Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Maria Paola de Salvo

MÍDIA EM CRISE

"Queda na circulação expõe a crise das empresas jornalísticas do País", copyright Agência Carta Maior, 13/09/02

"?Junho foi o pior mês de 2002 para a mídia impressa?. A afirmação de Maurício Augusto dos Anjos, coordenador do Subcomitê de Circulação da ANJ (Associação Nacional dos Jornais), é confirmada pela tendência de queda na circulação dos jornais, iniciada já no ano passado.

No primeiro semestre desse ano, o número de assinantes dos 22 maiores jornais do País recuou 12,0% em relação ao mesmo período de 2001. Em números absolutos, a queda foi de 1.401.596 exemplares. De 2000 para 2001, a circulação total dos jornais brasileiros caiu 2,7%, maior queda desde 1994, início do Plano Real, interrompendo um período de expansão iniciado em 1996. Os dados são do IVC (Instituto Verificador de Circulação).

Embora esteja ancorado na retração econômica, especialistas acreditam que o quadro não é resultante unicamente de um declínio do poder aquisitivo da população. Fatores como perda de credibilidade do produto jornalístico, mudança de hábito dos leitores ou ainda inserção de novas mídias no bolo incidem verticalmente sobre os números. E no desabamento da circulação, a qualidade do conteúdo e a imparcialidade do jornal correm o risco de serem atingidas.

A ?estagnação? tem afetado principalmente ?jornalões? como o ?Estado de S. Paulo? e a ?Folha de S. Paulo?. Em junho de 2001, o Estadão registrava circulação de 432.402 exemplares aos domingos. Em junho deste ano, porém, edição dominical não ultrapassou os 330.162 exemplares, uma variação negativa de 23,6%. Nem os diários mais novos, como o ?Agora São Paulo? e o ?Diário de São Paulo? escapam da crise. Comparando junho de 2001 com o mesmo mês de 2002, a circulação do ?Agora? nos dias úteis caiu de 111.424, em média, para 85.669 exemplares.

?Há uma grande relação entre o PIB, a circulação e o poder aquisitivo dos leitores?, afirma Augusto dos Anjos, que também é diretor de Circulação do jornal ?Estado de Minas?. A alta do dólar encarece o preço do papel, acarretando subida de preço dos jornais, que repassam os custos ao consumidor. Estes, por sua vez, deixam de adquirir o produto e a circulação despenca.

Pela série histórica, em grande parte, o aumento de circulação ocorrido em 2000 pode ser atribuído ao crescimento do Produto Interno Bruto, que ultrapassou os 4% naquele ano. Da mesma forma, a retração registrada em 2001 apresenta pontos de contato com o comportamento do PIB, cujo crescimento ficou limitado a 1,5.

Além da variação do PIB, ele atribui o desempenho negativo do primeiro semestre, especialmente do mês de junho, a uma Copa do Mundo da Coréia e do Japão, cujo fuso horário dificultou a cobertura pela mídia impressa brasileira. ?Os jornais se tornaram dispensáveis nesse período, pois os resultados dos jogos eram divulgados antes pela TV e pela Internet?, acrescenta.

Segundo o diretor da ANJ, a série histórica dos números relativos à circulação refletem a concorrência entre os jornais e a entrada de novos meios, que acabam por mudar os hábitos das pessoas quanto à aquisição de informações. Em 94, quando foi registrada uma das maiores quedas na venda dos jornais, a TV a cabo despontava no país. Já em 96, foi a vez da internet alcançar maior popularidade entre os leitores.

Além da perda de receita com a queda da circulação, as empresas jornalísticas vêem a crise se agravar com a diminuição da venda de anúncios publicitários.

Segundo pesquisa do projeto Intermeios, da ?Revista Meio e Mensagem?, os investimentos das agências nos jornais caíram de R$ 276,06 milhões, no primeiro bimestre de 2001, para R$ 263,21 milhões, no mesmo período de 2002.

Apesar dos números, Augusto dos Anjos mantém perspectivas positivas para o setor. ?O quadro não passa de um movimento sazonal. A circulação e a situação das empresas jornalísticas tendem a melhorar no ano que vem. Com a eleição, as pessoas passarão a comprar jornal com mais freqüência para se informarem sobre as mudanças no país?, afirma.

Especialista vê baixa circulação como álibi para a entrada de capital estrangeiro

Alberto Dines, jornalista e editor do ?Observatório da Imprensa? (www.teste.observatoriodaimprensa.com.br), classifica como ?comodismo? atribuir a queda na circulação a fatores alheios à qualidade dos produtos jornalísticos. ?Pode ser que os jornais tenham decidido enxugar a distribuição para diminuir o encalhe e o consumo de papel. Hoje, na mídia impressa brasileira, as decisões são coletivas. Mas, se há crise, penso que ela não tem a ver com a falta de liquidez da classe média. O jornal custa uma insignificância, pelo menos para os leitores da ?Folha? e do ?Estadão?, e não é por isso que eles estão abandonando seus jornais?, afirma.

Segundo Dines, mais do que se preocupar com o reflexo da situação nos balanços e nos lucros, as empresas jornalísticas e os profissionais deveriam prestar mais atenção às conseqüências desse cenário de crise para a qualidade e credibilidade do jornal. E, numa auto-análise, questionarem-se quando e como o produto deixou de ser gênero de primeira necessidade para converter-se em peça descartável.

De acordo com James Görgen, editor da Epcon, instituição gaúcha que estuda há dez anos mídia e comunicação, embora a crise possa ser classificada como sazonal, ela servirá de álibi para acelerar a proposta de emenda constitucional (PEC) que prevê a entrada de 30% do capital estrangeiro nas empresas de mídia.

?O capital estrangeiro é tão pernicioso à imparcialidade e ao conteúdo jornalístico quanto o controle de um jornal por qualquer outra empresa brasileira?, salienta. Para a ANJ, no entanto, essa seria uma forma de aliviar o caixa de muitas empresas jornalísticas no vermelho.

De todo modo, são muitos os riscos da atual crise, exposta pelas recentes demissões em massa de jornalistas em diversas empresas: na tentativa de sair do prejuízo, o espaço para o jornalismo de debate e vigilância sobre as incorreções cometidas pelos setores públicos e privados tende a ceder lugar aos anúncios publicitários de página inteira. Ou até mesmo a desaparecer, diante do corte de páginas – uma política que tem sido empregada por boa parte dos diários para cortar os gastos. Dessa forma, a fronteira entre a publicidade e o conteúdo editorial torna-se cada vez mais tênue e a opinião passa a se travestir de matéria publicitária paga.

?Obcecados pela redução de custos, as empresas descobriram que um jornal pode ser ?mantido? com poucos repórteres na redação, à base de releases e entrevistas por e-mail ou por telefone. A apuração jornalística perde muito nesse processo?, diz Görgen."

 

TV vs. RÁDIO

"Número de aparelhos de TV já supera o de rádios", copyright Epcom (www.acessocom.com.br), 16/09/02

"Pela primeira vez, o número de domicílios com televisor (89%) no País ultrapassou o total de moradias em que se encontram aparelhos de rádio (88%). De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (Pnad), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1999 o Brasil tinha 39,4 milhões de lares com rádio e 38,4 milhões com TV. Dois anos mais tarde, o quadro se inverteu e a televisão passou a estar presente em 41,4 milhões de domicílios, ante 40,9 milhões com rádios. Conforme o jornal ?O Estado de São Paulo?, esse fenômeno já havia sido detectado na década de 1990 pelo IBGE. Em 1996, 90,4% dos domicílios já tinham rádio, mas ?apenas? 84,4% eram proprietários de TV. Em 1999, a proporção da cobertura radiofônica caiu para 89,9% e a TV continuou subindo e chegou a 87,8% das casas, até ultrapassar o rádio em 2001. Pela primeira vez na Pnad, foi pesquisada também a proporção de domicílios com computadores, que ficou em 12,6%. Em 8,6% dos lares da amostra, havia acesso à internet. As diferenças regionais são evidentes quando se analisa o acesso ao computador e à internet. No Sudeste, 17,3% domicílios têm computador e em 12% há acesso à internet. No Nordeste, essas taxas são, respectivamente, de 5,2% e 3,5%.

O levantamento também apontou um aumento na proporção de domicílios com ao menos um telefone (fixo ou móvel), passando de 37,6% (1999) para 58,9% (2001). De acordo com a ?Folha de São Paulo?, foi a variação mais significativa no período, o que mostra que o telefone (com 58,9% de cobertura) já é mais facilmente encontrado nos lares do que a máquina de lavar roupa (33,7%) e o freezer (18,8%). A pesquisa mostra ainda que, em 7,8% dos domicílios, as famílias têm apenas o celular como telefone. Para a ?Folha?, o aumento no número é explicado, em parte, pelo crescimento da oferta após 1998, quando houve a privatização do Sistema Telebrás e as novas empresas de telefonia tiveram de cumprir metas para que, em 2002, pudessem ampliar suas áreas de atuação.

Renda média

De acordo com a Pnad, o rendimento médio mensal do brasileiro, que era de R$ 662 em 1996, caiu para R$ 595 em 2001. O levantamento revelou ainda que 13,1% das famílias brasileiras têm rendimento médio mensal de até um salário mínimo. Em contrapartida, as que possuem renda superior a 20 salários mínimos mensais representam 4,5% do total. Em 2001, o percentual de pessoas ocupadas foi de 54,8%, próximo dos 55,1% de 1999. No entanto, esse índice ficou abaixo do de 1992, que era de 57,5%. Os trabalhadores com carteira assinada em atividade não-agrícola eram 62,1%, em 1992, passando a 57,2% em 2001. A pesquisa revela que os brasileiros perdem como trabalhadores assalariados, mas ganham no papel consumidores. Enquanto a renda caiu, registra o IBGE, houve aumento no número de eletrodomésticos e equipamentos eletrônicos. O fogão é o eletrodoméstico mais comum, encontrado em 97,6% dos lares.

Nível de escolarização

O nível de escolarização da população brasileira cresceu e a taxa de analfabetismo diminuiu. De 1996 para 2001, o índice de crianças de sete a 14 anos fora da escola diminuiu de 8,7% para 3,5%. O Sudeste foi a região que apresentou a menor proporção de alunos fora das salas de aula, com 2,6%, contra 5,9% em 1996. A região menos escolarizada é a Nordeste, mas mesmo assim houve queda, de 13,6% para 4,8%, no mesmo período. Dos 51 milhões de estudantes a partir dos cinco anos de idade, cerca de 42 milhões estudavam em escolas públicas, ou 82,1%. Esta foi a primeira vez que a Pnad investigou a rede de ensino freqüentada. O jornal ?Zero Hora? registrou a queda de cerca de 50% no índice de analfabetismo entre crianças de dez a 14 anos desde 1996 – o índice passou de 8,3% para 4,2%. O nível de instrução da população também melhorou. Em cinco anos, o percentual de pessoas que tinham, pelo menos, o ensino médio concluído (11 anos ou mais de estudo) cresceu de 16,3% para 21,7%. Entre os trabalhadores, 28,9% das pessoas tinham 11 anos ou mais de estudo em 2001. Em 1992, eram 18,4% da população economicamente ativa.

Trabalho infantil

O número de crianças e adolescentes entre cinco e 14 anos que trabalham no país ainda é bastante alto: 2,23 milhões. Na faixa etária que vai de 5 a 9 anos, o total também impressiona: 296.705, o que corresponde a 1,8% das crianças nessa idade. De acordo com a Pnad, entre 1999 e 2001 houve uma redução de 13,3% do trabalho infantil (cinco a 14 anos), o que significa 738.558 crianças a menos exercendo alguma atividade laboral no país. De acordo com a pesquisa, em 92 a parcela de crianças e adolescentes nessa faixa etária que trabalhavam era bastante alta: 12,1%. Em 2001, esse percentual foi reduzido para 6,8%. Conforme o IBGE, a maior parte das crianças e adolescentes de cinco a 14 anos que trabalhavam no ano passado estava concentrada nas áreas agrícolas."

 

JORNALISTA PRECÁRIO

"Brasileiro não liga para jornalista", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 9/09/02

"O Comunique-se faz um ano esta semana e, pela primeira vez, o pessoal pediu para eu escrever algo especial, como parte das comemorações. Anna Catharina, a nossa gerente de Conteúdo, pediu-me para escolher o assunto que, na minha desvaliosa opinião, foi o mais marcante no jornalismo pátrio nos primeiros 365 dias de existência do site. Como já tinha escrito aqui, considero que houve três assuntos muito importantes de 2001/2002: o assassinato de Tim Lopes; a cassação da necessidade de se ter curso superior para o exercício da profissão de jornalista, e a aprovação da lei que permite a entrada do capital estrangeiro nas empresas de comunicação. Escolhi o primeiro.

Fiz a escolha no início da semana passada, assim ela não foi influenciada pelos eventos noticiados durante a semana. A agressão contra a nossa colega Ana Rodrigues, de Uruguaiana (RS); os tiros disparados contra a equipe da TV Paranaense, em Londrina (PR) e as ameaças contra o também jornalista Jutan Araújo, de Camaçari (BA), mostram que o assassinato de Tim Lopes e de outros profissionais da imprensa, além de outra agressões e ameaças de, não são apenas algo esporádico, mas um fato que faz parte da vida de nossa profissão neste país de terceiro mundo em que nascemos e vivemos.

A única coisa nova, embora já esperada, sobre esta questão é que esta realidade tem se espalhado pelo país. Ser jornalista na Bahia, terra dominada por um dos últimos coronéis nordestinos do velho tipo, é, há tempos, reconhecidamente perigoso (pelo que lembro, dez colegas foram assassinados naquele estado nos últimos anos, em especial no Sul). A mudança é que assassinatos, agressões e ameaças tenham atingido agora, com toda força, as regiões Sudeste e Sul.

Não tenho explicações certas do porquê dessa nova mania nacional, mas arrisco uma hipótese: a de que os brasileiros se esqueceram completamente do valor que o jornalismo te,. Com este esquecimento (sim, houve uma época em que as pessoas achavam jornalismo e jornalistas pessoas importantes para a sociedade), fica muito mais fácil para quem quer calar a oposição (qualquer que seja ela) intimidar os jornalistas. Afinal, quem se importa com eles?

Obviamente, este pouco caso com o jornalismo e seus profissionais não surgiu do dia para a noite. Na outra Era da Coleguinhas, antes de ela vir aninhar-se no Comunique-se, já tinha comentado o resultado de uma pesquisa, realizada em 99, que mostrava que a imprensa tinha 31% de credibilidade entre a população. Sintomaticamente, os meios de comunicação comemoraram o desempenho argumentando que ele era melhor do que o dos políticos e da polícia. Sensacional, não? Os fatos de que o nosso mister se baseia exclusivamente na credibilidade e que meia credibilidade é como meia gravidez – não existe – passaram longe das considerações dos donos da mídia. Para eles, o treinador de um time que conquistasse 30% dos pontos em um campeonato brasileiro estaria fazendo um bom trabalho, apesar de, com este aproveitamento, ir direto para a segunda divisão.

?Bem, mas por que chegamos a esta situação??, perguntará você. Outra vez não tenho resposta, mas creio que sei alguém que pode aventar um boa hipótese. O hoje professor e sempre jornalista Pery Cotta doutourou-se pela UFRJ com uma tese cuja premissa base era de que a mídia afastou-se da sociedade, o que, para mim, expliciaria este desprezo pela imprensa no Brasil.

Não tive oportunidade de ler a tese de Pery, embora tivesse respondido ao questionário que ele enviou a cerca de 400 pessoas a fim de fundamentá-la, mas creio que um dos motivos, embora não o único, desse divórcio seja a excessiva ?marquetização? das empresas jornalísticas. O pessoal da mercadologia passou a ter, no decorrer da década de 90, um poder sobre as redações que fez com que estas se voltassem mais para o tal ?jornalismo de serviços?, segundo o qual é mais importante dar o horário certo em que começa a peça de teatro ou a sessão de cinema do que discutir que tipo de política educacional o governo municipal pretende implantar nas escolas do Ensino Fundamental nos anos de seu mandato e que diretrizes básicas sobre o assunto pretende deixar para os próximo governante.

Tudo bem que este domínio da mercadologia sobre o jornalismo já foi maior – quem não se lembra da época em que o vivente ia à banca aos domingos, pagava alto torno de R$ 6,00 para levar um atlas ou dicionário, levando de lambuja um jornal? – mas ainda é grande. Basta ver a cobertura dos jornais de Rio e São Paulo, que abandonaram, parece que de vez, qualquer idéia de abrangerem a cidade como um todo. Agora, eles cobrem uma parte pequena delas (a mais rica) e, de vez quando, quando ocorre algo particularmente chocante no resto da metrópole, mandam ?correspondentes? para lá.

Esse tipo de comportamento acaba provocando um estranhamento do cidadão diante do veículo de comunicação, o que leva a desprezá-lo como interlocutor. Afinal, se o jornal/rádio/TV não o ouve, nem se preocupa com os seus problemas reais, por que raios ele se importaria com o que acontece com ele (e seus profissionais)? Esse processo leva a um distanciamento leva ao que pode ser entrevisto numa historinha:

Estava eu voltando para casa de táxi, após a gloriosa estréia de Romário no Fluzão. Já aqui perto de casa, no rádio, que estava sintonizado numa emissora que transmitira o jogo, aparece a voz do ?trepidante? que cobria o Cruzeiro. Depois de dar várias informações, ele encerra a matéria dizendo que ?Joãozinho passou aqui com a cara amarrada, sem querer falar. Deve ter tomado uma chamada e tanto pela besteira que fez ao ser expulso por jogo violento aos 30 minutos do primeiro tempo e ter levado o time dele à derrota?.

– Tá vendo? Já tá querendo sujar o cara. Essa imprensa é nojenta – atacou o taxista.

Me virei pra ele e estendi a minha mão:

– Muito prazer. Ivson Alves. – eu disse.

Ele se surpreendeu, mas apertou a mão. Aí eu emendei:

– Jornalista.

O cara ficou sem jeito. Mandei bala:

– Você foi ao jogo?

Ele disse que não.

– Pois eu fui. E esse cara aí do rádio também. E nós dois vimos a mesma coisa: o Joãozinho foi expulso por ter dado uma voadora por trás no Marcão num lance na linha lateral no meio campo, aos 30 minutos do primeiro tempo. Até ali, o Cruzeiro dominava. Depois que ele foi expulso, fizemos três gols em 15 minutos e decidimos o jogo. Ele pode até não ter sido culpado pela derrota, mas pela goleada foi sim.

O cara ainda tentou argumentar:

– Mas ele não precisava ter dito dessa maneira…

Não tirei o pé do acelerador:

– Precisava sim. Agora, os ouvintes dele que não viram o jogo sabem que o Joãozinho foi expulso aos 30 minutos do primeiro tempo e que por causa disso o time dele tomou de cinco. Isso é ou não é importante?

O cara ficou quieto. Encerrei:

– O que acho gozado é que você não viu o jogo, parece que também não ouviu, e ainda assim se achou no direito de dizer que meu colega era mentiroso. E ainda dizer que eu também sou porque faço parte da imprensa. É como se depois de pegar um daqueles bandalhas da Rodoviária, eu saísse por aí dizendo que todo motorista de táxi do Rio é ladrão.

Não dei gorjeta a ele, claro, mas fiquei com o incidente na cabeça: aquele sujeito simplesmente não acredita na imprensa. Ele acha que nós mentimos sempre, e não só nos assuntos importantes. Para ele, quem mata ou bate em jornalista não só não deveria ser punido, como devia ganhar um prêmio.

É bom a gente começar a pensar nisso direito e agir logo porque, pelo andar do ônibus, o brasileiro médio vai começar achar que entre um jornalista vivo e um morto não tem lá tanta diferença assim."