Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Jorge Ramos Avalos

VENEZUELA

"Proibido Esquecer: Jornalistas Sob Ataque", copyright O Globo, 9/05/02

"Ninguém me contou. Eu vi. Ao mesmo tempo em que Hugo Chávez regressava ao poder, mais de duzentos jovens de motonetas e motocicletas rodearam o edifício da Venevisión e ameaçaram atacar e invadir a maior emissora de televisão da Venezuela.

Foram armados com paus e pedras. Escutávamos os tiros no ar enquanto a multidão avançava.

Eu estava nas instalações da Venevisión editando uma reportagem para a televisão dos Estados Unidos e, como todos que estavam lá dentro, não pude sair durante mais de duas horas. Por fim, a localização do edifício – uma espécie de castelo moderno em cima de uma montanha – e a presença de guardas bem armados persuadiram os chavistas a irem para outro lugar. E foram para a Rádio Caracas TV, outra grande emissora da Venezuela. Lá, destruíram os janelões da televisão em um violento ato de intimidação contra seus jornalistas. Sei de vários repórteres, tanto da televisão como da imprensa escrita, que foram ameaçados de morte, e que por vários dias tiveram de se esconder.

O caso mais preocupante foi o de Luis Alfonso Fernández, o jornalista da Venevisión que mostrou na televisão as imagens do massacre da quinta-feira 11 de abril. Um alto executivo do canal me disse que a casa do repórter foi invadida e seus telefones grampeados. Além disso, há fortes pressões para que ele e Julio Rodríguez, o corajoso câmera, digam que as imagens que filmaram – e que provocaram a queda de Chávez – eram uma montagem.

Na Venezuela, não existe liberdade de imprensa. O que existe são jornalistas muito valentes. Isso foi o que disse há pouco um representante da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) quando visitou o país. E até agora as coisas não mudaram. Pelo contrário. Com o retorno de Chávez ao Palácio de Miraflores, após o golpe de Estado de 48 horas, aumentaram os riscos para os jornalistas.

Esse vídeo mostra simpatizantes do presidente Chávez atirando de uma ponte contra centenas de milhares de manifestantes que marchavam na Avenida Baralt de Caracas. Dois dos pistoleiros que dispararam contra a multidão foram identificados graças a esse vídeo: um é Richard Peñalver, membro do conselho da cidade de Caracas e dos chamados ?círculos bolivarianos?; o outro é Rafael Cobrices, que, ao ser detido, levava uma identificação do Movimento Quinta República.

Morreram mais de doze pessoas naquela quinta-feira. Uma das repórteres que presenciou essas mortes é Elianta Quintero. ?Eu estava exatamente onde estavam caindo os mortos?, contou-me em conversa. ?Todos os mortos que eu vi cair, todos, eram da manifestação.? Eliana me disse que viu cinco mortos e três feridos na tarde da fatídica quinta-feira. ?Todos os mortos que eu vi?, insistiu ela, ?foram baleados na cabeça?. Incluindo Jorge Tortoza, o fotógrafo do ?Diário 2001?. Jorge morreu simplesmente por estar fazendo seu trabalho. Elianta escondeu a cabeça e teve mais sorte. E em meio ao tiroteio, narrou passo a passo a matança.

Extraordinário trabalho. Ela, Julio (Rodriguez), Luis Alfonso (Fernandez) e muitos outros jornalistas foram nossos olhos e nossos ouvidos.

O que eles transmitiram à Venezuela e ao mundo na quinta-feira 11 de abril foi o que Chávez tratou de ocultar, sem sucesso, em cadeia nacional. O massacre não pode ser escondido. As televisões desafiadoras dividiram a tela em duas, e enquanto Chávez dizia que nada estava acontecendo e que ele estava com a situação sob controle, as imagens ao lado cuspiam mortos e feridos e repressão e ódio.

Nas ruas de Caracas, é evidente, percebe-se muito ressentimento contra os principais canais de televisão por não terem transmitido a tomada do Palácio de Miraflores pelos chavistas no sábado 13 de abril, nem as demonstrações de apoio ao seu líder encarcerado. Mas, independentemente da muito questionável e controversa decisão jornalística de não informar sobre esses fatos, e pôr em seu lugar filmes e programas de entretenimento, a realidade é que muitos dos repórteres de Venevisión, Rádio Caracas TV, Televen e Globovisión, entre outros, corriam perigo nas ruas. Não me contaram. Eu também estava lá. Eu vi.

Na noite de um sábado recente, tive de suspender uma transmissão de televisão ao vivo, por satélite, devido às várias rajadas de bala que passaram muito perto do lugar onde estávamos. Saímos do ar, apagamos as luzes e desligamos a eletricidade, escondemo-nos por um instante em um escritório e nada aconteceu.

No final das contas, eu parto da Venezuela para minha trincheira em Miami. Mas o que acontecerá com os jornalistas que ficam?

Bem, o que acontece é que muitos deles arriscam a pele cada vez que saem para fazer reportagens. Sem dúvida, aos poucos, os jornalistas foram se reintegrando ao seu trabalho. E sabem como tiveram de sair para trabalhar muitos desses repórteres depois da tentativa de golpe? Com coletes à prova de balas, sem identificação, em carros e caminhonetes privadas – não as das empresas para as quais trabalham – e com guarda-costas profissionais ou um segurança que os proteja.

Esta é a liberdade de imprensa de que tanto se gaba Chávez.

A perseguição e intimidação aos jornalistas e aos meios de comunicação, eu temo, não terminaram. Não se pode apoiar nenhum golpe de Estado – e menos ainda aquele realizado torpemente por Pedro Carmona e um grupinho de aprendizes. Mas a intentona golpista é a desculpa que Chávez buscava para tratar de retirar as concessões de alguns canais de televisão e estações de rádio que não estão seguindo a linha oficial.

Entretanto, os jornalistas independentes são o principal antídoto ao estilo autoritário e aos abusos de poder que têm caracterizado o chavismo. Ademais, muito desses repórteres são testemunhas oculares do que o governo de Chávez tanto quer esconder: o massacre de civis inocentes e desarmados na quinta-feira 11 de abril."

 

"Delegação da WAN faz oito pedidos a Chávez", copyright Comunique-se, 7/05/02

"A delegação formada por representantes da Associação Mundial de Jornais e pelo Fórum Mundial de Editores (Mogens Schmidt, diretor assistente da WAN e do Fórum, Pedro Ramirez, editor-chefe do jornal espanhol El Mundo, e Marcelo Rech, editor do jornal gaúcho Zero Hora) se encontrou nesta terça-feira (7/5) com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. O encontro foi marcado por oito exigências feitas ao governo.

Entre elas estão: investigar com profundidade os ataques contra os jornalistas nos últimos meses, em especial o assassinato do fotógrafo Jorge Tortoza, morto por um atirador que estava em um prédio do governo durante uma manifestação anti-chavista em 11/4; garantir que jornalistas possam trabalhar em condições favoráveis à liberdade de expressão, sendo defendido por policiais em caso de ataque; cessar com seus comentários inflamados sobre a imprensa; incluir representantes da imprensa nos diálogos de reconciliação; respeitar o artigo 143 da Constituição, que garante o acesso da imprensa a qualquer informação de interesse público; parar de abusar da premissa presidencial que lhe permite ter livre acesso às redes de TV quando deseja transmitir seus discursos.

Chávez disse que o ataque a jornalistas e jornais são, com certeza, algo do que se arrepender, mas lembrou que a mídia, antes do golpe, promoveu uma campanha anti-governista que acirrou os ânimos no país. ?Nada se compara aos ataques à Venezuela, feitos por grande parte da mídia?."

 

CASA DOS JORNALISTAS

"Casa dos Jornalistas vai abrigar exilados", copyright Comunique-se, 6/05/02

"Jornalistas perseguidos em seus países de origem vão ter um porto seguro a partir de maio de 2003, quando será inaugurada a Casa dos Jornalistas, em Paris. O projeto é financiado por 15 veículos de Comunicação franceses. Cada um deles terá a responsabilidade de manter um quarto na casa, que vai funcionar na rua Cauchy, número 35, no distrito 15.

Os presidentes de honra serão o fotógrafo Sebastião Salgado e o jornalista e escritor Jean Lacoture. Cada veículo entrou com aporte inicial de 11.145 euros.

Apesar de ser inaugurada somente no próximo ano, a casa – que hoje não passa de uma fábrica desativada – já recebeu sete jornalistas que pediram asilo. Eles são do Iêmen, Camarões, Gambia, Congo e Bielorrússia e estão alojados em uma estrutura improvisada."