Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Lourdes Sola e Keila Jimenez

HUMOR

"Humor Brasileiro", copyright O Estado de S. Paulo, 12/05/02

"No próximo sábado, A Praça é Nossa vai comemorar 15 anos com uma festa e muitos convidados especiais. O apresentador Ratinho, por exemplo, será o diretor da escola que se surpreenderá com as respostas de Pacífico, personagem de Ronald Golias. Sheila Carvalho, que ataca todos os homens, escolheu Gugu Liberato como sua vítima.

A emissora tem bons motivos para comemorar. É o único programa humorístico que ficou no ar por todo esse tempo com o mesmo formato e no mesmo horário.

Além disso, é a mais antiga atração de humor da TV, criada em 1953 por Manoel de Nóbrega. Chamava-se A Praça da Alegria, mas apresentava a mesma rotina ao público: sentado no banco da praça, Manoel de Nóbrega recebia vários convidados que entraram para a história da televisão. A velha surda do ator Ronie Rios; o Homem de Itu, de Simplício, sem contar os vários tipos de Ronald Golias, que divertem o público até hoje.

Muita coisa mudou desde aqueles tempos. Os episódios agora são gravados e várias falhas podem ser corrigidas nas ilhas de edição. Apesar da competição pela audiência ser importante nos dias de hoje, o diretor Carlos Alberto de Nóbrega, filho do criador da Praça, faz o possível para preservar a emoção dos velhos tempos. ?Muitos artistas afastados por motivos de saúde e que fazem parte dessa história da Praça continuam recebendo salários, em casa?, diz. ?É um compromisso que tenho com meu pai e que só é possível porque o Silvio (Santos) assumiu também?. É o caso de Simplício, de 85 anos. Mora em Itu e tem uma boa assistência do SBT. Fora dos palcos e das telas, recebe seu salário, todos os benefícios e muita atenção de Carlos Alberto, que telefona para ele periodicamente .

Isso não significa que seja um diretor paternalista. Exibe um currículo profissional de quase 50 anos, que inclui outros programas humorísticos de sucesso, como A Família Trapo, na Record, que escrevia com Jô Soares e que foi considerado o programa de maior sucesso da televisão. Passou cerca de 12 anos na Globo, no comando de Os Trapalhões. ?Sou exigente e se o quadro não estiver bom corto. Não vai para o ar?, conta. Lembra-se de um dos dias que teve de cortar um quadro do Golias. ?Foi difícil, mas é minha função garantir a qualidade do programa?.

Outra saia justa foi tirar Dercy Gonçalves de cena. ?Meu público não gosta de palavrão e de nada muito explícito?, diz. A Praça tem cerca de 14 pontos e cerca de 42% do público que assiste ao programa pertence à classe C (ver quadro) Para manter a qualidade, o diretor segue uma rotina rigorosa. Depois de ler os textos, antes das gravações repassa, em seu camarim, as falas de todos os personagens. ?Só depois entramos no estúdio?. Além disso, diz contar com a colaboração de toda a equipe. ?Confesso que a gravação do programa de aniversário foi uma das mais emocionantes da minha vida. Nunca vi tanta gente feliz e em alto astral como naquele dia?, conta.

Concorrência – Carlos Alberto confessa que não é fácil a competição . ?Tenho mais restrição de verbas, sem contar que os programas da Globo sempre contam com convidados superbadalados?, diz. De acordo com ele, alguns figurinos de seu concorrente Zorra Total – o Casseta & Planeta passa às terças-feiras – são mais caros do que um programa inteiro seu. ?Começaram a incomodar quando perceberam o meu filão, que é o humor mais popular?, diz.

É verdade. O diretor Mauricio Sherman orgulha-se de contar que foi o responsável pela volta do clássico programa de humor (com quadros e bordões) à Globo: o Zorra Total. A atração entrou no ar em 1999, recauchutando quadros e reunindo veteranos do humor e jovens talentos. Para ele, tal formato (o mesmo da Praça), é eterno.

Atualmente dirige o Zorra e o Domingão do Faustão. Sherman explica que não há como fugir muito da fórmula: pull de humoristas em quadros que levam à comédia de situação ou aos bordões. Para ele, isso vem desde a época do rádio, o pai da televisão, e deixou o seu maior legado: os humorísticos.

Quando o assunto é a história do humor na TV, narrada em bordões e variações sobre a mesma piada, o diretor Maurício Sherman é outra autoridade. Típico homem de televisão – está nela desde as primeiras transmissões no País – Sherman trabalhou em quase todas as emissoras e é responsável pela criação de humorísticos históricos, como Faça Humor, Não Faça Guerra, Balança Mais Não Cai, Planeta dos Homens, Chico Anysio Show, entre outros.

Descobriu Xuxa, Angélica, fez a primeira versão do Sítio do Picapau Amarelo, dirigiu O Céu É o Limite, mas também revelou talentos da comédia com Agildo Ribeiro, Paulo Silvino e Claúdia Jimenez.

?Nas décadas de 30 e 40 já havia estações AM que apostavam em programas de humor. Foi de lá que vieram atrações como o Balança Mais Não Cai, o mais popular da década de 50?, diz Sherman. ?Naquela época já falavam que o formato era o mesmo e as piadas eram velhas.? Para ele, essa receita sempre dará certo pois, em nenhum lugar do mundo fizeram programas parecidos com a Praça, Zorra, Balança. ?É um humor brasileiro e é disso que o telespectador gosta.?

Sherman explica que é nesse formato que fica mais fácil brincar com os velhos e bons temas de piadas que o público adora: a de sexo, a do caipira e a de suas confusões na cidade grande (que tem como representante atual Nérso da Capitinga), a escatológica, a de político corrupto e das dificuldades financeiras do País. ?Como as coisas não mudam muito aqui, parece que a piada é repetida, mas é a nossa maneira de rir do nosso cotidiano?, fala.

Sherman gostaria de relançar na Globo o Balança Mas Não Cai. ?É um clássico?, avisa."

 

APRESENTADORES

"Mudanças não trazem novidades à TV", copyright O Estado de S. Paulo, 12/05/02

"Poucas vezes se viu uma movimentação como essa na TV. O troca-troca entre apresentadores foi tão grande que houve telespectador que sintonizou um canal pensando que fosse outro. Na verdade, a mudança foi de pessoal e não de programação. Sônia Abrão foi ?falar francamente? no SBT sobre os mesmos assuntos que discursava na Casa é Sua, na Rede TV!, sendo substituída por Leonor Corrêa, que continua na mesma batida da antecessora.

José Luiz Datena largou o Cidade Alerta para Ney Gonçalves Dias na Record e foi vociferar contra os bandidos e policiais desonestos na Rede TV!. Só mudou o nome do programa: hoje atende por Datena Repórter Cidadão.

Marília Gabriela encara de frente um talk show no SBT com a mesma competência que fez dela a melhor entrevistadora do Brasil. Saiu-se bem em dois pontos: tem convidados mais graduados do que os que ?interrogava? na Rede TV! e uma audiência promissora, capaz de resgatar o prestígio comercial da emissora que murchou com a saída de Jô Soares. Estreou com 2 pontos de média no Ibope (na Grande São Paulo) e mais do que a dobrou no programa seguinte.

A mudança também fez bem a Datena, que foi logo encontrado pelo público no novo endereço: pulou de 7 (na estréia) para 10 pontos de média de um dia para o outro. Falando Francamente, o mercado persa que Sônia Abrão ergueu na Via Anhangüera, conseguiu ibope entre 6 e 8 pontos de média no reino de Silvio Santos. Agora é o robusto Gilberto Barros que arruma as malas na Record para também desarrumá-las na Band.

Na verdade, as coisas mudaram para deixar tudo mais ou menos igual, em termos de show, de audiência e de estilo. O que mostra que as emissoras não estão dispostas a correr riscos. Elas sempre estão de olho nas galinhas mais gordas do quintal do vizinho e, quando conseguem fazê-las pular o muro, não exigem mais do que a produção de sempre.

Outra característica comum entre todos os shows hoje – com exceção do de Marília Gabriela – é um certo pendor para o ?jornalismo?. Quarta-feira, por exemplo, quase todos os programas vespertinos gastaram muita saliva, imagens e estupefação para contar a história da empregada doméstica presa por roubar da casa da patroa uma lata de ervilhas, uma cebola e uma cabeça de alho.

O drama da pobre mulher que rouba para dar de comer à família foi explorado ad nauseam. É nesses momentos que a TV pega pesado para valer. Não bastou o depoimento da ?criminosa? para emocionar a platéia. Sem a menor cerimônia, repórteres vasculharam o casebre, remexeram os pertences, abriram armários com o objetivo de pintar com cores ainda mais fortes a miséria da coitada. Um desrespeito para com os mais humildes. Quem já viu tamanha intromissão em casa de gente de classe média?

O noticiário policial que hoje aparece nos mais prosaicos programas femininos está cada vez mais caminhando para esse lado. Ou seja, o da ênfase a dramas humanos e a crimes chocantes. A cena em que um motorista mexicano atropela e mata escolares e a do homem-bomba sendo arrastado pelas ruas por um robô do exército israelense foram reprisadas 500 vezes. Para quê?

Toda vez que o mercado da TV se movimenta, outras coisas também saem fora do lugar. Quando a concorrência acirra, a tendência é copiar os modelos mais bem-sucedidos e radicalizar na receita. Por isso que, a tarde – que há menos de uma década era dedicada às prendas domésticas, conversas sobre menopausa e criação de filho – está se tornando um tenebroso show de horrores."