Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

João Ubaldo Ribeiro

FOTOJORNALISMO

"Minha carreira de modelo", copyright O Estado de São Paulo, 2/09/01

"Sou dos tempos heróicos do jornalismo (pensando bem, sou dos tempos heróicos de tudo, mas não gosto muito de ficar lembrando), em que não havia escolas de comunicação e uma redação era semelhante, na delicadeza do trato para com os focas, a oito sargentos dos fuzileiros navais tendo desentendimentos com recrutas. As crônicas mesmo, estas com que vos mimoseio todos os domingos, são, em última análise, da responsabilidade do finado Ariovaldo Matos, que me chefiava no antigo Jornal da Bahia e mais tarde se tornou muito amigo meu. Um belo dia, eu, que era péssimo repórter e só permanecia no cargo porque era o único que falava inglês e achava normal entrar no jornal às 2 da tarde e entregar as matérias por volta da meia-noite seguinte, estava passando em direção ao arquivo, creio que sob alguma desculpa, mas com o precípuo escopo de tomar ousadia com as funcionárias, coisa, que, aliás, elas nunca deixaram, quando Ari me deu um psiu.

– Ô esse menino – disse ele -, sente aí e escreva uma crônica.

– Uma crônica? Mas eu…

– Sessenta linhas, sessenta batidas. E ande logo, que eu tenho de fechar esta merda antes das 9.

– Mas, Ari, uma crônica? Crônica sobre o quê?

– Então eu mando você fazer uma crônica, lhe dou uma missão, e quem vai lhe dizer sobre o que é sou eu, faz-se de besta? Se você está procurando moleza, vá ser funcionário municipal. Sessenta linhas, sessenta batidas, meia hora para o fechamento.

Sentei ao teclado e perpetrei, nos meus verdes 17 anos, minha primeira crônica. Agora já escrevi tantas que devo, sem sentir, ter repetido algumas, ou muitas. E sinto tantas saudades das redações de minha juventude que instalei, neste computador, o barulhinho de uma máquina de escrever mecânica e, se vendessem uma fita cassete com a zoeira toda que se fazia numa redação daquele tempo, eu a deixava aqui, tocando o tempo todo. Mas não tenho saudades de redações como as de hoje, que às vezes lembram salas de recepção de repartições informatizadas, todo mundo silencioso, máquinas silenciosas, cigarros só no fumódromo e a notável ausência de um cheirinho de hospital, para complementar o ambiente.

Tempos que não voltam mais e não só na formação de minha geração em moldes darwinianos, mas em tudo. Estou tendo essas reminiscências porque o almanaque em que sou viciado me diz que este domingo é dia do repórter fotográfico. Dia do repórter fotográfico, saudades deles. No meu tempo, repórter fotográfico era muito diferente do de hoje. O repórter fotográfico ia lá e fotografava, ponto final. Hoje, ele só faz isso se não tem mais jeito, do contrário monta um esquema de produção suficiente para financiar vários curtas-metragens.

Nada contra eles, continuam meus queridos e respeitados colegas, mas estão ficando estranhos. Há bastante tempo que estão ficando estranhos e nenhum deles quer simplesmente tirar a fotografia do entrevistado. Aliás, outro dia, quando eu perguntei a um deles, pelo telefone, se ele viria junto com o entrevistador, ele respondeu com altivez que não se misturava, não dava certo. Já em Itaparica, um deles apareceu para passar a manhã toda me fotografando e me obrigou a alisar a nariganga de uma mula durante cerca de meia hora, a agüentar a cachaça de Boleiro, que naquele dia estava atacado, no Largo da Quitanda, a subir em forquilhas de árvores e a praticar diversos outros atos pouco condizentes com a dignidade de qualquer um – qualquer modelo, diria melhor, porque hoje não somos fotografados, somos modelos fotográficos. Esse mesmo repórter fotográfico quis que eu pegasse minha máquina de escrever, levasse-a para dentro do mar, pusesse-a sobre um rochedo, sentasse-me diante dela e, todo molhado e aparentemente nu (pois estava sem camisa e não se via o calção através do reflexo do sol na água), mostrasse aos leitores da revista como eu trabalhava. Opus renhida objeção a essa proposta e ele acabou desistindo, não sem ficar um pouco chateado comigo.

Aqui no Rio, recebo um ou dois por semana, às vezes mais. Não cesso de levar surpresas e tomar um susto ou outro. Um se revoltou com o que achou ser minha cara fechada, quando, na verdade, era a mesma cara que uso todo dia, só que, suando como um condenado porque ele usava a tomada do condicionador de ar para uma de suas lâmpadas mestiças de refletores antiaéreo, eu não estava assim com esse bom humor todo. Depois de alguns momentos de exasperação, finalmente fez uma proposta.

– Não é bem isso que eu quero dizer, mas não encontro outra maneira – falou ele.

– É o seguinte: você não podia, digamos assim, chegar o rosto mais perto do computador e desmunhecar um pouco?

– Desmunhecar? Mas eu nunca desmunheco! Ou desmunheco? Eu desmunheco? Uma desmunhecada?

– Sim, mais ou menos. Assim, uma coisa relaxada, uma desmunhecada de brincadeira.

Recusei-me a desmunhecar e devo ter feito outro inimigo. Assim como se tornou minha inimiga, creio eu, a jovem senhora fotógrafa (vi a aliança do dedo) que esteve aqui quando eu lançava o livro que me tornou instantaneamente sexólogo e mito sexual. Ela quis eu posasse sem roupa, bem verdade que na presença da outra repórter, mas sem roupa. Disse-lhe que teria certa dificuldade, que estava meio mal da barriga.

– Então nu, mas enrolado num lençol vermelho um pouco revelador – sugeriu ela.

Não fiz a foto, devo estar angariando mais antipatias. Não queria brigar com nenhum, especialmente no dia deles. Claro que vou manter o decoro hoje e não pousarei sem camisa, derramando uma lata de cerveja no ouvido (para sair com a legenda ?uso interno no cérebro?). Acho que estou mesmo fora de sintonia com os tempos."

 

MERCADO

"Jornais têm como crescer mais", copyright O Estado de São Paulo, 3/09/01

"O presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Francisco Mesquita Neto, disse ontem, durante o encerramento do 3.? Mix de Comunicação – evento que reuniu profissionais de jornalismo e publicidade do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco – que há mais oportunidades do que ameaças no panorama futuro dos jornais brasileiros.

Mesquita Neto, diretor-superintendente do Grupo Estado, salientou que os jornais devem ter a Internet como aliada e não concorrente. Ele citou o exemplo do portal Estadao, o site de jornal com mais acessos no Brasil, uma aposta do grupo para marcar presença no jornalismo do futuro. ?As empresas têm de mostrar que fazem a notícia na Internet tão bem como as dos jornais.?

Um fato que demonstra o potencial de crescimento dos jornais brasileiros, segundo Mesquita Neto, é o aumento na circulação dos periódicos em 85%, de 1990 a 2000. Nos Estados Unidos, no mesmo período, houve um declínio de 10,5%. ?O potencial quanto ao aumento de circulação ainda é grande?, reforçou, ao destacar que, de cada mil pessoas, apenas 45 lêem jornal no País."

    
    
                     

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