Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Marcelo Coelho

ELEIÇÕES 2002

"Técnicos, jornalistas e marqueteiros", copyright Folha de S. Paulo, 24/08/02

"Demorei um tempo para aprender que a Embratel era o 21. Depois veio a Intelig, que é 23, eu acho, mas saber que o camisa 23 na seleção brasileira é o atacante Kaká, e que esse também é o número de Ciro Gomes na eleição, aí também é exagero.

Havia algo de excessivamente montado e artificial na cena do jogador entregando a camisa 23 para Ciro, antes do jogo com o Paraguai. O Brasil perdeu, e a caprichada cena fotográfica terminou tendo efeito indesejado. ?Pé-frio?, cutucou a Folha. ?Seleção apóia Ciro e apanha do Paraguai?, disse o jornal Agora.

É provável que o leitor identifique nessas palavras o velho e bom espírito de porco dos jornalistas. Até mesmo os cronistas esportivos, mais suspeitos de passionalidade do que de malevolência, foram acusados nesta última Copa de torcerem contra o Brasil. Não havia espírito de porco contra o Brasil neste amistoso, mas sem dúvida houve prazer com o malogro do pequeno circo canarinho em torno de Ciro.

Há eleições em que tudo parece ser uma questão do Bem contra o Mal. Não tem sido esta a interpretação predominante, a meu ver, da disputa entre Lula, Serra, Ciro e Garotinho. Cada candidato tem seu pé na sombra, e mesmo se vangloria da impureza de suas alianças. Apontar contradições, incoerências, não cola muito se o candidato quer justamente dizer que mudou, que é tolerante, conciliador etc.

O tropeço com a camisa da seleção atendeu, creio, a uma demanda reprimida da imprensa. Minha impressão é que estas eleições, mais do que as anteriores, trazem consigo um embate corporativo, um jogo de rivalidades profissionais, que é subterrâneo e talvez prévio ao confronto dos candidatos.

A rivalidade, aqui, é entre entre jornalistas e marqueteiros. Nenhum candidato nestas eleições presidenciais é tão odiado quanto o foram Fernando Collor ou Paulo Maluf em outras épocas; nenhum candidato é tão rejeitado, talvez, quanto o são Duda Mendonça, Nizan Guanaes ou Nelson Biondi. Precisam inventar, quem sabe, um marqueteiro de marqueteiros.

O profissional do marketing, interessado em maquiar a verdade, é inimigo do jornalista, que quer -não digo descobrir a verdade sempre, mas pelo menos destruir a maquiagem.

O encontro de Ciro com a seleção ganha outras dimensões, aliás, dado o forte componente ?elitista?, ?técnico?, cientificista, da sua candidatura. O que Ciro tem de estourado não significa necessariamente algo de emocional; ele se irrita friamente e está pronto a desfiar números e argumentos técnicos.

Usar o futebol, nessas circunstâncias (o mesmo valeria para Serra), tem algo de inadequado.

De resto, a Copa do Mundo não produziu garotos-propaganda de boa qualidade. O mais bem-sucedido é Felipão. Tem a imagem do sujeito combatido e antipático, mas que chega lá, que é vitorioso, graças a…

Fico em dúvida. Graças a quê? À decisão de não convocar Romário? Ao seu comportamento turrão? À sua capacidade de não se importar com as críticas que recebeu? Talvez o sucesso de Scolari como garoto-propaganda se explique por outra coisa: é que sua atuação como técnico não teve nada de marqueteiro.

Ele vira garoto-propaganda por ser o tipo do sujeito que não faz propaganda de nada; daí sua credibilidade.

É a personagem-sonho de todo jornalista; coisa que nenhum candidato está disposto a ser neste momento."

 

"Horário eleitoral derruba Ibope ", copyright Folha de S. Paulo, 22/08/02

"A ?novela? protagonizada por Lula, Ciro, Serra e Garotinho no horário eleitoral derrubou o ibope das emissoras de televisão. Quando a propaganda política estreou, na terça-feira, os canais perderam audiência em 952 mil domicílios na Grande São Paulo.

Na véspera do primeiro capítulo da saga eleitoral, os canais da TV aberta somaram 72 pontos de audiência, das 20h30 às 21h20 (horário cedido à propaganda política). Na terça, o ibope caiu para 52 pontos, mesmo com as fortes cenas da estréia, em que Serra mostrou um vídeo de Ciro chamando um eleitor de ?burro?. Cada ponto equivale a 47,6 mil domicílios na Grande SP, o que representa a queda de 952 mil casas.

Quando a trama mudou de ?personagens?, na quarta, com Maluf e cia., o ibope subiu um pouco, para 52. Mas, na quinta, no segundo capítulo da ?novela? dos presidenciáveis, caiu para 47.

Na edição da tarde, das 13h às 13h50, quando o número de TVs ligadas é menor que no horário nobre, as emissoras abertas perderam audiência em 618,8 mil domicílios na Grande São Paulo.

Antes da estréia, na segunda-feira, registraram 39 pontos no Ibope. Na terça, com o horário político dos presidenciáveis, a audiência caiu para 26. Na quarta-feira, com candidatos ao governo, o número se manteve, mas a continuação da ?novela? do Planalto, na quinta, chegou a 22 pontos.

Os políticos também estão prejudicando a programação normal. ?Esperança? (novela das oito da Globo), por exemplo, caiu de 46 pontos de média, na segunda-feira, para 39 na terça, quando foi exibida após o horário eleitoral.

Além da perda de audiência, o perfil dos telespectadores também mudou com a propaganda política. À noite, as mulheres -público mais forte das novelas- passaram a ver menos TV e os homens mostraram mais interesse pelo ?enredo? das eleições.

A porcentagem de telespectadoras passou de 60,3 (na segunda) para 58,4 (terça) e a de telespectadores, de 39,7 para 41,6.

A classe AB, com maior acesso à TV paga, foi a que mais fugiu dos políticos, percentualmente. Sua participação na audiência do horário reduziu. A presença da classe C subiu, e a da DE não mudou.

Nas próximas semanas, a tendência é que o ibope dos políticos caia mais. Só deve subir com a emoção dos capítulos finais."

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"Agora, Favela FM tem até entrevista com presidenciáveis", copyright Folha de S. Paulo, 21/08/02

"A polêmica Favela FM é o tema do filme ?Uma Onda no Ar?, que estréia no dia 6 de setembro em São Paulo, trazendo de volta aos holofotes a discussão sobre estações ilegais.

Antes de mais nada, é bom que se diga: o longa, de Helvécio Ratton, é mais obrigatório a fãs de rádio do que a cinéfilos. Premiado em Gramado, na semana passada, não escapa de clichês. Mas isso, pelo menos aqui, é o de menos. O que importa é que lá está a história, em tom documental, de uma estação que irradiou seus primeiros sinais direto do Aglomerado da Serra, a maior favela de Belo Horizonte, no fim dos anos 70.

Em pleno regime militar, jovens tiraram do ar a ?Voz do Brasil? para transmitir, ilegalmente, programas feitos por e para moradores da região.

O que torna a trajetória dessa rádio diferente da de tantas outras é que ela, apesar de ter sido fechada várias vezes, nunca saiu do ar definitivamente. E está entre as mais ouvidas da cidade. O filme termina contando que a Favela FM, reconhecida por seu trabalho social, recebeu em 2000 uma concessão de Pimenta da Veiga, então ministro das Comunicações.

É o fim do romance de Ratton, mas o início de um debate político, que Misael dos Santos, fundador da rádio, joga no ar.

Ponto um: ?O governo só deu a concessão porque foi obrigado. A Justiça me condenou oito vezes. Viu que não adiantava e obrigou o governo a regularizar a rádio?. E aí Pimenta da Veiga, que deu a Minas -seu reduto eleitoral- o maior número de concessão de rádios, subiu no morro, cercado pela imprensa, para entregar a autorização nas mãos de Santos.

Ponto dois: ?Hoje temos verba do governo. Antes, o governo pagava anúncio num dia e mandava fechar a rádio no outro?.

Ponto três: ?Agora, todo mundo quer aparecer. Já marquei entrevista com os presidenciáveis. Minas é importante para ganhar a eleição, e ninguém ganha aqui se não passar pela Favela FM?.

Ponto final: alguém tem alguma dúvida de que toda a discussão sobre rádio -favelas FMs, comunitárias, e seja o que Deus quiser- está, como sempre, a milhas das preocupações de qualquer um que assuma o governo?

Políticos desolados: Paulo Barboza, que comandava um dos palanques de maior audiência do dial, na Record AM, foi demitido. Um bispo da Igreja Universal do Reino de Deus entrou em seu lugar. É mais uma demonstração dos rumos que a nova direção da Rede Record pretende dar. À rádio e à TV."

 

"Globo quer ?arena? no debate do 2? turno", copyright Folha de S. Paulo, 24/08/02

"Em reunião com assessores dos quatro principais candidatos ao Planalto, a TV Globo propôs que seu debate de segundo turno, em 24 de outubro, seja feito em formato de ?arena?. No centro dela, os dois finalistas responderão perguntas de eleitores na platéia.

O modelo, um dos três utilizados nas eleições norte-americanas, prevê que um instituto de pesquisas selecione um grupo de indecisos. O perfil do conjunto deve evitar favorecimento a um dos lados.

A Globo pretende escolher o instituto em comum acordo com as equipes dos presidenciáveis e chamar até cem eleitores. Se a proposta for aceita, será o primeiro debate com essas características em eleições brasileiras.

Para o encontro do primeiro turno, a ser realizado em 3 de outubro, a emissora planeja cinco blocos. Em dois, candidato faz pergunta de tema livre para adversário de sua escolha.

Em outros dois, o mediador sorteia o tema da pergunta e quem a fará. O candidato sorteado formula a questão e indica quem vai respondê-la.

Nos quatro blocos haverá réplica e tréplica. Depois da tréplica, o moderador, que será William Bonner, poderá pedir esclarecimentos adicionais aos dois candidatos envolvidos na questão.

Segundo a Folha apurou, a Globo frisou, na reunião de ontem, que nessa intervenção o mediador não emitirá juízo de valor sobre o que disseram os candidatos. A idéia, segundo a emissora, seria obter complementos objetivos para pontos não-esclarecidos. Haverá ainda um bloco para considerações finais dos candidatos.

O programa irá ao por volta das 22h15 -debates anteriores da emissora não costumavam ocorrer antes de 23h. Entrará depois da novela ?Esperança?, que por sua vez será exibida após o último horário eleitoral gratuito.

Ouvidos após o encontro, assessores de três candidatos manifestaram aprovação, em linhas gerais, ao que foi proposto, inclusive o formato inovador para o encontro do segundo turno.

?Preciso ouvir o Ciro, mas em princípio me parece viável e interessante?, afirmou Einhart Jacome da Paz, publicitário responsável pela campanha do PPS.

?Por nós, OK?, disse Nelson Biondi, publicitário de José Serra (PSDB). Para Carlos Rayel, coordenadores de comunicação de Anthony Garotinho (PSB), a proposta ?deve vingar?.

A Folha tentou, sem sucesso, ouvir Duda Mendonça, marqueteiro da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)."