Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Luiz Maklouf Carvalho


CASO MATARAZZO

“Juiz condena a Globo por divulgar seqüestro”, copyright Jornal do Brasil, 24/08/01

“Em sentença de primeira instância, o juiz Teodozio de Souza Lopes, da 17? Vara Cível da Capital, condenou a TV Globo em ação de indenização por danos morais por ter noticiado o seqüestro em andamento de Luiz André Matarazzo e seu filho menor, ocorrido em 6 de março do ano passado. A sentença foi proferida em 28 de março último. A TV Globo recorreu à segunda instância, o Tribunal de Justiça de São Paulo, onde o processo continua tramitando. ”A Globo não se pronuncia enquanto o caso estiver em andamento”, diz o jornalista Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação.

A sentença afirma que a TV Globo ”agiu com dolo ao divulgar o seqüestro contra o pedido da família, ”e colocou em risco a vida da criança, também de forma dolosa”. O valor da indenização, a ser apurado por um perito, será ”correspondente ao mesmo tempo utilizado na divulgação dos fatos, seja no Jornal Nacional, seja nos outros noticiários da mesma ré, segundo a sentença. O advogado dos autores, Manuel Alceu Affonso Ferreira, recorreu da indenização para majorá-la, por considerá-la liliputiana (pequeníssima) se confrontada à pujança da gigantesca organização jornalística. O recurso também pede a divulgação da sentença condenatória no Jornal Hoje (uma vez) e no Jornal Nacional (duas vezes), não contemplada na sentença de primeira instância.

Luiz Matarazzo e seu filho foram seqüestrados em uma rodovia de Indaiatuba, dentro de um carro e sem documentos pessoais. Combinaram, no primeiro cativeiro, que não declinariam o nome Matarazzo, famoso, para não aumentar a pressão e o valor do resgate. Fixado em R$ 100 mil, os seqüestradores resolveram que Luiz seria libertado para providenciar o pagamento. Seu filho ficou no cativeiro, como garantia. Detalhe singular, relatado na inicial de Manuel Alceu: pouco antes de Luiz ser libertado, chegou ao cativeiro um outro seqüestrado, o engenheiro Saul Celso Augusto, ”cometendo-se então a Luiz a incumbência de, além do montante ligado a seu filho, também diligenciar o pagamento de outros R$ 100 mil, referentes ao novo encarcerado”.

Sobrenome- Antes de ser libertado, em 7 de março, Luiz combinou com o filho que mantivesse o sobrenome Lara, escondendo o Matarazzo. Levou um tiro na perna, para que sangrasse e impressionasse a família, e foi fazer o que tinha que fazer. Soube, então, no dia 8, que o Jornal Hoje noticiara o fato e os nomes das vítimas, citando que Luiz era ”primo do senador Eduardo Suplicy e do secretário de Comunicação do Governo, Andrea Matarazzo.

Temendo que os seqüestradores descobrissem o Matarazzo, Luiz tentou evitar que a TV Globo voltasse ao assunto no Jornal Nacional, de maior repercussão. Acionou amigos e parentes com acesso ao então chefe de jornalismo da emissora, Evandro Carlos de Andrade, recentemente falecido.

Falaram com Evandro, pedindo o silêncio, a então deputada federal Marta Suplicy, o diretor Jayme Monjardim, os empresários Antônio Maria Ulrich e João Pedro Gouvea Vieira, o publicitário Daniel Barbará e o diretor do Banco Itaú, Fernando Macias. Evandro manteve a decisão de noticiar o seqüestro, conseguindo que o repórter Roberto Cabrini entrevistasse Luiz. A notícia, a entrevista e o Matarazzo foram ao ar no Jornal Nacional do dia 8.

Torturado- Luiz afirma, na inicial de Ferreira, que ”naquela mesma noite, logo após a espetaculosa reportagem do Jornal Nacional, os bandidos quiseram que o filho de Luiz, no cativeiro, confirmasse ser um Matarazzo. Sem saber que o nome havia sido divulgado, o garoto manteve o Lara, o que bastou, segundo o advogado, ”para que os brutamontes, torturando-o, deixassem-no sem água e alimentação até o dia seguinte, quando então, exausto, o pequeno confessaria o patronímico (sobrenome) que a ré trombeteara”.

A TV Globo frisou, na contestação a Ferreira, que ”o resgate não foi aumentado”, o que é fato, e que ”o crime teve um desfecho pacífico”. O advogado Luiz de Camargo Aranha Neto, que defende a TV Globo, argui que ”a ré não se afastou dos limites da liberdade da manifestação que lhe é constitucionalmente assegurado”. Quando divulgou a libertação de pai e filho, em 10 de março do ano passado, o Jornal Nacional, dirigido por Evandro, manteve a defesa do direito de noticiar. ”Seria injusto dar tratamento diferenciado às famílias baseado na sua classe social e nas suas relações com a imprensa”, afirmava o editorial. O juiz diz, na sentença, que ”a atitude dolosa da ré desrespeitou a lei, descumpriu a Constituição quanto à inviolabilidade do direito à vida, expôs de forma irresponsável e dolosa a vida de uma criança que estava em cativeiro e desrespeitou o direito à intimidade da família e da criança, que não queriam seus nomes divulgados.”

    
    
                     

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