Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Joaquim Ferreira dos Santos

TV FAMA

"O escândalo do ploc!", copyright No. (www.no.com.br), 25/10/01

"Você não vai acreditar, mas o Kiko do KLB está de namorada nova!!!! Você ainda deve estar boquiabrido mas lá vai outra bomba: o Dado Dolabella foi numa festa no Rio e não estava com a sua namorada oficial, Vanessa Camargo!!!! Estava – é melhor você sentar porque essa é forte – o Dado estava com a Daniella Winits!!!!!

Todas essas notícias foram dadas no programa TV Fama, quarta-feira, na RedeTV! Se você não tem a mínima idéia de que gente é essa, orgulhe-se de tamanha ignorância. Estamos juntos. Danielle Winits ainda levou um close em cheio na altura dos silicones, e me caiu a ficha. Os outros, nem vaga idéia. Cantores, atores, tudo de quinta. É o novo modismo da televisão vespertina: shows e mais shows de fofocas sobre os famosos. O problema é que, se até os anônimos têm seus oito programas de fama em ?No Limite?, todos somos famosos e desinteressantes. Ou você quer saber mesmo alguma coisa sobre o romance desta semana entre Mion e Babi?

Antes as tardes televisivas eram dedicadas às mulheres que queriam dar um show para os maridos quando eles chegassem do trabalho. Eram dezenas de programas ensinando tudo de bordados ou como tirar manchas de café da camisa branca. As prendas do lar. Mudou. Não está claro ainda se é para melhor, mas mudou. As revistas femininas nas bancas agora ensinam as mulheres a dar um show na cama. A Criativa deste mês apresenta 57 técnicas de sedução e outras tantas para manter a barriga durinha. A Claudia divulga o sexo com garotos de programa. Ai de quem não se enquadrar! A brasileira virou uma muçulmana fundamentalista oprimida pelos editores das femininas. Trocou a receita do bolo de laranja pela receita de não sei quantos orgasmos por relação. Na televisão, mudou também. As mulheres das três às seis ficam sabendo tudo sobre o que vai pela cama, sofá e bidês dos artistas. Breve vão querer fazer o mesmo com os maridos.

Quem viu o filme do Buñuel entende agora porque a Bela da Tarde saía para aprontar. Não tinha programa na tevê. Nada mais triste, nem mesmo a Catherine Deneuve ter de fazer sexo com aquele japonês balofo da caixinha de música, do que assistir ao Leão Lobo, na Band, no Melhor da Tarde, fazendo tititi sobre aquele galã da novela das seis, qual?, aquele, pois é, estava comendo bacalhau com arroz no Antiquarius. Nos bons tempos, a infâmia, calúnia e difamação estavam para a imprensa como o trio maravilhoso Regina para o toucador da mulher bonita: davam realce ao noticiário. Hoje dão processos retumbantes. Pega-se leve na redação. Você viu o vestido de noiva da Carla Perez?! Que coisa, hein?!!

A Rede TV!, com todas suas falsas interjeições, dedica-se de três da tarde às oito da noite ao culto desses pequenos comentários sobre gatas e galãs da Globo em sua interminável gincana de namoros. Tédio. Repare bem se com o seu aparelho não acontece o mesmo. Quando o seletor de canais da minha casa passa pela RedeTV! dá para ouvir o barulho de ploc! De bola de chiclete. De vazio. O grande sonho da fofoca, como disse alguém, é ser confundida com o escândalo. A fofoca quer virar alguma coisa além do ploc! que lhe é inerente. Mas quando a vítima é a Luize Altenhofen, o máximo que pode acontecer é confundí-la com a Joana Prado o que dá na mesma. Nada. Na RedeTV! tudo vira só abobrinha, adubada com a santa ignorância da comunidade telespectadora.

São aquelas mesmas pessoas que tornaram possível o fenômeno editorial das revistas de R$ 1 e agora não têm dinheiro nem para isso. O horror, o horror e a mis&eacuteacute;ria. Sônia Abramo pega essas revistas e reproduz tudo. De graça. O jornalista que tem o texto reproduzido não ganha nada. Não se contrata ninguém no estúdio. A câmera enche a tela com a página e a Sônia vai lendo linha por linha que Mario Farias cortou o cabelo!!! São notícias realmente espantosas e urgentes, por isso os apresentadores capricham nas interjeições. Luis Fernando Carvalho e Simone Spoladore continuam juntos!!! Tem uma regrinha cínica do jornalismo que manda primeiro apurar e depois distorcer. No jornalismo de fofoca da televisão ninguém apura nada. Já está tudo nos jornais e revistas. Custo zero, ibope crescente.

Eu não acredito que você, leitor, acredita que a RedeTV! acredita que a gente acredite no interesse de qualquer coisa que é dita ali. Tudo ploc! Tudo muito duvidoso. Quarta-feira de tarde, sempre em busca da verdade, dei uma passadinha também pelo programa da Marcia Goldsmith, na Band. Ela apresentava um sujeito que confessava, para todo Brasil, que tinha um pênis de apenas 7cm e sofria por não conseguir consubstanciar uma relação sexual. No país de Garrincha, que usava camisa 7 no campo e camisinha 25 na cama, tanta sinceridade só pode ser mentira. Achei que ia haver alguma peça testemunhal. Nada. Voltei para o reino da fantasia que é a RedeTV!

Não é à toa que Jeanie é um Gênio passa na RedeTV! Quarta-feira, o marido de Jeanie estava na guerra, sem comida, e a feiticeira lhe transformou uma caneta em melão. Nelson Rubens, um dos fofoqueiros da casa, tenta fazer a mesma mágica com as pombas do jornalismo: ?Eu aumento mas não invento?, é o seu slogan. Não é à toa que o Teste da Fidelidade, que anda provocando uma pequena comoção no ibope, seja uma das atrações da emissora. ?Aqui arma-se?, parece dizer o tempo todo. João Kleber, o apresentador, foi collorista de primeira hora, mas não é por isso: você emprestaria um lenço quando escorresse a primeira lágrima dos olhos do rapaz? Falta sinceridade em tudo. A impressão é que, cansados de fazer pegadinhas com os otários nas ruas, a vítima agora é o da poltrona. Não adianta mais se esconder em casa. Ninguém escapará. Ou é antraz ou é João Kleber.

Segunda-feira uma bailarina desmaiou em cena durante o Teste da Fidelidade do João Kleber. Você pode achar desumano, mas eu já tinha visto a Sônia Abramo de tarde, o Nelson Rubens de noite e ia entrar no ar a madrugadora Monique Evans, que se jura muito tímida na cama e por isso só faz sexo com a luz apagada. Você pode achar cruel mas na RedeTV! não dá para se ouvir o anúncio da verdade nem quando a bailarina desfaz a pose e cai. Não acreditei de novo. Foi esquisito quando a moça caiu. Não fez barulho. Também fez ploc!"

 

OS ASSUMIDOS

"TV mais do que assumida", copyright Jornal do Brasil, 25/10/01

"Foi um amigo gay de Rudolph Giuliani, o prefeito de Nova York, quem deu a grande idéia. Que ele comprou e resolveu vender. Numa cerimônia realizada pelo grupo ativista gay The Empire State Pride Agenda, no início do mês, Giuliani lançou o desafio. Se uma nova campanha da instituição arrecadar mais de US$ 200 mil em prol das vítimas dos atentados terroristas, ele, o prefeito da Big Apple, garantiu que vai participar – no papel de uma drag queen – de um dos primeiros episódios da nova temporada do seriado gay Queer as folk. Amanhã, o canal Cinemax, da TVA, exibe, à meia-noite, o último episódio da primeira temporada da série, batizada aqui de Os assumidos. O canal já comprou os direitos da segunda temporada e promete exibi-la em 2002. A data ainda não foi definida, mas a comunidade gay espera, ansiosa. A promessa de Giuliani ainda está no ar. E a comunidade gay aguarda, curiosa.

Argumento do pessoal do The Empire State Pride Agenda para dar uma forcinha à idéia de Giuliani: eles dizem que conseguirão arrecadar ainda mais recursos junto à comunidade gay caso o prefeito faça mesmo a ousada participação. Ousada em termos. Não será a primeira vez de Giuliani como drag queen. Mais que isso. Não será a primeira vez de Giuliani como drag queen na TV americana. O prefeito já apareceu vestido de mulher no humorístico Saturday night live.

Audiência – A direção do canal Cinemax também não precisou de muitos argumentos para se convencer de que valia a pena comprar a segunda temporada de Os assumidos para o Brasil. Para começar, a série original inglesa já tinha sido exibida aqui com relativo sucesso pelo Eurochannel (TVA). Além disso, os 22 capítulos da versão americana – mais glamourosa – obtiveram na TV brasileira média de 1,3 ponto de audiência, número igual ao de muitos programas de emissoras abertas como Band e Rede TV.

Os bons resultados garantiram para Os assumidos passagem para fora do armário até que a segunda temporada esteja pronta para estrear no Showtime, produtor e exibidor da série nos Estados Unidos: a partir de 14 de dezembro, o Cinemax vai reprisar os seus 22 episódios, todas as sextas-feiras, dois por vez, sempre à meia-noite. É tarde. Motivo: apesar de Os assumidos ser exibido na TV fechada e não descer a ladeira da baixaria, as cenas de sexo são ousadas, com muito beijo na boca e nudez quase explícita.

No Reino Unido, que terá seu primeiro canal a cabo gay a partir de abril de 2002, também há restrições de horário. O Rainbow Network TV (RNTV) terá 56 horas de programação por semana, das 18h às 2h. Das 18h às 23h, só programas light de comportamento. Das 23h às 2h, pegará fogo o serviço erótico do canal. O carro-chefe, no menu light, é Fabulous, com clipes fornecidos pela MTV Europa. A expectativa da direção é arrebanhar 35 mil assinantes até o fim do primeiro ano.

Pioneirismo – A idéia de TV assumida do Reino Unido está longe de ser inédita. Nos Estados Unidos (em Nova York), na Espanha e na Alemanha alguns canais da TV paga já abriram suas grades para programas gays. Nada que supere o pioneirismo do Canadá, país aparentemente mais bem resolvido no assunto. Foi lá que estreou, em setembro, o primeiro canal a cabo com programação gay 24 horas por dia, sete dias por semana. No seu site na internet, a PrideVision TV explica que quer conquistar a comunidade GLBT. GLBT? No vocabulário canadense, a sigla GLS (gays, lésbicas e simpatizantes) está ultrapassada faz tempo. A PrideVision TV – licenciada pela Comissão de Rádio, Televisão e Telecomunicações do Canadá – é para Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transexuais.

GLBTs podem assistir a programas de atualidade, viagens, esportes, economia, música, culinária, arte, biografias, shows de variedades, talk-shows, além de seriados e filmes de comédia e drama. Tudo com temas gays. Tudo devidamente testado antes. Nos grupos de discussão realizados pelo canal antes do lançamento, ficou comprovado que a comunidade gay queria atrações mais soft que o ?hard core? que lhes era oferecido.

?O mercado gay está começando a ficar bem visível e o que nós esperamos é amenizar a negatividade que surge simplesmente do fato de as pessoas não conhecerem a comunidade gay, lésbica, bissexual e transexual?, disse, na época, a vice-presidente de Marketing da PrideVision TV, Anna McCusker.

Mercado – Por aqui, não é preciso lente de aumento para constatar essa visibilidade. De acordo com dados da última pesquisa do site Mix Brasil (destinado ao público GLS), realizada em agosto com 300 usuários, 58% têm renda mensal igual ou superior a R$ 4 mil, 64% revelaram ter celular e 46% assinam algum canal de TV fechada. Pistas de um mercado promissor. Mas, na opinião do editor do Mix Brasil, André Fischer, os anunciantes ainda não enxergaram o caminho das pedras.

?Cansei de fazer pilotos de programas gays. Ainda há uma cegueira no mercado. Só para citar um exemplo, a Citroën cancelou o patrocínio que daria ao 9? Festival da Diversidade Sexual, que vai exibir filmes e séries de TV gays, de 13 a 23 de novembro, em São Paulo, porque tem um carro da linha que chama Picasso e poderia haver duplo sentido?, conta.

O SBT também não quis comprar briga com o possível conservadorismo de seus telespectadores. A direção da emissora resolveu não exibir a série inglesa Queer as folk, parte do pacote milionário assinado com a Warner, que comercializa o produto. ?Estamos totalmente fora. O seriado é muito bem feito, mas o telespectador brasileiro não admite essa ousadia. É conservador e tem muito preconceito. Acho que teria bons índices de audiência pela curiosidade, mas provocaria revolta?, justifica o diretor de programação do SBT, Mauro Lissoni.

Enquanto a emissora de Silvio Santos preferiu ficar a quilômetros da temática gay, a MTV correu na direção oposta. E chegou lá. A edição gay do programa Fica comigo, que terminou com um beijo na boca entre dois queridos (nome dado aos participantes), conseguiu 3 pontos de média, 6 de pico e muita polêmica. A repercussão foi tanta que, em dezembro, o canal começa a produzir a versão lésbica, o Fica comigo gay meninas. ?Não sei se um canal gay emplacaria no Brasil. Haveria dificuldades comerciais para viabilizar isto. Acho que tem que começar com programas temáticos?, analisa o diretor de programação da MTV, Zico Góes. E a MTV é das mais moderninhas."

    
    
                     
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