Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Metralhadora giratória

1 – O provão vai fortalecer os cursos. Isso é ótimo!

Nenhuma escola de jornalismo, pública ou privada, vai desejar que seus alunos tenham um mau desempenho no provão. Portanto, as escolas vão se mexer. Aliás, o provão dá uma outra nota pela titulação dos professores, o que também ajuda a qualificar professores. Tudo isso é ótimo.

2 – Não há contradição entre o fortalecimento das escolas e a defesa do fim da obrigatoriedade do diploma.

Defendi a proposta Mauro Santayana em dois artigos na imprensa regional do Espírito Santo, em 1987. Fui mal compreendido: entenderam que eu era contra o diploma apenas para jornalistas. Minha posição era (e ainda é) contrária ao diploma, como enfatizava então o projeto, para todas as profissões que não implicassem risco de vida. Vamos lá, em ordem alfabética: advogado, assistente social… Ficam de fora apenas os engenheiros e os médicos.

Há dias, vi a proposta retornar, vocalizada por Gesner Oliveira, do Cade (aquele mesmo que exigiu que a Kolynos virasse Sorriso). A repercussão foi mínima, já que dias depois, o anuncio do provão para jornalistas pelo ministro abortou o debate.

3 – Ser contra o diploma não significa ser contra os cursos. Nem contra o provão

Esse é um ponto que muitos confundem. Imaginam que desobrigar do diploma significa acabar com os cursos. Pelo contrário, com o fim do diploma os cursos são valorizados, mas pelos seus méritos intrínsecos, não pela reserva de mercado que produzem.

Para entender isso, não é preciso olhar além do próprio umbigo, no que se entende por comunicação: o exercício profissional da Publicidade não requer diploma; nem por isso as escolas deixam de oferecer cursos nesta habilitação. E a sua procura, às vezes, é maior do que a de Jornalismo.

Portanto não há contradição entre defender o fim da obrigatoriedade do diploma e ser favorável ao provão. Mas vamos em frente que nem tudo são flores.

4 – Deve haver um provão para professores também

Como disse José Paulo de Andrade, na edição anterior deste OBSERVATÓRIO, “pimenta nos olhos dos outros, é refresco”. Pois bem, como gosto de um bom tempero e entendo que o País está precisando de mais condimentos, entendo que é necessário um provão para os professores também.

Sou jornalista, professor universitário (de jornalismo) e funcionário público federal – desses que agora, felizmente, se o projeto continuar andando, vão poder ser demitidos por insuficiência de desempenho. Portanto, quero o provão para mim também.

Por que quero o provão para mim também? Porque, embora, não consiga encontrar um único argumento racional contra o provão, convivo com os estudantes, partilho seus sentimentos e entendo suas angústias. É difícil explicar a um jovem que dedicou os melhores anos de sua vida a um curso (que oferece um diploma porque é reconhecido pelo MEC) que, depois de concluído, ele precisa se submeter a uma nova prova – que poderá desmerecer sua escola e portanto todo o seu esforço.

Assim que saiu o anúncio do provão para jornalistas, conversei com alguns alunos e eles me perguntaram: se é para avaliar as escolas, por que não fazer um provão para os professores. Como bom judeu, respondi, com bom humor, mas muito a sério: “E por que não?”

Mas, atenção: quero o provão para mim também!

5 – É triste ver a UNE do lado errado

Ser jovem é uma qualificação que muitos batalham para preservar, independente da idade. Porque “jovem” é uma palavra forte: agrega valores como ousadia, coragem, desprendimento. Na história, são inúmeros os movimentos encabeçados por jovens, sempre motivados por ideais como progresso, liberdade, igualdade, justiça. A história do Brasil é repleta de episódios onde os jovens, em especial os estudantes, estão na boa trincheira da sociedade civil.

Ver a UNE – e outras siglas históricas – hoje isolada, do lado errado, apenas combatendo o provão, sem argumentos, é muito triste.

6 – O movimento “Fiscalize sua escola” é excelente, mas deve se somar ao provão, não contrapor-se a ele

O Movimento pela Melhoria do Ensino de Comunicação lançou, já há mais de um ano, a campanha “Fiscalize sua escola”, com uma cartilha fantástica para que os estudantes de comunicação possam checar a qualidade de seu curso. Pelo que tenho visto, no entanto, o movimento, embora correto e relativamente vigoroso, não tem conseguido alcançar resultados concretos no curto prazo.

Entendo que os estudantes, com apoio dos Enecos e Cobrecos (siglas horrorosas que estão à frente destes belos movimentos), devem ter a coragem e a ousadia de se aliar ao MEC, apoiar o provão e pedir mais.

Optar pelo confronto “Fiscalize sua escola” x “Provão” será não apenas um equívoco político, mas um desastre no objetivo concreto de melhorar os cursos.

7 – O provão fortalece o currículo mínimo que deve ser combatido

Outra grande batalha daqueles que pretendem aprimorar o ensino de jornalismo é o de livrar-se do currículo mínimo do MEC, que, na verdade, torna-se, na prática, currículo máximo. Já se vão quase dez anos da Constituição de 1988, que postula a autonomia curricular, e quase nada se andou nesta direção. Hoje, quase todos os cursos, de Norte a Sul do país, oferecem basicamente as mesmas disciplinas, a despeito da diversidade regional, de interesses e de vocações específicas de cada curso.

Se o provão vier isolado, desacompanhado de outras medidas, vai enfraquecer este movimento (que nunca foi forte) e dificultar mais ainda a quebra do currículo mínimo: os cursos vão colocar todos os seus esforços para melhorar apenas naquilo em que são iguais aos outros.

Assim, estudos de realidade regional, disciplinas de pesquisadores que ofereceriam uma personalidade original a um curso vão ser desestimuladas, já que não vão poder ser avaliadas numa prova igual para todos os alunos de todos os cursos de jornalismo do Brasil.

8 – O ensino de jornalismo vai continuar sem prática?

Os cursos de jornalismo hoje, em sua maioria, têm problemas graves. Um deles é que as disciplinas práticas de habilitação em jornalismo ou são oferecidas por professores que estão no mercado e reproduzem este mercado sem espírito crítico, ou o são por docentes distantes do mercado.

Mas em qualquer profissão, a boa experiência prática é feita no estágio, com supervisão da universidade. E no jornalismo? Vamos continuar com o anacronismo da proibição do estágio?

Como o provão vai se sair dessa? As questões práticas vão ser feitas como?

9 – O ensino de jornalismo vai continuar sem teoria?

Outro problema é a ausência de discussão teórica de jornalismo. Isso mesmo: na grande maioria dos cursos, as disciplinas práticas são de jornalismo; as teóricas, de comunicação. Com o agravante de que as disciplinas teóricas, raríssimas exceções, juntam na mesma turma alunos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas, Turismo, Radialismo etc.

Cadê a reflexão teórica específica do jornalismo? Como o provão vai se sair dessa? O que fazer com as questões teóricas?

10 – Vestibular x provão. Será que não é a mesma coisa?

Estou aqui apenas sugerindo que façamos uma experiência: que tal confrontarmos as notas no provão com a relação candidato/vaga quatro anos antes, lá no vestibular. Se der muito parecido, que é a minha hipótese, pode significar que são os alunos que fazem as escolas melhores ou piores, não a qualidade do curso ou dos professores. Como conseqüência da hipótese, os cursos das universidades públicas, que sempre conseguem os melhores alunos, já partem de um patamar superior. Mas vamos ao próximo ponto:

11 – Quem tem que ter medo do provão são as escolas privadas

Devagar com o andor com a minha própria hipótese. Além de contarem com os alunos que não conseguiram ingressar nas universidades públicas, com as exceções de praxe, os cursos privados não fazem pesquisa e não qualificam docentes. As universidades públicas, apesar de tudo, contam com alguns professores com dedicação exclusiva, fazem pesquisa etc. As particulares, em sua maiores, remuneram os professores como horistas.

São as escolas particulares, portanto, que devem ter medo do provão. Aliás, o resultado do primeiro provão já demonstrou que tal argumento é consistente: de um modo geral, as universidades públicas deram um “banho” nas escolas particulares.

12 – Vejam o presente que o governo está dando para os cursos particulares

Mas, atenção: as escolas particulares estão recebendo um presente, de graça, do governo (uma grande pauta, mas a imprensa não percebe e não vê a noticia). Inúmeros professores aposentados de universidades públicas nestes últimos anos (vários deles mestres e doutores às custas do erário) estão encontrando guarida nos cursos particulares. Tais cursos não gastaram um tostão na qualificação destes professores, mas vão receber no provão, de graça, a pontuação decorrente dessa titulação. Que vai ser retirada das universidades públicas que, com dinheiro do contribuinte, investiram na capacitação destes professores.

13 – Por que os cursos de medicina estão de fora do provão?

Sei muito pouco. Parece que é pressão corporativa. Gostaria de entender melhor. Como estamos no OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, não poderia deixar de encerrar sem esta sugestão de pauta.

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