”, é uma divisão do Grupo Folhas cuja razão social é inequívoca: Empresa Folha da Manhã S.A.

Exemplar o anúncio de página inteira no caderno Eleições da Folha de S. Paulo (11/10/98) mostrando os acertos das prévias realizadas pelo Datafolha. Faz parte do conjunto de textos publicados nesse jornal a partir do dia seguinte ao primeiro turno e da onda gerada pelos desacertos (ou descompassos) entre as prévias de boca-de-urna e o pinga-pinga das apurações.

O Datafolha tenta demarcar-se dos demais apresentando-se como “instituto independente” que “não trabalha para candidatos e partidos políticos. Seus únicos clientes em pesquisas eleitorais são veículos de comunicação”.

Na verdade, o único cliente do Datafolha é a própria Folha. Em tempos normais suas sondagens estão sempre articuladas com as matérias jornalísticas. Funcionam ostensivamente como reforço estatístico de suas posições editoriais, fato que tem merecido sérios reparos deste OBSERVATÓRIO. (Ver abaixo.)

Para qualificar-se como “instituto” verdadeiramente independente, o Datafolha deve desenvolver trabalhos para outros clientes, empresas de comunicação ou não, no intervalo do calendário eleitoral. Tal como fazem as grandes empresas de sondagem americanas, como o Harris. Sua credibilidade terá que ser testada constantemente pelo mercado e não pelas previsões pré-eleitorais de um grande jornal que, como sabemos, tendem à autoconfirmação. Sobretudo quando dramatizadas, apregoadas com intensidade e reiteradas.

Este OBSERVATÓRIO, por isso, reclamou quando a Folha implantou seu último modismo eleitoral (logo copiado pelo JB): colocar ao lado do nome dos candidatos majoritários, o percentual que obtiveram na última prévia. Convertia o flagrante de um determinado momento numa situação de fato.

A Folha é o único jornal que tem o seu próprio mecanismo de aferição da opinião pública. O Datafolha não vive de pesquisas regulares, portanto não tem necessidade de associar-se aos demais “institutos” que defendem a liberdade irrestrita de divulgação de prévias.

Se a Folha pretendesse efetivamente defender o direito dos eleitores – como diz o Datafolha no anúncio/proclamação – deveria alinhar-se entre aqueles, como este OBSERVATÓRIO, que defendem a necessidade de limitar a divulgação das pesquisas nos momentos finais da campanha.

O que está em causa não é a confiabilidade das prévias mas sua utilização abusiva por parte da mídia, inclusive da Folha, sem os devidos cuidados e cautelas. O Datafolha poderia pretender o nome de “Instituto” se estivesse interessado em proteger o leitor-eleitor da inevitável indução resultante da obsessão com cifras. No momento, é apenas braço promocional de um grande jornal.

 


Editorial de Alberto Dines para o Observatório na TV de 10 de outubro de 1998

 

As apurações do primeiro turno trouxeram uma onda de queixas contra a utilização abusiva das prévias. A outra reclamação foi contra a ausência de debates entre os candidatos. Agora, na reta final do segundo turno, diante dos debates realizados no rádio e TV, verifica-se que o problema é o próprio teor da discussão.

O debate de idéias e programas foi substituído pelo denuncismo vazio e pelas acusações pessoais. Que os candidatos façam esse tipo de apelação entende-se: querem chegar aos segmentos menos esclarecidos e mais numerosos, acostumados a esse tipo de violência.

Acontece que a mídia alimenta-se destes escândalos e deixa completamente de lado as questões substantivas. Cria-se um circulo vicioso em que os candidatos concentram-se nos ataques pessoais porque a mídia lhes dá destaque e a mídia concentra-se neles porque nada oferecem como alternativa.

Generaliza-se o fenômeno do populismo não apenas por inclinação e feitio dos postulantes ou porque os marqueteiros apostam tudo nesta direção mas porque sem a apelação simplista ficariam em desvantagem perante os concorrentes.

Mas em pelo menos um caso a própria organização do debate acabou por comprometê-lo. Foi no primeiro confronto Covas-Maluf, domingo último, pela rede Bandeirantes onde falhas graves na sua condução puseram em risco sua própria confiabilidade.

Se as emissoras de rádio e TV querem assumir o papel que lhes cabe no processo político devem preparar-se cuidadosamente e, sobretudo, não permitir que pequenos deslizes, tal como nas prévias eleitorais, coloquem em dúvida a imparcialidade e a isenção dos meios de comunicação.

 

LEIA TAMBEM

Notas sobre a cobertura eleitoral