Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Lixo em horário nobre

 

Roberto Medeiros (*)

Pedro Bial, o tarimbado repórter internacional que voltou ao Brasil para ser apresentador do Fantástico, e Léo Batista, veterano apresentador de programas desportivos, se prestaram ao ridículo papel de conduzir a "reportagem" inaugural do programa de domingo, 28 de novembro (Fantástico, Rede Globo, 20h).

Em cena, convenientemente acobertadas por máscaras, duas airadas jovens narravam a orgia promovida em Caxias do Sul, quando ali esteve recentemente a equipe do Flamengo, do Rio. Passados alguns minutos das oito da noite, as famílias brasileiras que assistem ao programa ficaram sabendo, entre outras coisas, que participaram da festinha seis mulheres, "quatro de Caxias do Sul e duas de Porto Alegre", nas palavras de uma das "entrevistadas". A "festinha" com o time do Flamengo – solteiros e casados – ocorreu na suíte 701 de um hotel na cidade de Caxias do Sul, cujo nome foi discretamente omitido no texto. Como conseqüência mais imediata da farra, o jogador Romário foi dispensado por indisciplina do Flamengo, e agora os rubro-negros terão que vê-lo no Maracanã envergando a camisa do rival Vasco da Gama.

Não cronometrei, mas o bate-bola entre Bial e Batista deve ter durado entre dois e três minutos, entremeado por declarações das vestais. As moças estavam excitadíssimas por estar no vídeo da mais poderosa emissora de televisão brasileira, num programa que é visto por pelo menos 50 milhões de telespectadores, falando sobre sexo grupal.

Direto do motel

Contavam a loura e a morena, em resumo, sobre o que até anteontem se chamava "orgia". Não esqueceram até mesmo de narrar que quando o garçom vinha à suíte trazer bebida todos se escondiam atrás das cortinas, embaixo das camas etc. Não se sabe, pois ninguém perguntou, quem pagou a conta. Se foi Romário, com sua conhecida generosidade para agradar aos "peixes" amigos, ou se as moças caxienses e gaúchas ali estavam apenas por amor ao esporte.

Esta matéria foi colocada no ar numa seqüência que já incluiu, há quatro ou cinco edições, a mais descarada divulgação da prostituição num canal aberto de televisão. Responsável pela redação do Fantástico em São Paulo, o onipresente Zeca Camargo fez matéria sobre "motéis" no réveillon de 2000.

Reuniu 4 ou 5 prostitutos masculinos numa cama de motel e ali conduziu sua criativa entrevista, na qual não faltou declaração de um dos entrevistados de que estava com a agenda lotada e com o traje preparado, ou seja, "nu só de camisinha".

Não satisfeito, lá se foi o intrépido Camargo para entrevista com as moças da vida difícil. Com a câmera discretamente passeando por nádegas e pernas, as entrevistadas desfilaram declarações do tipo "quando me jogam na piscina eu fico toda molhadinha" e por aí seguia o diálogo, no qual não faltou a informação sobre preço, especial para o réveillon.

A família dispensa

Consta que a matéria não foi bem assimilada internamente e, como castigo, Camargo ficou fora do ar na edição do domingo seguinte. Para Camargo, que chega a fazer três aparições num único programa, deve ter sido um castigo e tanto!

Domingo, dia 22, sob a desculpa hipócrita de estar mostrando um vídeo que, descoberto pela Globo, levou à prisão de um promotor de baile funk, no Rio de Janeiro, o mesmo Fantástico exibiu (em três domingos) as nádegas de uma jovem que recebeu R$ 20 para tirar a roupa num baile funk.

O patriarca Marinho, seus filhos e netos não assistem provavelmente ao canal da família, porque no horário do Fantástico certamente têm divertimento mais saudável que o lixo mundano que sua rede transformou em acontecimentos cotidianos e naturais.

(*) Jornalista, mestre em Comunicação, professor de Comunicação Social da Universidade de Mogi das Cruzes (SP)