Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Ivan Angelo

MAIS QUALIDADE

"A excelente matéria publicada no último domingo pelo jornal O Estado de S. Paulo, assinada por Rosa Bastos e Lia Rangel, coloca em números estatísticos e protestos do público o que temos dito neste espaço: a televisão que é feita no Brasil não satisfaz o público a que se destina. O ibope é enganoso porque não informa nada sobre as expectativas e frustrações do público.

Indica apenas o que o público pôde escolher nesse fim de feira que é a televisão: verduras murchas, bananas podres, peixes de mau cheiro, uns raros legumes saudáveis.

Quando se pergunta sobre a qualidade e os conteúdos, como mostra a reportagem, o público é claro. Na pesquisa de público-alvo feita pelo Ibope, ouvindo 10 mil pessoas, 89% acham que as emissoras deveriam exibir mais programas educativos; 86% acham que as emissoras deveriam se preocupar mais com as conseqüências do que transmitem (principalmente as repercussões no público jovem, em formação); 74% acham que a tevê mostra mais violência do que gostariam de ver; 64% acham que tem mais sexo e nudez do que gostariam – e, como conseqüência, 65% acham que o governo deveria controlar mais a tevê.

É isso: a irresponsabilidade leva ao desejo popular por censura, assim como a impunidade leva à opção pela pena de morte. Quem mais clama pela liberdade de expressão, e a exerce sem pensar na sociedade como um todo, desigual, mas igualmente merecedor de consideração, é quem a põe em risco, irresponsavelmente. O que a pesquisa indica é que se essas questões fossem colocadas num plebiscito, as liberdades invocadas pelas emissoras correriam risco.

A cara, os gestos, os muxoxos, a má vontade e o bufar de Luís Felipe Scolari na coletiva de imprensa transmitida pela ESPN-Brasil após o treino contra o Panamá evidenciaram o sentimento que ele tem pela mídia em geral: desprezo. Mesmo cobrado por um repórter sobre sua atitude com relação aos ?críticos?, Scolari continuou naquela de ?não tou nem aí?, ?não tou preocupado?. Por desprezo às perguntas, por não dar a mínima, por desrespeito, Scolari dava voltas e fazia a entrevista parecer uma conversa de doidos. Do que ele disse, ficou uma frase: ?Os jogadores não têm confiança.? Se isso acontece com os supostamente melhores, numa eliminatória mixuruca, que confiança e espírito teriam na Copa de verdade?

?Dia Dia?

Não se pode dizer que as manhãs da Band tenham melhorado com as mudanças. Nesta primeira semana, a emissora ficou com cara de rádio com imagens. O noticioso das 8 h, que dependia de um certo desempenho visual, ficou muito mais cheio de palavras, talvez porque a integração de todo o sistema Band de notícias esteja puxando um pouco para esse lado. Até a entrada da simpática Olga Bongiovani tem algo de radiofônico, com os beijos e mensagens para os ouvintes, perdão para os telespectadores, que lembra o estilo dos disc-jóqueis. As entradas do ex-apresentador Tavinho Ceschi, com notícias quentes, funcionam, mas na hora da troca mais informal de palavras entre ele e a apresentadora eles muitas vezes se atropelam. Talvez seja uma questão de acertar o passo, ela se mostra um pouco afoita, com medo dos espaços em branco. O formato antigo tinha boa audiência no horário, a velha turma quebrou pedra para botar o programa aonde chegou, e vamos ver como será o seu aproveitamento.

FHC

Míriam Leitão entrevista Fernando Henrique, quarta-feira, no Alvorada, para a Globo News, e a coisa parece chocha. Baixa no telespectador uma estranha sensação de ?para quê?? Não é culpa da ótima repórter e analista. O que o presidente possa dizer é que parece desinteressante.

Talvez uma sensação de ?o que não fez até aqui não vai fazer mais?. Ou talvez alguns fatos decepcionantes do seu governo tenham rabiscado seu retrato. Nem candidatos ele ousa apontar, não se arrisca. Indicar um sucessor seria uma forma de expor-se a um julgamento e, nesse assunto, tucano tem bico de pardal."

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"A televisão carece de mais Jorges Amados. Da sua precisa e preciosa noção de popular, sem rebaixar o tratamento do tema no afã de atingir a massa. Sem equívocos quanto aos limites do bom gosto. Com uma generosa abertura para as crenças e mitos, buscando o lado espiritual e não os dogmas. Carece da sua capacidade medida de inserir ficção dentro da História, fazendo com que uma contribua para a outra. Do seu humor tropical, sem o sotaque amargo e sincopado dos americanos, que predomina na prosa e na dramaturgia de hoje.

Das suas tramas de fácil acompanhamento. Da sua linguagem, que na busca da simplicidade procurou privilegiar o repertório da maioria da população.

Não foi bem Jorge Amado que vimos até aqui na televisão. Foram leituras de sua obra. E muitas, como a atual novela das oito na Globo, foram adaptações muito livres e distantes do original. A melhor adaptação, e a que esteve mais perto de Jorge Amado, foi feita em 1975 por Walter Jorge Durst:

Gabriela. Durst era um autor de tevê apaixonado por literatura. Nem o Grande Sertão: Veredas o intimidou. Ele também adaptou, de Jorge Amado, Terras do Sem-Fim, com bom resultado. Tinha, como Amado, preocupações sociais, e como pouquíssimos autores de textos para tevê, tinha preocupações estéticas, especificamente com a estética da televisão.

Sempre que se puder juntar com regularidade estas duas coisas, boa literatura e boa linguagem de tevê, teremos bons espetáculos.

Ainda bem que Monique Evans não foi aprovada pela Rede TV!

para fazer o nada original Super Pop, um programinha de auditório igual aos outros, que foi entregue à perseguida Luciana Gimenez. Ganhou, quase como consolação, o Noite Afora, programa típico da madrugada, no mesmo canal.

Numa cama redonda de motel (como aquela que ajudou a MTV a dar visualmente o recado do programa Erótica, da dupla Babi e Jairo Bouer) Monique desenvolve sua performance simpática, envolvente, maluca e desbocada. É uma espécie de Chacrinha do mundo pornô, que extrai sua graça da espontaneidade e da improvisação. O truque é esse: convida homens e mulheres de alguma evidência para falar de sacanagem. Geralmente, quando os homens falam desses assuntos, ou estão rindo com outros homens ou tentando aliciar alguma mulher. No caso de Monique, ela não está em questão nem em jogo. É sacanagem para divertir e brincar. E ela fica muito mais à vontade do que os homens.

Usa uma linguagem peculiar e abusa de uma risada estranha, que ocupa demoradamente toda a sua boca e garganta. Sua pronúncia para certas palavras até confunde o ouvido, e o telespectador se pergunta: que foi mesmo que ela disse? Como ?sexo?, por exemplo, que ela se diverte pronunciando de maneira ao mesmo tempo anasalada e gutural, resultando em algo parecido com ?zhegso?.

Em programas recentes, na semana passada, ela recebeu, num, o jogador Dinei e uma garota de Playboy que já andou com o jogador Ronaldo, em outro, o cantor-compositor Falcão e a autora de um livro que explora a pornografia como linguagem. Falcão tirou de letra, igualou-se a ela na naturalidade para falar besteira, mas os outros intimidaram-se com a volubilidade da apresentadora. Alguns quadros do programa são tolos (como o da realização da fantasia de um telespectador: um banho de ofurô ajudado por uma gueixa) e às vezes há boas reportagens (como a que mostra o prédio de serviços para um enclave de prostituição no Rio), mas o que funciona mesmo é a desenvoltura de Monique. É um programa maroto, que não ofende.

A Band mexeu novamente no jornalismo da manhã. O Dia Dia News foi substituído pelo boletim BandNews, das 8h às 8h30. É apresentado com uma linguagem de boletim mesmo, com nome do programa, hora e data superpostos no alto, e embaixo sucedem-se títulos de matérias, numa técnica inspirada na primeira-página dos jornais. A apresentadora Regina Volpato, bonita e comunicativa, foi uma boa escolha. O apresentador do antigo Dia Dia News, Tavinho Ceschi, aparece no programa seguinte, comandado por Olga Bongiovani, transmitindo notícias e narrando reportagens desde o estúdio. O formato antigo parecia-me melhor. Vamos ver."

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"A sensibilidade da repórter
Peltier no Carandiru", copyright Jornal da Tarde, 12/8/01

"Uma das grandes qualidades de uma reportagem, seja na tevê, seja na imprensa, é ser reveladora, proporcionar ao público uma visão nova sobre o assunto enfocado ou, pelo menos, uma visão coerente, consistente nas informações e abrangente. O trabalho realizado por Márcia Peltier no último programa Livre Acesso (Band, domingo, 22 h), enfocando a penitenciária feminina do Carandiru, foi as duas coisas: revelador e abrangente.

As presas tiveram a confiança de se abrir com ela, falar de intimidades, desejos, emoções, culpa, vaidades. Apareceram sensibilidades insuspeitadas em tal ambiente. Muitas moças bonitas, algumas bem articuladas, uma que fora até professora. Falaram de seus crimes (principalmente tráfico de drogas, ou ?artigo 12?, como dizem elas; e também furto e roubo), mas não se percebe na atitude ou nas palavras aquele rancor misturado com fatalismo que é freqüente nas falas dos homens presos. São quase levianas, algumas sorriem para dizer que erraram. Uma admite: ninguém me levou, fui porque quis, foi erro meu mesmo.

Sobre o ambiente, as presas conseguiram passar uma outra visão: é menos ruim do que pensavam antes de entrar. Não é um horror, cheio de gente monstruosa.

O pior é não poder sair; para muitas, está melhor lá dentro do que fora, em termos de acomodações, saúde, comida e amizades. Brigas? Ora, diz uma, se a gente briga até dentro de casa, por que não vai ter briga aqui? Mas não tem nada que ver, explica ela, com a barra-pesada da cadeia dos homens.

Homossexualismo? Uma diz que quiseram forçá-la, todas as outras dizem que vai quem quer, ninguém agarra ninguém. A solidão, admitem, favorece.

Ao contrário dos homens, elas não têm visitas íntimas. A intenção é evitar gravidez e doenças. Umas concordam, outras não. Mas namoram, à distância, os presos do Carandiru, pendurados nas janelas, a uns 200 metros de distância.

Namoram por meio de sinais convencionados, e chamam de ?abano? tanto a linguagem quanto a atividade e o namorado. Algumas são apaixonadíssimas pelo seu ?abano?, homens cujo rosto mal divisam à distância.

Vaidosas, pintam o rosto, os lábios, fazem sobrancelhas. Nas suas cartas de amor, mandam junto uma miniatura de calcinha e sutiã bordada com linha cor-de-rosa. Têm atividades com dança, música, percussão, aulas diversas que ajudam a passar o tempo. Mas sentem falta de um curso prático, que lhes dê formação profissional. Cabeleireira foi o curso mais citado.

Como em tudo que diz respeito à mulher, a reportagem pintou um quadro mais humano do que nos habituamos a ver no Carandiru dos homens, um horror. A delicadeza e a sensibilidade da repórter podem ter contribuído para essa visão. Uma vantagem a mais do olhar feminino, de que andamos tão necessitados na tevê.

Bom o programa de Lorena Calábria, Ensaio Geral, com Ney Matogrosso, na última quarta-feira, no canal Multishow. Uma entrevista com finalidade biográfica, feita como deve ser: espaço para o entrevistado contar suas coisas, cenas e recortes do passado, sucessos. Foram mostradas cenas raras do show dos Secos & Molhados no Maracanãzinho que inquietaram o governo militar. Hoje tem mais homenagens aos 60 anos de Ney Matogrosso no programa Por Trás da Fama, também no Multishow, às 21h30. E dia 17, o mesmo canal exibe o show que fez sucesso no Credicard Hall, Batuque.

O jogador Vampeta fala coisas interessantes hoje, no programa Bola da Vez, que o ESPN Brasil apresentou no sábado e reapresenta hoje, às 23h30. Explica por que não vem para o Flamengo ou para o Corinthians, para não perder dinheiro que os clubes europeus lhe devem. Sobre a seleção, diz que está faltando personalidade aos jogadores, que o time não pode apenas desarmar, precisa valorizar mais a posse de bola. E arremata: ?A coisa mais fácil é jogar futebol.?"


 

    
                  
                     
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