Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Nelson Ascher

QUALIDADE NA TV

DIREITA E ESQUERDA

"Invenção demoníaca?", copyright Folha de S. Paulo, 21/01/01

"Mostrar que muitas opiniões da direita coincidem com as da esquerda ou que muitas atitudes da esquerda são idênticas às da direita é um exercício que, nos dias que correm, surpreende apenas os desinformados.

Pode, portanto, até parecer redundante observar que, se houve, no século que passou, uma concordância absoluta entre os adeptos de qualquer um dos extremos do espectro ideológico, esta dizia respeito a qual seria a mais demoníaca de todas as invenções. Ela seria, naturalmente, a televisão. Mas, após uns bons cinco decênios, talvez já estejamos aptos a julgar a malignidade do demônio em questão.

Temia-se, desde antes de seu surgimento, que ela se revelasse o mais temível dos instrumentos de manipulação política. E é verdade que, em muitos regimes autoritários ou ditatoriais, o controle das transmissões constitui um dos pilares do poder. O líder sérvio Slobodan Milosevic, por exemplo, foi deposto, ano passado, no dia em que os manifestantes ocuparam tanto o parlamento quanto o prédio da emissora oficial; e sabe-se que, em eleições mundo afora, a TV foi útil para quem soube usá-la melhor do que os concorrentes.

Tais constatações, no entanto, não equivalem a afirmar que televisão tenha exercido uma influência desmedida na política do último meio século, pois, onde houvesse um mínimo de democracia, ela converteu-se em mais uma arena na qual competiam os candidatos, uma arena nem tão diferente, afinal, do restante da imprensa, da praça pública etc. E, onde a democracia era pouca ou inexistente, foram a força e a violência que garantiram o controle da TV, e não este que assegurou o acesso ao poder.

O modo preferencial de tiranos e tiranias se relacionarem com ela foi a censura; e, quanto mais fechado ou despótico o país, mais demorou para que tivesse sua(s) emissora(s). Verificou-se também, quase sempre, uma correlação direta, em cada país, entre o número de canais aos quais se podia assistir e o de partidos que concorriam em suas eleições. A televisão acabou revelando-se semelhante a uma moléstia infecciosa que é capaz de causar mais danos às populações que nunca tiveram contato com ela do que àquelas que, por já lhe terem sido muito expostas, desenvolveram a imunidade necessária para resistir a seus efeitos deletérios.

Nenhum caso é melhor para ilustrar isso do que o da ampla e persistente campanha movida contra o presidente Clinton pelas forças conservadoras de seu país. Apesar de terem contado com um apoio nada desprezível dos meios de comunicação, sobretudo da TV, não conseguiram diminuir em nem um ponto percentual sequer os altíssimos índices de aprovação do presidente. Por quê? Porque, sendo de todas a mais exposta à TV, a população norte-americana é também, de certa forma, a mais vacinada. Seria bom se os pais que se orgulham de proibir a TV a seus filhos levassem esse caso em consideração: é possível que eles sejam mais vulneráveis à manipulação do que crianças que passam o dia diante da telinha.

Houve, no século 20, gente refinada que temia não tanto a manipulação política escancarada quanto as influências mais profundas e insidiosas dos meios de comunicação de massa. Muitas dessas possíveis influências seriam tão sutis ou se encontrariam tão meticulosamente encobertas que não há modo de verificar ou refutar sua existência.

Algumas outras, porém, não são tão difíceis de examinar. Acusa-se não raro a TV de afastar as pessoas das manifestações mais altas da cultura. Acontece que, se existe algo a que não se pode obrigar quem quer que seja, é a apreciar Proust, Mahler, Buñuel… Escolhê-la e/ou descobri-la por conta própria é parte integrante da fruição de uma obra de arte, e esta não teria inimigo mais perigoso do que o regime (quem sabe até mesmo bem-intencionado) que proibisse Sidney Sheldon e tornasse Thomas Mann obrigatório. De resto, assim como há formas inteligentes de assistir a uma telenovela, há formas burras de assistir a um filme de Wim Wenders ou de Abbas Kiarostami.

A mesma gente refinada de que falávamos tinha certeza de que a TV contribuiria para transformar as pessoas em seres fúteis, superficiais, desinteressados do que acontece com o resto da humanidade e voltados cada vez mais para o consumo. Esses prognósticos pessimistas tampouco se confirmaram. Ao que tudo indica, o ser humano sintonizado em vários canais não é melhor ou pior do que aquele que se ligava a uma única religião ou a um só partido. Não fosse assim, os antigos partidos e religiões não buscariam ter, cada qual, seu próprio canal televisivo.

Se é certo que o televisor às vezes separa as pessoas, mantendo cada indivíduo em sua casa, vale a pena lembrar que poucos foram os instrumentos que tanto ajudaram o desenvolvimento de uma consciência um pouco mais global do que esse aparelho que, há décadas, invade nossos lares tranquilos, trazendo as imagens das crianças desnutridas da Biafra, dos estudantes americanos protestando contra a guerra do Vietnã, de um cinegrafista europeu filmando a própria morte ao levar um tiro de um soldado chileno, das massas iranianas se insurgindo contra o Xá e carregando fotos do aiatolá Khomeini, de um repórter americano sendo executado por um soldado nicaraguense, dos alemães orientais galgando o muro de Berlim, dos albaneses sendo expulsos de Kosovo…

Quanto ao consumismo e outros hábitos semelhantes que a TV (mas não só ela) incentiva, talvez sejam uma espécie de doença infantil da modernidade, isto é, trata-se de uma fase que não há como saltar: ninguém se torna sinceramente um hippie anticonsumista sem antes ter consumido até se fartar. Convém, aliás, observar que a TV pode ser um veículo eficiente tanto para encorajar, por exemplo, o tabagismo quanto para combatê-lo. Assim, seja como for, a segunda metade do século 20 foi péssima com a televisão, mas, malgrado o que digam esquerdistas e direitistas, pior teria sido sem ela."

EDIR MACEDO NA INGLATERRA

"Sermão eletrônico", copyright O Globo, 26/01/01

"O bispo Edir Macedo voltou ao noticiário na Inglaterra.

O ‘The Guardian’ anunciou, anteontem, que o governo Blair vai liberar a concessão de canais de TV para seitas religiosas, hoje limitadas às estações de rádio.

Segundo a reportagem, a Igreja Universal é a maior interessada na mudança, embora a lei atual proíba pedidos de doações à audiência."

PELÉ NO PSN

"Pelé é o mais novo comentarista do PSN", copyright O Globo, 19/01/01

"Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, eleito o melhor jogador do século, será o principal comentarista do canal de esportes Panamerican Sports Network (PSN), transmitido pela TVA, Net e Sky. Pelé firmou um contrato de dois anos com a PSN, período no qual estará diretamente ligado às estratégias de marketing e desenvolvimento de programas do canal. A principal exigência feita pelo jogador foi o compromisso da PSN em apoiar projetos esportivos para crianças carentes brasileiras.

– Tenho um compromisso com Deus, que é de trabalhar nas bases dos esportes e a PSN concordou em apoiar essas bases – disse Pelé, ontem, durante entrevista coletiva em São Paulo.

Segundo ele, os projetos ainda serão elaborados pelo canal, com sua participação:

– Quando fui ministro dos Esportes (de 1995 a 1998) criei complexos esportivos nos lugares mais pobres do país, como a Baixada Fluminense, onde o índice de criminalidade baixou a quase zero. São trabalhos como esse que a PSN pode ajudar a criar.

Pelo acordo, Pelé tem exclusividade com a PSN em TV fechada, mas poderá participar de programas em canais abertos. As atrações das quais Pelé participará na PSN ainda não foram definidas. É certo, porém, que ele apresentará um programa próprio, duas vezes por mês, com comentários sobre os resultados e desempenhos das equipes nos jogos válidos pelas Eliminatórias da Copa. Durante a Copa do Mundo, seu programa será exibido duas vezes por semana e Pelé comentará ao vivo os jogos, caso a PSN consiga os direitos de transmissão do Mundial.

– Estamos conversando com a Globo sobre os direitos. Ainda é cedo para falar, mas acho que teremos bom resultado – disse Jacques Kremer, presidente do PSN, canal que completa um ano em fevereiro, tem programação 24 horas voltada aos esportes e cerca de dez milhões de assinantes na América Latina."

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