Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Marcio Moreira Alves

ELEIÇÃO 2002

“Efeito Tostines”, copyright O Globo, 29/7/02

“Os estrategistas de campanhas políticas falam do ?efeito Tostines? das pesquisas de intenção de voto. A propaganda do biscoito coloca uma pergunta difícil de se responder: Tostines vende mais por ser fresquinho ou é fresquinho porque vende mais? Um candidato sobe porque está na frente ou está na frente porque sobe? E, aí, caímos em outra pergunta: pesquisas influenciam o eleitor?

Todas as semanas, até as eleições de 6 de outubro, teremos pesquisas do Ibope, contratadas pela Rede Globo. Essas serão as pesquisas mais divulgadas no país, não só porque a audiência do ?Jornal Nacional?, em que serão anunciadas, é muito maior do que a dos demais programas de informação, como porque serão repercutidas pela imprensa escrita, pelos noticiários das demais redes de televisão e pelos programas de rádio. Como os resultados de cada candidato serão comparados com os das semanas anteriores, permitindo a confecção de gráficos, ficará ainda evidente a evolução de cada um, descendo ou subindo.

Ao fim de cada eleição, é costume que candidatos ou partidos perdedores acusem os institutos de pesquisa de terem sido pagos para fazerem avaliações erradas sobre as intenções de votos que os beneficiariam. Berram, protestam, ameaçam constituir comissões parlamentares de inquérito, mas não tomam iniciativas nos únicos locais onde elas poderiam ter algum efeito, que são os tribunais da Justiça Eleitoral. A única exceção de que consigo me lembrar foi a da eleição na Bahia para o Senado, em 1988. Nela, a vitória de Antonio Carlos Magalhães, em todas as regiões do estado, foi indiscutível. No entanto, em algumas urnas, houve uma inversão de resultados: seu companheiro de chapa, Waldeck Ornélas, teve mais votos que o velho soba. Conseguiu, com isso, uma pequena vantagem sobre Waldir Pires. Matematicamente, esse resultado era impossível. Waldir requereu a recontagem dos votos dessas urnas, o que lhe foi negado pelo Tribunal Regional Eleitoral. O TSE, em Brasília, ordenou duas vezes a recontagem, que não foi feita. Ornélas foi diplomado, empossado e cumpre o mandato até o fim. Waldir teve de se contentar em conquistar um mandato de deputado federal nas eleições seguintes, que cumpriu com o brilho que lhe é habitual. As pesquisas tiveram menos influência sobre o resultado do que o histórico sistema coronelista do estado e a influência do Executivo sobre o Judiciário.

Prepara-se agora uma contestação prévia dos resultados eleitorais. Um grupo de brizolistas, apoiado por técnicos, alega que elas serão fraudadas em benefício do governo, porque o sistema criptográfico das urnas foi elaborado pela Abin, sucessora do SNI, instrumento de repressão do regime militar. Os ministros do TSE, embora convencidos da segurança do sistema informatizado que o Brasil adota, resolveram colocar impressoras num número razoavelmente grande de urnas, para que os resultados eletrônicos possam ser comparados com os impressos.

Voltando à influência das pesquisas sobre o eleitorado, não existem estudos científicos sobre o assunto, nem nos Estados Unidos e na Inglaterra, onde foi mais estudado. Alberto Carlos Almeida, estatístico e cientista político, professor da Universidade Federal Fluminense, aborda o tema sem chegar a resultados definitivos no seu livro ?Como são feitas as pesquisas eleitorais de opinião?, publicado pelo Fundação Getúlio Vargas. Citando estudos de três eleições na Inglaterra, em 1979, 1983 e 1987, diz que os percentuais de eleitores que tomaram conhecimento dos resultados de pesquisas foi muito alto: respectivamente, 68%, 67% e 74%. No entanto, o percentual dos eleitores que disseram terem sido por elas influenciados foi de apenas 4%, 4% e 9%.

Escreve o professor:

?A influência das pesquisas na decisão do eleitor não é algo a ser suposto, e sim provado. Primeiro, o eleitor tem de ter acesso aos resultados das pesquisas e não duvidar da sua veracidade. Em seguida, no balanço das informações recebidas durante a campanha eleitoral, ele tem de considerar a pesquisa como mais importante do que outras informações substantivas que orientam seu julgamento de valor sobre os candidatos e os partidos. As alternativas são: considerar as pesquisas tão importantes como as demais informações, sem saber o peso relativo de cada uma; ou supor um eleitor completamente indiferente em relação a uma ou mais candidaturas, tomando a decisão orientado pelas chances depreendidas a partir do resultado das pesquisas.?

Ou seja: praticamente elimina a influência das pesquisas. Não é, no entanto, o que fazem os que têm interesses materiais nos resultados eleitorais, como empresas e contribuintes. Essa a razão de ter chovido dinheiro na campanha de Fernando Collor e agora, provavelmente, na de Ciro Gomes.”

 

“FFHH vai deixar saudades, e não serão poucas”, copyright Folha de S. Paulo, 28/7/02

“Aqui vão, por ordem cronológica, quatro episódios ocorridos neste mês, envolvendo Ciro Gomes, Lula e jornalistas.

1) Ciro Gomes deu uma entrevista aos repórteres Expedito Filho, Gerson Camarotti e Ronald Freitas, da revista ?Época?. Nela fizeram-lhe a seguinte pergunta:

?Por que o senhor colocou seu irmão Lúcio como tesoureiro de campanha??

Ciro respondeu:

?Não é da sua conta?.

Pouco depois foi mais claro:

?Vocês estão a serviço do Serra. Isso é lamentável. Eu li a entrevista do Serra. Foi laudatória?.

2) Um repórter da Folha de S. Paulo perguntou a opinião de Ciro Gomes a respeito da relação do deputado José Carlos Martinez com o espólio de Paulo César Farias, de quem ele tomou um empréstimo de US$ 1,6 milhão. Martinez é o coordenador da campanha de Ciro. O $audo$o PC foi o coordenador da campanha presidencial de Fernando Collor de Mello. Ciro respondeu:

?Vocês estão a serviço do candidato do governo, que está desesperado. (…) Não há relação de dívida com morto. Isso é forçar a barra, vamos devagar com o andor. (…) Se uma pessoa privada tem uma dívida com outra pessoa privada, o que eu tenho com isso, amigo??.

3) Durante um almoço na Folha de S. Paulo, seu diretor de Redação, Otavio Frias Filho fez duas perguntas a Lula. Numa, indagou a que tipo de aprendizado dedicou-se nos últimos anos. O candidato considerou a pergunta preconceituosa e informou que não a responderia. Passaram os pratos, veio o café, e o jornalista interpelou-o sobre a aliança do PT com o PL, ?linha auxiliar do malufismo?. Lula respondeu que tentara alianças à esquerda, sem sucesso. Otavio Frias Filho interrompeu-o, classificando sua resposta como evasiva. ?Assim não dá para continuar?, respondeu Lula, abandonando a mesa, a sala e o prédio.

Na quarta-feira, numa palestra, Ciro Gomes informou: ?Tenho um punhado de idéias para serem melhoradas no debate, mas aí vem um jornalista da Folha perguntar para deixar embutidas suspeições?. (Referia-se a uma eventual curiosidade a respeito de sua relação com o deputado Martinez.)

Para que nenhum dos dois candidatos fique com a impressão de que esta nota é coisa daquele tipo de gente que o doutor Getúlio Vargas chamava de ?jornalista dissolvente?, vai aqui uma pergunta a ambos:

A que o senhor atribui a percepção, pelo povo, da sua qualificação como administrador, das virtudes cívicas de suas alianças e da clarividência de suas propostas?”