Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

László Varga

INTERNET

“Tele cria novo provedor de acesso gratuito à internet”, copyright Folha de S. Paulo, 9/09/02

“O fim da febre de empresas de internet e o prejuízo que muitas amargaram parece não ter posto um fim na idéia da internet gratuita. O empresário Sérgio Creimer, ex-executivo do grupo Brasil Telecom, e a operadora de telefonia fixa GVT (Global Village Telecom) inauguram hoje o provedor POP, que concorrerá com empresas como iG e BRfree.

A meta inicial é conquistar usuários de 54 cidades de nove Estados (PR, SC, RS, MT, MS, GO, TO, RO, AC), além do Distrito Federal. A Folha apurou, no entanto, que o provedor negocia acordos para atuar em outras regiões. O Brasil possui hoje cerca de 8 milhões de usuários domésticos de internet. O acesso gratuito tem sido deixado de lado por grupos como a Telefônica, que praticamente desativou o Terra Livre.

A decisão de criar um novo provedor de internet gratuito surpreendeu parte do mercado. Analistas consideram que esse negócio não dá certo, pois não gera receita suficiente. O especialista Jaques Rosenzvaig, da Conectiva, afirmou ontem, no entanto, que o momento é oportuno para esse tipo de empreitada.

Segundo ele, há um excesso de oferta de infra-estrutura para internet, devido à crise nas telecomunicações. ?Quem quiser criar um provedor obtém descontos no uso da infra-estrutura e mesmo na parceria com as operadoras.?

É o caso do POP, que tem a GVT, que é a empresa-espelho da Brasil Telecom, como parceira. Segundo Rosenzvaig, provedores gratuitos podem dar lucro se a empresa conseguir um grande número de clientes e vender os dados para empresas de mailing. Os banners de propaganda também seriam uma fonte de receita.

Procurado ontem pela Folha, Creimer não foi localizado. A criação do provedor coincide com os planos de expansão da GVT, operadora que iniciou as atividades há um ano e meio.

A empresa possui 400 mil linhas fixas e pretende chegar, em dezembro, a 500 mil. Iniciou recentemente contatos com companhias de São Paulo que possuem filiais nas regiões onde atua, a fim de oferecer serviços de transmissão de dados.”

 

TABAGISMO & PROPAGANDA

“Indústria é acusada de ter criança como alvo”, copyright Folha de S. Paulo, 8/09/02

“Treze dias antes de a publicidade de cigarro ter sido banida das TVs no Brasil, o que ocorreu em 1? de janeiro de 2001, a Souza Cruz aceitou retirar do ar uma campanha do cigarro Free que o Ministério Público de Brasília considerou ilegal porque estimularia crianças e adolescentes a fumar. Com o acordo, foram canceladas 240 veiculações do comercial.

Foi a primeira vez no Brasil que um comercial de cigarros saiu do ar por suspeitas de que era dirigido para adolescentes. Nos Estados Unidos, promotores encontraram dezenas de documentos internos da indústria, nos quais executivos diziam abertamente que o alvo da propaganda era o público jovem (leia texto abaixo).

Um dos pontos do acordo de Brasília previa que a análise que embasou a ação do Ministério Público seria mantida em sigilo, mas a Folha teve acesso ao documento. É um laudo do Instituto de Medicina Legal do Distrito Federal, no qual três psicólogos analisam o comercial do Free em que um pintor diz: ?Vejo as coisas assim: certo ou errado, só vou saber depois que eu fiz. Eu não vou passar pela vida sem um arranhão. Eu vou deixar minha marca.?

O promotor que conduziu as investigações e conseguiu tirar o comercial do ar, Guilherme Fernandes Neto, diz que, independentemente de uma análise mais profunda, o texto da campanha é ?absurdo porque prega a irresponsabilidade social?: ?Só o desconhecimento de psicologia comportamental e a falta de compromisso com a função social da publicidade podem justificar um comercial dirigido para adolescentes?.

A análise psicológica é dividida em duas partes: o conteúdo visível e o que os psicólogos chamam de ?mensagem subliminar?.

Os psicólogos avaliam que o diálogo tem ?algo de irresponsável? -?parece não haver também preocupação com as consequências de sua decisão?.

Propaganda subliminar

Ao decompor o anúncio quadro a quadro, os psicólogos encontraram o que consideram ser ?propaganda subliminar?. Na definição deles, propaganda sublimar é ?qualquer estímulo realizado abaixo do limiar da consciência, que produz efeitos na atividade psíquica e mental do indivíduo?. As mensagens subliminares são ?remetidas automaticamente ao nosso cérebro, em nível involuntário, inconsciente?.

Por três décimos de segundo, ou seja, numa fração de tempo imperceptível para os olhos humanos, aparece uma mulher fumando. Logo em seguida, também por três décimos de segundo, aparece outra pessoa fumando.

Se os eventuais efeitos da chamada propaganda sublimar são cada vez mais questionados, a dúvida de Fernandes Neto não é desprezível: ?Por que a Souza Cruz incluiu no comercial imagens que não dá para ver? Certamente, há alguma razão para isso?.

A Souza Cruz alega que a responsabilidade sobre o comercial é das diretoras do filme, Daniela Thomas e Carolina Jabor. Daniela, porém, afirma não se lembrar dessa imagem e diz que, se ela existir, teria a função de dar ritmo às imagens.

A Adesf (Associação em Defesa da Saúde do Fumante) acha que o Ministério Público pegou um peixe grande. Luiz Mônaco, diretor jurídico da entidade que processa as fábricas por fraude contra a saúde pública, diz que o comercial ?é a primeira prova inconteste de que a indústria dirigia sua publicidade para adolescentes?.”

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“Empresa nega responsabilidade sobre anúncios”, copyright Folha de S. Paulo, 8/09/02

“A Souza Cruz não quis comentar se há ou não mensagem subliminar no comercial do cigarro Free, como acusa o Ministério Público de Brasília. A empresa insiste em afirmar que a responsabilidade do comercial é da diretora Daniela Thomas, contratada pela empresa para a execução do filme.

A fábrica de cigarros alega que não fez nenhum acordo com o Ministério Público de Brasília sobre os comerciais do Free. Diz que aceitou retirar as campanhas até que fossem esclarecidas as dúvidas sobre a suposta mensagem subliminar e a acusação de que seria dirigida a adolescentes.

Em nota enviada à Folha, a empresa diz que apresentou dois pareceres de psiquiatras contestando a hipótese dos promotores.

A reportagem da Folha solicitou cópias dos pareceres à Souza Cruz, mas a companhia negou, alegando que são peças sigilosas, feitas exclusivamente para a disputa jurídica.

Os psiquiatras, de acordo com informações da companhia, concluíram que não há mensagem subliminar na campanha do Free e que o filme não fere a legislação que proíbe publicidade de cigarro para menores de 18 anos.”

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“?Comercial é só um clipe para vender cigarro?”, copyright Folha de S. Paulo, 8/09/02

“A diretora Daniela Thomas ri quando ouve falar de mensagem subliminar, de imagens que duram três décimos de segundo no comercial do cigarro Free que ela dirigiu com Carolina Jabor.

?Imagina, colocar imagens para hipnotizar alguém… Isso é mentalidade de quinta, coisa de ?Big Brother?. Parece Arquivo X. Soa teoria conspiratória. Parece coisa de nerd, que vê segundas intenções em tudo. É só um clip para vender cigarro?, fala, em ritmo de metralhadora.

Daniela -uma das mais importantes cenógrafas do país e co-diretora do filme ?Terra Estrangeira?, com Walter Salles- diz ter orgulho de a publicidade de cigarro ter sido banida da TV no Brasil. ?Acho uma conquista. Coisas danosas à saúde têm de estar fora da TV?, diz, citando as campanhas de cerveja como exemplo do que deveria ser uma preocupação futura.

Mas classifica como ?um exercício de futilidade? o fato de o Ministério Público estar prestes a abrir um processo contra um comercial que já não é mais exibido.

Segundo Daniela, todas as campanhas do Free que ela dirigiu (a primeira delas foi em 1992) respeitam a legislação brasileira. ?A lei, na época, talvez fosse altamente liberal, mas era a lei vigente.?

A acusação do Ministério Público de que há mensagens subliminares no comercial do Free deriva, na opinião de Daniela, de um profundo desconhecimento dos bastidores da publicidade.

?Jamais ouvi, em qualquer instância da publicidade brasileira, a menor menção a mensagem subliminar. Isso é fantasia em alto grau?, defende.

Diz ter recebido só uma orientação da Souza Cruz: não fazer nada que ferisse a lei. De resto, diz, havia liberdade total de criação.

A diretora diz que nem se lembra de imagens de três décimos de segundo, que denotariam mensagem subliminar, na interpretação do Ministério Público: ?Se é que tem imagem com essa duração, a única conotação dela é dar ritmo ao comercial. Isso é muito usado em videoclipe, e o comercial do Free usava essa linguagem. É só um clipe para vender cigarro. Não há esse grau de manipulação que o Ministério Público viu em comerciais de cigarro?.”

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“Texto revela interesse em atrair jovens”, copyright Folha de S. Paulo, 8/09/02

“A frase a seguir não é uma piada: ?Nós não temos interesse no mercado de menores de 18 anos apesar de o documento que eu estou segurando afirmar isso?.

Ela foi dita por James Morgan, ex-presidente da Philip Morris nos Estados Unidos, em setembro de 1997, e está entre os documentos que a indústria teve de tornar públicos depois de sofrer um processo de promotorias estaduais que resultou no pagamento de uma indenização de US$ 250 bilhões, a maior da história.

As fábricas terão de pagar esse valor em 25 anos por terem fraudado a saúde pública, negando, de forma premeditada e orquestrada, que o cigarro causasse câncer e outros males, segundo acordo assinado em 1998.

São fartos os documentos que mostram que a indústria do tabaco sempre alvejou o público de menores de 18 anos.

?O adolescente de hoje é o potencial consumidor de amanhã (…). Os padrões de consumo de cigarro dos adolescentes são particularmente importantes para a Philip Morris?, escreveu o pesquisador Myron E. Johnson num memorando enviado ao vice-presidente de pesquisa e desenvolvimento, Robert Seligman, em 1981.

A Lorillard, quarto maior fabricante de cigarro dos Estados Unidos, é ainda mais direta: ?A base do nosso negócio são os estudantes de ?high school?, afirma um memorando de 1978, referindo-se ao período equivalente ao ensino médio brasileiro.

O cerco aos adolescentes tem um motivo óbvio: a indústria precisa renovar constantemente seu mercado porque os consumidores mais velhos ou abandonam o vício ou morrem.

Os números mostram que a estratégia de associar cigarro a esporte, sexo e sucesso é bem-sucedida. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, 3.000 crianças começam a fumar todo dia no mundo, e um terço delas morrerá prematuramente.

No Brasil, os dados estatísticos são escassos e, ao mesmo tempo, chocantes. O país tem 1,9 milhão de fumantes entre 5 e 19 anos, de acordo com dados do Inca (Instituto Nacional de Câncer). Na área rural, há 30.531 fumantes com menos de 10 anos.”