Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Marcelo Camacho

QUALIDADE NA TV

ASPAS

SEM PIADA PARA SANDY

"A intocável global", copyright Veja, 24/04/01

"Quem diria, a irreverência da turma do Casseta & Planeta, Urgente! tem limite: a virgindade da cantora e, digamos, atriz Sandy. Há duas semanas, a protagonista da novela Estrela-Guia seria alvo de uma paródia intitulada Estrela Virgem – cujo mote era, claro, a tão propalada castidade da moça. O quadro, porém, foi criticado pela central de controle de qualidade da Rede Globo. Motivo: pegava pesado demais. O time do Casseta & Planeta concordou com os argumentos levantados e resolveu engavetar a brincadeira, que já tinha sido gravada. Comandada pelo executivo Mário Lúcio Vaz, a central analisa todos os programas, menos os jornalísticos, antes de eles irem ao ar. Sua função é detectar desde falhas simples, como uma seqüência mal iluminada, até problemas mais sérios – por exemplo, cenas ou programas que firam a ética ou os interesses institucionais da emissora. Em geral, esse crivo é exercido ainda na fase de roteiro. Mas o Casseta & Planeta gosta de manter sua temperatura alta, acompanhando de perto os acontecimentos do noticiário. Por isso, não é raro que os quadros sejam gravados em cima da hora – e, portanto, que só sejam analisados quando já estão prontos para ir ao ar. Foi o que aconteceu com o esquete que troçava de Sandy.

Nesse caso, a questão era ética. As piadas poderiam ofender uma colega – e também uma grande estrela, com direito a tratamento especial na Globo. A turma do Casseta, que até então não poupava ninguém de seus escrachos, obedeceu sem maiores traumas. Sempre que surge uma diferença, a central procura solucioná-la com diálogo. Se não há consenso, Vaz dá a palavra final. Havia mais de quatro anos, porém, que um quadro do Casseta & Planeta não era banido. Com Sandy poupada, sobrou ironia para Guilherme Fontes, seu par na novela. O ator-diretor até hoje não fechou as contas de seu filme inacabado, Chatô – O Rei do Brasil, sobre o magnata Assis Chateaubriand. No programa, Fontes (representado por Bussunda) pede um filé à Chateaubriand. O prato vem só com batatas. Diz o garçom: ?A verba acabou. Não deu para comprar a carne?. O ator ficou tiririca com a piada. Mas, como a desculpa do orçamento é do próprio Fontes, o pessoal responsável pela qualidade da emissora não interferiu."

NOVO CANAL

"Shop Tour vai virar rede de televisão aberta", copyright O Estado de S. Paulo, 19/04/01

"O canal de vendas Shop Tour anunciará, ainda esta semana, que virou emissora de televisão, com capacidade para a transmissão do seu programa de ofertas de varejo em rede nacional, inclusive com programação local para os Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás.

O empresário Luiz Antônio Galebe, de 46 anos, está atuando, por enquanto com muita discrição, nos testes do canal de TV aberta 46+ – é UHF mas se converte automaticamente para VHF nos televisores, ou seja, é possível ligar o aparelho e ver os testes – do qual tem a licença do governo.

O investimento no projeto da nova rede de televisão do País é de modestos R$ 5 milhões perante um faturamento de R$ 36 milhões do Shop Tour no ano passado. Mas Galebe ressalva que tem ?equipamentos de última geração, ilhas de edição moderníssimas e pessoal treinado para tornar a programação um sucesso de público.?

Geradora – As imagens a serem transmitidas pelo canal 46+ UHF serão geradas na pequena cidade gaúcha de Cachoeira do Sul.

Galebe adquiriu essa geradora de televisão, primeiro, para depois pleitear do governo a concessão de um canal em São Paulo, há dois anos. O motivo da compra da TV Cachoeira do Sul foi simples: ele estava preocupado em ficar nas mãos de uma emissora, o canal 16 também UHF da antiga TV Jovem Pan, hoje Canal Brasileiro de Informação (CBI), com suas 21 horas de programação.

?Em meados de 1995, o bispo Edir Macedo comprou a TV Record e disse que não queria mais vender espaço para nossa programação, tivemos que procurar outra emissora?, relembra e diz: ?Foi um grande desafio porque saímos da Record para ir para a desconhecida TV Jovem Pan.?

O que poderia, no entanto, ser obstáculo para Galebe foi, na realidade, um novo teste. ?Tivemos que acionar um serviço de telemarketing, fazendo 500 mil ligações telefônicas para avisar o público que o programa seria transmitido no canal 16.? Deu resultado e Galebe descobriu que poderia adicionar o telemarketing ao projeto do Shop Tour.

O programa virou, assim, uma pequena máquina de fazer dinheiro, atraindo lojistas que passam longe das agências de publicidade e nem têm como pagar por comercial nas emissoras de televisão tradicionais.

É justamente esse lojista que Galebe quer conquistar em outras regiões do País. Para isso, contratou gente de tecnologia que deixou a TV Globo depois de 30 anos de experiência e convivia com uma aposentadoria incômoda. A esse grupo somou executivos de primeiro time que se aposentaram de multinacionais, como Luiz Eduardo Carrara, durante 17 anos na Pirelli, além da assessoria de Peter Seelig, respeitado consultor.

Galebe sequer faz segredo do chamado pulo do gato, que permitirá que o Shop Tour se transforme em rede de televisão. ?O segredo são acordos que iremos fazer com as emissoras de televisão a cabo – são 250 em todo o País – oferecendo 20% do faturamento do programa na região em que está situada.?

Para essa emissora, bastará ceder o sinal que, por meio de um ?duet? em São Paulo, passará a receber imagens do Shop Tour, que na versão para outros Estados passará a ser chamado de Local Shop. E como fazer isso? Galebe ofertará 30% às agências de publicidade das cidades incluídas na programação para que corram atrás dos lojistais locais e gravem as entrevistas mantendo o padrão do Shop Tour. O material será editado em São Paulo e transmitido para essas regiões. ?Vamos injetar recursos em outras praças e assim garantir nossa presença?, diz com o sorriso largo de quem sairá ganhando 50% nessa transação.

Como surgiu a pequena máquina de fazer dinheiro de Luiz Galebe

O desejo de aparecer e a vontade de ganhar dinheiro levaram o paulista Luiz Antonio Galebe a criar, em 1987, um dos programas comerciais de maior sucesso da televisão brasileira. O empresário conta, sem esconder, que procurou um amigo, que tinha uma loja nos Jardins, e propôs que este pagasse o aluguel de uma câmera para pôr no ar as ofertas de sua loja. ?Ele ficou uma fera, pois estavámos no fim do cruzado, com ele estocado e sem vender nada, reclamando que venderia até pelo preço que pagou para se livrar daqueles produtos?, relembra Galebe. Como o horário da madrugada da TV Record já estava comprado, Galebe decidiu numa sexta-feira jogar no ar daquele jeito mesmo. Na segunda-feira, esse meu amigo encontrou fila na porta atrás das ofertas a preço de custo.

Não deu outra, vários comerciantes da região dos Jardins, um dos bairros sofisticados de São Paulo, procuraram Galebe para fazer o mesmo. ?A maioria queria naquele momento se livrar de estoques?, relembra ele, numa elegante casa na Cidade Jardim, transformada em escritório, enquanto um prédio novo, onde porá o letreiro da nova emissora de televisão do País, não fica pronto.

Assim, o Shop Tour ganhou personalidade e nome. ?Transmiti ao consumidor o que ele queria ouvir, ofertas e descontos com desafio aos lojistas para venderem barato.?

De uma hora de programação, o Shop Tour foi passando para duas, até chegar, hoje, a 21 horas diárias. O segredo? Vender horário barato, dar um giro na loja e transformar o dono ou gerente em estrela do comercial, responde Galebe sem pestanejar. ?O público quer ofertas, isso em qualquer lugar.? Com o crescimento do programa, Galebe foi deixando um pouco de aparecer, abrindo espaço para outros. ?Estava estafado e não dava mais para fazer tudo.?

Depois, lamenta, começou a ser imitado em outros canais. Não teve dúvidas, entrou com processo por direito autoral contra aqueles que seguiram seus passos. Por isso, diz, agora que está criando a sua emissora e é obrigado, por lei, a ter programação jornalística, está pagando direito autoral por projeto de um jornalístico concebido pelo diretor-executivo do SBT Repórter, Dante Matiussi. A idéia é mostrar uma banca de jornal, comentando as notícias do dia com os autores das reportagens, sejam elas de revista ou jornal. Claro, um programa que pode conseguir ter um nível alto e um custo baixo. Só que a vaidade não será a do lojista que vende o seu peixe, mas a do jornalista. ?Tem tudo para dar certo?, diz um Galebe, feliz de adentrar no clube dos empresários de televisão aberta liderado por Roberto Marinho e Silvio Santos."

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